Procurador-geral de Justiça de SP reclama de maior controle sobre o MPF

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Foto: Reprodução

Perda da autonomia, diminuição da representação, aumento injustificado do prazo para prescrição de infrações e intervenção política na administração interna são alguns dos efeitos previstos pelo procurador-geral de Justiça de São Paulo, Mário Luiz Sarrubbo, caso a PEC que tenta mudar a composição do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) seja aprovada.

“Desde de ontem à tarde, não faço outra coisa a não ser falar com os deputados”, afirma o chefe do MP de São Paulo em entrevista ao Estadão horas antes da votação da proposta na Câmara.

Na avaliação de Sarrubbo, a proposta de autoria do deputado Paulo Texeira (PT-SP) é ‘um tiro de morte’ na instituição.

“Nós queremos o controle externo, mas tem que ser um controle externo que tenha isenção, um controle da sociedade efetivamente, e não dos interesses políticos que nós nunca sabemos quais são e que poderão intervir na instituição que defende a cidadania, o meio ambiente, a infância, o combate a criminalidade e, principalmente, a corrupção”, afirma.

Responsável por fiscalizar a conduta de promotores e procuradores, o CNMP é composto hoje por 14 conselheiros, que assumem as cadeiras após serem sabatinados e aprovados no Senado Federal. A proposta da PEC é para incluir um assento a ser reservado a indicações alternadas da Câmara e do Senado e para tirar uma das quatro vagas a cargo do Ministério Público da União e também passá-la às mãos do Congresso, o que na prática aumenta a influência externa na instituição.

Outra mudança prevista é que, além da parte correcional, o conselho ganhe a atribuição de rever atos privativos de membros do MP, incluindo a anulação da abertura de investigações.

“Isso é gravíssimo, é a invasão e a quebra da autonomia da instituição, autonomia que não é do promotor, não é do membro, é da sociedade”, reage Sarrubbo.

Leia a entrevista completa:

ESTADÃO: Qual o principal problema do projeto?

Mário Sarrubbo: É um tema muito importante para nós, porque estão na verdade desconfigurando o Ministério Público. O principal é que a PEC dá ao Conselho Nacional do Ministério Público o poder de rever atos privativos de membros do Ministério Público, o que é um absurdo, é uma intervenção em uma instituição que tem a garantia constitucional da sua autonomia e que já tem os freios e contrapesos necessários da estrutura de Justiça, como por exemplo o Poder Judiciário. Isso é gravíssimo, é a invasão e a quebra da autonomia da instituição, autonomia que não é do promotor, não é do membro, é da sociedade.

O ponto número dois é a imposição de um Código de Ética, um componente fiscalizador com um viés eminentemente político, que vai valer para todo o Ministério Público brasileiro. E aí as perguntas que vêm são: quais os limites deste código? Até onde eles podem ir ? Qual a ótica que quer se impôr a uma instituição que tem a sua conformação nos limites da Constituição Federal?

Talvez sejam esses dois os pontos mais importantes, mas há outros aspectos também relevantes. Por exemplo, eles mexem com a autonomia da instituição estabelecendo, por exemplo, que o procurador-geral da Justiça pode nomear membros para o Conselho Superior, que é quem efetivamente cuida da política da tutela coletiva, dos arquivamentos de inquéritos civis, homologações de TACs [Termos de Ajustamento de Conduta]. Eles querem que o procurador-geral nomeie membros do Conselho Superior, quando eles hoje são eleitos pela classe, eleitos pelos colegas. Essa é uma outra invasão não autonomia da instituição, obviamente isso não é sequer democrático.

Há também disposições que mexem com os prazos prescricionais das infrações disciplinares, que passam a ser mais amplos, mais longos. E gozado que na Lei de Improbidade os prazos foram diminuídos, quase que a prescrição vai se tornar regra na Lei de Improbidade, mas para as infrações disciplinares de membros do Ministério Público os prazos se alongam e acabam trazendo aí um prejuízo muito grande para o equilíbrio e para o sistema de freios e contrapesos no qual estamos inseridos.

Quero consignar e deixar claro que nós do Ministério Público não temos medo de qualquer controle, muito pelo contrário. A instituição está aberta, tem que ser controlada, nós queremos o controle externo, ele é importante, mas ele tem que ser um controle externo que tenha isenção, um controle da sociedade efetivamente, e não dos interesses políticos que nós nunca sabemos quais são e que poderão intervir na instituição que defende a cidadania, o meio ambiente, a infância, o combate a criminalidade e, principalmente, a corrupção. A PEC, se aprovada nesses termos, é um tiro de morte na instituição Ministério Público. Acaba com a autonomia, autonomia essa que foi consagrada pela Constituição cidadã de 1988, lamento que 33 anos ainda estejamos discutindo esse tema aqui.

ESTADÃO: Então além de dispor sobre a composição do Conselho Nacional, a PEC atinge também os Conselhos Superiores estaduais?

Mário Sarrubbo: Exatamente. A PEC está prevendo que o Conselho Superior das instituições, que hoje é eleito pela classe, passe a ser composto por membros indicados diretamente pelo procurador-geral de Justiça, suprimindo a possibilidade dos colegas democraticamente elegerem esses conselheiros e poderem intervir na política da instituição no campo da tutela coletiva. É uma questão que atinge a autonomia da instituição, dos colegas dos próprios Ministérios Públicos.

ESTADÃO: Na avaliação do Sr., para que serve um novo Código de Ética?

Mário Sarrubbo: Na verdade o nosso Código de Ética é a Constituição Federal e as Leis Orgânicas que são aprovadas pelo próprio Congresso Nacional. E agora querem criar um terceiro Código de Ética que vai ser criado pelo Conselho Nacional do Ministério Público, que em função da nova composição estaria se tornando um órgão com forte componente político. Eu fico aqui imaginando, um procurador-geral, um promotor de Justiça, que eventualmente ajuíza uma ação contra um deputado, ferindo interesses políticos, qual seria a reação desse Conselho Nacional? Qual seria a postura do conselho nessa formatação…

ESTADÃO: A que o Sr. atribui a tentativa de mudança? Na sua avaliação, é uma reação da classe política ao trabalho de promotores e procuradores? E eu pergunto porque a PEC tem apoio de parlamentares associados a partidos de diferentes inclinações no espectro político.

Mário Sarrubbo: A revisão de alguns dispositivos pode ser necessária, nós não temos nenhuma restrição a se discutir o aperfeiçoamento do controle externo da instituição, que talvez seja necessário. O que nós não podemos admitir, e esse é o tema da discussão hoje, é a desconfiguração do sistema constitucional construído pela instituição Ministério Público. Nós estamos abertos ao diálogo, inclusive o Ministério Público de São Paulo fez vários eventos trazendo deputados para dialogarmos a respeito desse tema aqui. O autor da proposta, Paulo Teixeira, participou. O que nós queremos é esse diálogo, esse tipo de legislação, de uma Emenda Constitucional, não pode ser aprovada na calada da noite, dessa forma, sem que a população, a quem os deputados representam, saibam o que está se votando. Eles estão lá para atender o que pensa a população. Nós queremos e achamos importante o controle externo, mas nós não queremos ver a instituição destruída com intervenções políticas nos seus órgãos de administração.

ESTADÃO: E o Sr. acha, efetivamente, que esse controle externo precisa melhorar?

Mário Sarrubbo: Eu acho que podemos discutir avanços. A representatividade das instituições no Conselho, por exemplo. Eu vou te dar outro exemplo: os Ministérios Públicos estaduais representam 80% do Ministério Público brasileiro, mas são sub-representados no Conselho Nacional do Ministério Público em termos de vaga e querem diminuir ainda mais essa representação. O Ministério Público de São Paulo é maior do que o Ministério Público Federal. No entanto, a nossa representatividade nesse Conselho é mínima. Há uma disparidade enorme de representatividade no Conselho Nacional do Ministério Público. E estão inserindo MP de Contas, que é um Ministério Público muito pequeno.

ESTADÃO: Ainda dá tempo de rediscutir a PEC?

Mário Sarrubbo: É preciso, realmente é preciso rediscutir essa PEC, com um olhar republicano, de evoluirmos no sistema de freios e contrapesos, que dê garantia para o Ministério Público trabalhar e para que a população e os políticos tenham a segurança de que o Ministério Público não vá sair da curva, não vá desrespeitar as normas, as regras, a lei e a Constituição Federal.

ESTADÃO: Vocês vão tomar alguma medida para tentar derrubar o texto caso seja aprovado? Estão articulando alguma reação?

Mário Sarrubbo: Por enquanto nós estamos nas articulações juntos aos deputados. Eu, desde de ontem à tarde, não faço outra coisa a não ser falar com os deputados, expor a nossa visão. Por enquanto, é isso. Uma vez aprovada no Congresso Nacional, aí nós vamos estudar os próximos passos, até mesmo a judicialização do tema, na medida em que há vícios de forma e vícios materiais importantes nessa PEC, que viola o espírito da Constituição Federal. Vamos aguardar. Por enquanto, acreditamos no diálogo, acreditamos que o Congresso Nacional terá consciente e sobrestará o andamento ou rejeitará essa PEC e abrirá uma nova oportunidade para discutirmos de forma madura, ampla, com a participação da sociedade, do Poder Judiciário, da advocacia, da população, das organizações sociais.

ESTADÃO: Com quem o Sr. já falou?

Mário Sarrubbo: Falei com praticamente toda a bancada paulista desde ontem. Tanto eu quanto o presidente da entidade de classe aqui, Paulo Penteado, estamos tentando articular o sobrestamento ou a rejeição da PEC.

ESTADÃO: Inclusive com o deputado Paulo Teixeira, que é autor da PEC?

Mário Sarrubbo: Muito. Falei muito com o Paulo Teixeira hoje.

Estadão  

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