Juiz nega auxílio a criança doente para família “não se acomodar”

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Foto: Reprodução/ Metrópoles

O mesmo juiz que negou a uma criança deficiente de 6 anos um benefício de R$ 1,1 mil por mês com a justificativa de não deixar a família do menino, que mora no interior da Bahia, acomodada, já ganhou do Judiciário federal, nos últimos quatro anos, mais de R$ 100 mil só em auxílio-moradia e auxílio-alimentação.

Trata-se do juiz da 2ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Feira de Santana (BA), Alex Schramm de Rocha. O magistrado recusou autorizar a concessão de um Benefício de Prestação Continuada (BPC) no valor de um salário mínimo à criança “a fim de que o próprio benefício não se torne um fator a dificultar seu desenvolvimento”. A sentença foi proferida no último dia 15 de setembro, após a Defensoria Pública da União (DPU) ajuizar negativa do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).

Nos últimos 48 meses, o juiz federal ganhou R$ 113,4 mil em auxílio-alimentação e auxílio-moradia.

Os dados foram levantados pelo Metrópoles em plataforma do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e em folhas de pagamentos disponibilizadas pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1). O montante se refere ao período entre setembro de 2017, data mais antiga disponível, e agosto de 2021.

Só o auxílio mensal ganho pelo juiz para se alimentar, de R$ 910,08, é de quase um salário mínimo, o valor que seria pago à criança deficiente. Já o auxílio-moradia foi pago ao magistrado até dezembro de 2018. Ele recebia R$ 4.377,73 por mês.

Até o fim de 2018, o auxílio-moradia era pago a todos os magistrados, sem exceção. Em janeiro de 2019, porém, o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro João Otávio de Noronha, regulamentou o pagamento do benefício. Agora, os juízes precisam atender alguns critérios para receber o auxílio, como não ter imóvel funcional.

Alex Schramm tem salário de R$ 33.689,11. Considerando as indenizações (auxílio-alimentação e auxílio-moradia) e direitos eventuais, o magistrado já chegou a receber R$ 72.031,52 em um único mês. Desde setembro de 2017, ganhou R$ 2,270 milhões.

O garoto de 6 anos que teve o benefício negado tem megacólon congênito, uma grave dilatação do intestino grosso que provoca vômitos, náuseas, inchaço e constipação abdominal, o que pode afetar o desenvolvimento da criança. O requerimento do benefício foi feito pela mãe da criança, em julho de 2019, ao Instituto Nacional do Seguro Social, que negou o pedido. A mulher está desempregada e cuida sozinha do filho.

A Defensoria Pública da União (DPU) ajuizou uma ação contra a decisão do INSS, em agosto do ano passado, para garantir o pagamento do BPC, mas o juiz da 2ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Feira de Santana também julgou improcedente o pedido.

O magistrado apontou que a perícia médica atesta que a deficiência do menino é temporária e que a família teria renda mensal maior do que um quarto do salário mínimo, o limite legal para concessão do benefício. No entanto, o juiz pode adotar critérios mais amplos para conceder o BPC/LOAS ao admitir outros fatores indicativos do estado de miserabilidade do indivíduo e de sua família.

Na sentença, Schramm alegou, também, ser necessário se ter cuidado no deferimento de benefícios assistenciais, “a fim de que o próprio benefício, por constituir renda para a família, não se torne um fator a dificultar seu desenvolvimento”. “Isso porque a reaquisição da capacidade importará na cessação do benefício e, portanto, na perda de parte significativa na renda da família”, assinalou o juiz.

A DPU recorreu contra a sentença. Ao Metrópoles, o defensor público federal Erik Boson classificou a decisão de Schramm como “singular” e relatou “espanto” com a argumentação.

“Considerei descuidada a utilização de um argumento desse tipo para forçar uma argumentação. É sempre possível discutir os requisitos, mas a criação de um novo requisito, com base em subjetivismos individuais, no mínimo me surpreendente”, criticou o defensor público.

“Mais da metade do valor recebido pela mãe é gasto no sustento da criança, inclusive, com medicamentos que o SUS [Sistema Único de Saúde] não está oferecendo. Isso vai ser alvo de uma outra ação judicial”, completou Boson.

Ao recorrer da sentença, o DPU disse ser de “total disparate a decisão do ínclito julgador a quo, pois mesmo reconhecendo a incapacidade do recorrente, alegou que a concessão da benesse geraria uma acomodação do Postulante, retirando da benesse sua finalidade primordial, que é prover a estes indivíduos o mínimo existencial”. “Assim, a sentença proferida nos autos do processo em epígrafe possui error in iudicando, uma vez que a tese jurídica adotada pelo magistrado é completamente teratológica e oposta a legislação pátria”, prosseguiu.

Procurado, Alex Schramm informou, em nota ao Metrópoles, que a sentença está baseada nos laudos das perícias médica e social. “O benefício assistencial pretendido pela parte está sujeito ao preenchimento dos requisitos previstos no art. 20 da Lei 8.742/1993”.

“Não foi objeto do processo pedido de tratamento de saúde, mas apenas o do benefício assistencial. Caso a parte discorde do julgamento – o que é natural –, ela pode recorrer da sentença”, sinalizou o magistrado.

Alex Schramm já se envolveu em outras decisões polêmicas. Em novembro de 2016, o juiz atendeu pedido do Ministério Público Federal (MPF) e autorizou a demolição de barracas na praia Axé Moi e Tôa Tôa, em Porto Seguro, sul da Bahia. Segundo reportagem do jornal Folha de S. Paulo, as tendas geravam, na época, cerca de 800 empregos diretos.

A decisão, no entanto, foi suspensa em liminar expedida pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1).

Cerca de dois anos depois, o TRF-1 voltou a suspender uma outra decisão de Alex Schramm, que deferiu liminar pleiteada por uma família de fazendeiros, representada por Alberto Ceolin Filho, reintegrando a posse da Terra Indígena (TI) Tupinambá de Belmonte aos empreendedores.

Metrópoles

 

 

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