Brasileiros elegem libertação dos escravos como fato histórico mais importante

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Foto: Reprodução/Nossa Causa

Em meio à ampliação do debate na sociedade sobre racismo e desigualdade racial, a abolição da escravidão, em 13 de maio de 1888, foi apontada como fato mais importante da História do país pelos brasileiros. Pesquisa inédita encomendada pelo Observatório Febraban ao Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (Ipespe) mostra que a assinatura da Lei Áurea foi citada como primeira resposta de 31% dos entrevistados, ao serem questionados sobre os momentos mais significativos do Brasil.

Prestes a completar 200 anos, a independência, em 7 de setembro de 1822, aparece na segunda posição, com 18% de preferência. Em seguida, com 8%, estão a proclamação da República, em 15 de novembro de 1889; o fim da ditadura militar, que levou à redemocratização do país, em 1985; e o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), em 2016.

Outros momentos recentes, como a Operação Lava-Jato, o Plano Real, o impeachment do ex-presidente Fernando Collor e a implementação do Bolsa Família, também aparecem com destaque.

. Foto: Editoria de Arte

Para o sociólogo Antonio Lavareda, presidente do conselho científico do Ipespe, fatores estruturais, como a alta proporção de negros na população brasileira (54%, de acordo com o IBGE), e conjunturais, como o fato de o combate ao racismo ter se consolidado como uma agenda no Brasil e no resto do mundo nos últimos anos, ajudam a explicar a importância atribuída ao momento histórico:

— De um lado, é sabido que o Brasil foi o último país da América a abolir a escravidão, e isso tem significado para a população negra. Do outro, entrou para a agenda global a discussão sobre os efeitos perniciosos da desigualdade racial. Isso foi muito forte em 2020 e 2021.

Os dados indicam ainda que a abolição da escravidão foi mais citada pelos mais jovens, com 18 a 24 anos. Nesse grupo, o percentual chega a 40%, ante 25% na população acima de 60 anos. Não há diferença tão significativa nos recortes por escolaridade e renda.

RENATO FRANCO
historiador e diretor da Eduff

“A força dos movimentos sociais e a ascensão das políticas de cotas têm contribuído para repropor a pauta racial”

Professor de direito internacional e direitos humanos na FGV, Thiago Amparo destaca que, apesar da permanência do racismo cotidiano, institucional e estrutural no país, o Brasil tem passado por um processo de amadurecimento e difusão do debate racial, puxado por intelectuais e ativistas negros e negras.

— O Brasil, diferentemente de muitos países latino-americanos de língua espanhola, não pensa profundamente sobre seu processo colonial. Isto faz com que, no Brasil, o dia da independência seja mais um feriado do que efetivamente um momento de reflexão sobre legado colonial em nossas instituições. Em paralelo, o debate sobre abolição ferve, em parte pela constatação do protagonismo negro na abolição, em parte pela ideia de uma abolição inconclusa, posto que racismo permanece no país.

Fatos mais lembrados

1º – Aboliação da Escravidão, 1888
2º – Independência do Brasil, 1822
3º – Proclamação da República, 1889
4º – Redemocratização pós-Ditadura, 1985
5º – Impeachment Dilma Rousseff, 2016
6º – Operação Lava-jato, 2014-2021
7º – Implantação do Real, 1994
8º – Criação do Bolsa-Família, 2003
9º – Impeachment Fernando Collor, 1992
10º – Golpe de 1964 e o regime militar

A conexão com o presente e a relação com as lutas políticas da atualidade têm mais impacto na percepção do passado do que a compreensão do processo histórico, avalia o historiador e diretor da Editora da Universidade Federal Fluminense (Eduff), Renato Franco:

— A questão racial no Brasil permanece como um problema em aberto, diante da timidez das políticas públicas de inclusão que outorgam uma cidadania incompleta aos descendentes de escravizados. Por sua vez, o fortalecimento dos movimentos sociais e a ascensão das políticas de cotas nas universidades têm contribuído para repropor a pauta racial, especialmente entre os mais jovens.

Apesar de figurar entre os momentos históricos mais lembrados, 59% dos brasileiros ouvidos informaram não saber do bicentenário da independência.

O comportamento e memória dos brasileiros em relação à data se diferencia das experiências de outros países, como os Estados Unidos. Um levantamento da empresa de pesquisas americana Gallup mostrou em 2001 alto interesse da população do país nas celebrações: 76% informaram que pretendiam participar de celebrações familiares, e 66% informaram que pretendiam exibir uma bandeira do país.

“O Brasil não pensa sobre seu processo colonial, o que faz com que o dia da independência não seja um momento de reflexão”

THIAGO AMPARO
professor da FGV

Professora de História da UFF, Janaína Cordeiro pesquisou a celebração feita pela ditadura militar, em 1972, quando a independência completou 150 anos. Ela afirma que o grito do Ipiranga pode ter menos apelo na população do que a abolição por ter sido construído “de cima para baixo” — o país, que já abrigava a corte portuguesa desde 1808, passa a se organizar como uma monarquia que tinha Dom Pedro I como imperador.

A pesquisadora ressalta que a data tem lugar de destaque na tradição nacional, mas precisa ser suscitada pelos agentes públicos e pela sociedade civil, o que não tem acontecido no governo federal:

— Bolsonaro convocou manifestações no 7 de setembro, mas mesmo naquele momento não foi capaz de associar significado histórico à data, o que evidencia um desprezo pela História que não foi comum mesmo em governos autoritários.

No ano passado, após uma série de críticas pela falta de planejamento de ações para o bicentenário, o secretário especial da Cultura, Mario Frias, anunciou uma linha de crédito de R$ 600 milhões para as celebrações.

A historiadora Rosa Maria Araújo, diretora do Arquivo Geral do Rio e integrante de um grupo de trabalho para as comemorações do bicentenário na cidade, acrescenta um outro dado à discussão: os impactos da instabilidade política e das crises econômica e sanitária têm “apagado” a data. A pesquisa do Ipespe mostra que, para os brasileiros, são justamente a saúde, a educação e o combate à fome que devem receber uma maior atenção em 2022, assim como o desemprego e o custo de vida.

— Há uma concorrência com a Covid, que está solapando o Brasil do ponto de vista sanitário, economicamente e socialmente — diz Rosa Maria Araújo.

Turbulências na relação do Executivo com o Legislativo, como os dois impeachments, e acontecimentos que ainda resvalam no cotidiano político e eleitoral atual, caso da Lava-Jato, também são lembrados — no caso da saída de Dilma Rousseff e da operação que notabilizou o hoje presidenciável Sergio Moro, os impactos são visíveis no cenário em curso de 2022. O impeachment de Dilma tem o dobro das primeiras menções que o de Collor e é mais lembrado por entrevistados com ensino fundamental, o que indica que pode ter mais peso para a base que ajudou a elegê-la. O fim da ditadura é mais citado entre brasileiros com ensino superior.

O cientista político Leonardo Avritzer, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e do Observatório da Democracia, chama a atenção ainda para o destaque da redemocratização entre os períodos históricos com maior importância:

— A população brasileira volta a se preocupar com a questão da democracia. Ao mesmo tempo, temos grupos diferentes achando coisas diferentes, o que se expressa num quadro polarizado.

O Globo 

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