Bolsonaro se enquadra nas 15 principais características atribuídas a ditadores

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Foto: Deividi Correa/Estadão Conteúdo

Como identificar um político autoritário? A resposta pra essa pergunta foi dada em 2018 no livro “Como as Democracias Morrem”.

[Alerta ao leitor bolsonarista: não, os escritores não são comunistas. O livro, aliás, é anterior à eleição de Bolsonaro.]

Os autores Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, preocupados com a ascensão do trumpismo nos Estados Unidos, criaram uma tabela com quatro sinais de alerta, subdivididos em 15 perguntas.

“Um político que se enquadre mesmo em apenas um desses critérios é motivo de preocupação”, alertam.

Bolsonaro —para a surpresa de um total de zero pessoas— se enquadra em todas. Sim, em todos os 15 tópicos.

Os autores afirmam que a ditadura ostensiva desapareceu em grande parte do mundo e que o retrocesso democrático começa nas urnas. A subversão, dizem eles, muitas vezes é aceita pelo Legislativo ou pelo Judiciário.

“Há outra maneira de arruinar uma democracia (além de golpes tradicionais). É menos dramática, mas igualmente destrutiva. Democracias podem morrer não nas mãos de generais, mas de líderes eleitos (…) As democracias decaem aos poucos, em etapas que mal chegam a ser visíveis”.

Bolsonaro vem minando a democracia há tempos. Ninguém pode se dizer surpreso. A ver.

1. Os candidatos rejeitam a Constituição ou expressam disposição de violá-la?

Ao ser incluído como investigado no inquérito das fake news, do Supremo Tribunal Federal, Bolsonaro disse que poderia agir “fora das quatro linhas da Constituição.” Um dos motes do movimento do 7 de Setembro foi “Eu autorizo”, em alusão a uma intervenção militar.

2. Sugerem a necessidade de medidas antidemocráticas, como cancelar eleições, violar ou suspender a Constituição, proibir certas organizações ou restringir direitos civis ou políticos básicos?

A rejeição ao presidente vem crescendo à medida que aumentam a inflação, o desemprego, a gasolina e as mortes provocadas por uma pandemia para a qual já existe vacina.

Em resposta, o presidente partiu para o golpismo declarado ao defender o voto impresso. A Câmara dos Deputados já enterrou o projeto, mas o presidente ameaça não realizar as eleições.

“Eleições no ano que vem serão limpas. Ou fazemos eleições limpas no Brasil (leia-se, com voto impresso) ou não temos eleições.”

3. Buscam lançar mão (ou endossar o uso) de meios extraconstitucionais para mudar o governo, tais como golpes militares, insurreições violentas ou protestos de massa destinados a forçar mudanças no governo?

O presidente convocou apoiadores, por meio de uma mensagem no WhatsApp, a um protesto “gigante” em 7 de setembro. A mensagem falava em um “bastante provável e necessário contragolpe”. A informação foi revelada pelo colunista Guilherme Amado, do site “Metrópoles”.

A manifestação, segundo Bolsonaro, é um “ultimato” aos ministros Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes.

Além disso, inquéritos no STF investigam atos antidemocráticos realizados por bolsonaristas.

4. Tentam minar a legitimidade das eleições, recusando-se, por exemplo, a aceitar resultados eleitorais dignos de crédito?

Bolsonaro passou mais de 500 dias prometendo apresentar prova de fraudes nas eleições. Na Justiça, em três ações em que era desafiado a mostrá-las, o presidente ficou como se estivesse diante de uma proposta da Pfizer: em absoluto silêncio.

Em uma live, ele admitiu que não tinha prova nenhuma.

De acordo com um levantamento do Aos Fatos, Bolsonaro quintuplicou os ataques às urnas desde quando Lula voltou a ser elegível. Coincidência?

5. Descrevem seus rivais como subversivos ou opostos à ordem constitucional existente?

Na mesma mensagem de WhatsApp citada um pouco acima, Bolsonaro descreveu seus opositores com tintas surreais: “Milhares de ONGs, grupos terroristas disfarçados de militantes e coletivos de esquerda, todos treinados, armados até os dentes e espalhados nos quatro cantos do país colocando em grave risco inclusive a saúde do povo brasileiro.”

Ele também costuma dizer que Adélio Bispo, que o esfaqueou na campanha em 2018, “agiu com mais gente” — insinuando que foi um instrumento da oposição.

A própria Polícia Federal já afirmou categoricamente que não.

6. Afirmam que seus rivais constituem uma ameaça existencial, seja à segurança nacional ou ao modo de vida predominante?

A fake news de que a esquerda quer descriminalizar a pedofilia é recorrente. Foi usada em uma rede social em 2020 e repetida nesse ano: disse que os governos anteriores estimulavam esse crime.

7. Sem fundamentação, descrevem seus rivais partidários como criminosos cuja suposta violação da lei (ou potencial de fazê-lo) desqualificaria sua participação plena na arena política?

Lula está elegível desde que o ministro Edson Fachin anulou as condenações na Lava Jato. Mas o atual presidente sugere uma conspiração que envolve Lula e o Tribunal Superior Eleitoral para que o ex-presidente seja eleito.

“Eu não estou aqui para criticar Poder nenhum. Mas tiraram o cara (Lula) da cadeia, tornaram ele elegível, para não ser presidente? É improvável. Agora, por que tiraram aquele cara da cadeia, por que o tornaram elegível? Passou na primeira instância, segunda instância, terceira instância. Na quarta: ‘Ah, o foro dele não é em Curitiba’. Pelo amor de Deus!”

8. Sem fundamentação, sugerem que seus rivais sejam agentes estrangeiros, pois estariam trabalhando secretamente em aliança com (ou usando) um governo estrangeiro com frequência um governo inimigo?

Na mensagem divulgada no WhatsApp, Bolsonaro também cita um suposto (e inexistente) apoio internacional contra ele.

“Diante do avanço do golpe já em curso há tempos e que agora avança de forma muito mais agressiva, perpetrado pelo Poder Judiciário, esquerda e todo um aparato inclusive internacional de interesses escusos”.

Em maio deste ano, Bolsonaro insinuou que a China poderia ter criado o coronavírus como “guerra química”.

9. Tem quaisquer laços com gangues armadas, forças paramilitares, milícias, guerrilhas ou outras organizações envolvidas em violência física?

Decretos presidenciais facilitaram a compra de armas e Bolsonaro tem incentivado seus apoiadores, à la Mussolini, a portarem armamento. “Povo armado é povo que não será escravizado”.

Ele diz ainda contar com o apoio das Forças Armadas e incentivou a ida de policiais ao protesto de 7 de setembro.

“Hoje vocês veem alguns governadores ameaçando expulsar policiais militares, que por ventura estejam de folga dia 7, e compareçam para festejar o 7 de setembro. Se falarmos ‘não sou policial militar, não tenho nada a ver com isso’, aguarde que sua hora vai chegar”

10. Patrocinaram ou estimularam eles próprios ou seus partidários ataques de multidões contra oponentes?

Ainda na campanha, em 2018, Bolsonaro pegou o tripé de uma câmera e fez um gesto como se portasse um fuzil:

“Vamos fuzilar a petralhada aqui do Acre, hein? Vamos botar esses picaretas para correr do Acre. Já que eles gostam tanto da Venezuela, essa turma tem de ir pra lá.”

11. Endossaram tacitamente a violência de seus apoiadores, recusando-se a condená-los e puni-los de maneira categórica?

O aliado e ex-deputado Roberto Jefferson, corrupto confesso, foi preso por incitar a população a protestos violentos e antidemocráticos. O presidente do PTB nacional postava imagens armado em sua rede social.

A decisão da prisão foi do presidente do STF, Alexandre de Moraes. Em represália, Bolsonaro protocolou no Senado o impeachment de Moraes, uma semana depois. Foi a primeira vez na história da República em que um presidente tomou essa atitude.

12. Elogiaram (ou se recusaram a condenar) outros atos significativos de violência política no passado ou em outros lugares do mundo?

Bolsonaro diz que a posse de Castelo Branco na ditadura militar foi “um processo democrático” e que “nunca houve ditadura”. Para Bolsonaro, o torturador Brilhante Ustra é um “herói nacional”.

Recentemente, quando o bolsonarista Daniel Silveira foi preso por ataques à democracia e ao Supremo, o presidente se calou.

O cantor Sérgio Reis e o deputado federal Otoni de Paula foram alvos de busca de apreensão por ataques semelhantes. Eduardo Bolsonaro disse que os dois eram “vítimas”.

13. Apoiaram leis ou políticas que restrinjam liberdades civis, como expansões de leis de calúnia e difamação ou leis que restrinjam protestos e críticas ao governo ou certas organizações cívicas ou políticas?

A pedido de Carlos Bolsonaro, o youtuber Felipe Neto foi alvo de um inquérito da Polícia Civil por ter chamado Bolsonaro de “genocida”. O caso foi aberto com base na Lei de Segurança Nacional e acabou arquivado.

A lei, considerada um entulho autoritário, também foi usada em várias ocasiões pelo ministro da Justiça, André Mendonça, quando Bolsonaro foi criticado.

Ele pediu investigações contra o advogado Marcelo Feller, o colunista Hélio Schwartsman, o cartunista Aroeira, o jornalista Ricardo Noblat, entre outros.

14. Ameaçaram tomar medidas legais ou outras ações punitivas contra seus críticos em partidos rivais, na sociedade civil ou na mídia?

Como dito no tópico anterior, o governo foi à Justiça contra opositores. No tópico 11, consta também o pedido de impeachment contra o ministro Alexandre de Moraes, considerado por ele um inimigo.

Por fim: um levantamento que é feito desde 1990 pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) registrou recorde de ataques à liberdade de imprensa no ano passado. De 2019 para 2020, os ataques dobraram e Bolsonaro foi responsável por quase metade deles.

“A explosão de casos está associada à sistemática ação do presidente da República, Jair Bolsonaro, para descredibilizar a imprensa e à ação de seus apoiadores contra veículos de comunicação social e contra os jornalistas”, diz a Fenaj.

15. Elogiaram medidas repressivas tomadas por outros governos, tanto no passado quanto em outros lugares do mundo?

Bolsonaro, ainda deputado, defendeu uma guerra civil e o assassinato do então presidente Fernando Henrique Cardoso. Para ele, o Brasil não iria pra frente na base da eleição.

“Através do voto você não vai mudar nada nesse país, absolutamente nada. Só vai mudar, infelizmente, quando um dia nós partirmos para uma guerra civil aqui dentro. E fazer um trabalho que o regime militar não fez, matando uns 30 mil, começando pelo FHC. Se vai morrer alguns inocentes, tudo bem”.

Bolsonaro, portanto, gabaritou. Tirou nota 15 sobre 15. E pensar que os autores recomendam preocupação com políticos que se encaixam em apenas um destes critérios.

G1  

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No alvorecer de 2017, o blogueiro Eduardo Guimarães foi alvo de operação da Polícia Federal não por ter cometido qualquer tipo de crime, mas por ter feito jornalismo publicando neste Blog matéria sobre a 24a fase da Operação Lava Jato, que focava no ex-presidente Lula.

O Blog da Cidadania representou contra grandes grupos de mídia na Justiça e no Ministério Público por práticas abusivas contra o consumidor, representou contra autoridades do judiciário e do Legislativo, como o ministro Gilmar Mendes, o juiz Sergio Moro e o ex-deputado Eduardo Cunha.

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