Doria agora veste a fantasia de “moderado”

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Foto: Governo do Estado de São Paulo

Sob intensa pressão interna de adversários de sua candidatura presidencial dentro do PSDB, o governador João Doria (SP) resolveu adotar uma linha de acomodação para resistir e manter seu nome na disputa pelo Planalto.

A versão mais moderada tenta refazer a imagem do tucano, conhecido por tratorar decisões e pela fama de atropelar os códigos da política em favor de processos decisórios verticais, ao estilo empresarial.

Primeiro, o governador buscou reduzir sua exposição no mundo virtual, no qual sempre foi assertivo desde que surgiu na política ao eleger-se no primeiro turno como prefeito de São Paulo, em 2016.

Posta menos nas suas redes, e sua lista de transmissão de WhatsApp, antes congestionada, hoje registra um ou dois envios por dia.

O tom está mais ameno também. Na quarta (9), ele apenas enviou em suas listas uma postagem que havia feito criticando uma entrevista na qual o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva falava de controle da imprensa, mas sem nem sequer citar o rival petista.

Doria reagiu discretamente aos movimentos de senadores e deputados do PSDB contrários à sua candidatura.

O grupo reuniu-se em Brasília nesta semana e foi fustigado em redes sociais por aliados do tucano, como o presidente da sigla em São Paulo, Marco Vinholi. Doria apenas chamou o evento de “jantar de derrotados” numa entrevista à rádio Eldorado.

Em segundo lugar, Doria tem feito gestos seguidos para tentar transformar a vitória nas prévias do partido em novembro, contra o governador Eduardo Leite (RS), em uma maior influência na sigla —que rachou e não dá sinais de união desde então.

Ele apoiou a recondução de todo o comando do partido, do presidente Bruno Araújo a rivais em estados. Recebeu o chefe do PSDB mineiro, Paulo Abi-Ackel, aliado de sua nêmesis Aécio Neves (MG), e a prefeita Raquel Lira (Caruaru, PE), apoiadora de Leite.

Há duas semanas, convidou para almoçar em sua casa Tasso Jereissati, senador tucano cearense que se tornou grande articulador da candidatura de Leite após sair da disputa das prévias.

Se não fizeram exatamente as pazes, dado que Tasso está no grupo que diz apoiar a retomada do nome de Leite ou Simone Tebet (MDB) para a Presidência, um canal de comunicação foi restabelecido.

Na Câmara dos Deputados, ambiente mais hostil à sua candidatura, não lançou candidato à liderança da bancada, que ficou com um apoiador de Leite, Adolfo Viana (BA).

Por fim, trouxe Araújo para a coordenação de sua campanha. Mesmo nela, buscou evitar protagonismos ao montar uma equipe econômica com quatro nomes (Henrique Meirelles, Ana Carla Abrão, Zeina Latif e Vanessa Rahal).

A mudança de estilo de Doria não é casual, tendo sido sugerida a partir de pesquisas qualitativas feitas pelo PSDB. Elas apontam o excesso de marketing em ações governamentais positivas em São Paulo, como a busca pela vacina contra Covid-19, como algo que afetou diretamente a imagem pessoal do tucano.

Não é um processo simples. Há uma divisão clara na equipe de Doria acerca da abordagem a adotar, que pode ser resumida em um episódio na segunda passada (7). Chamado para coordenar a comunicação da campanha, o prefeito de Jundiaí, Luiz Eduardo Machado (PSDB), é um defensor dessa versão menos arestosa do tucano.

Ele bateu boca em uma reunião por volta das 18h com Daniel Braga, responsável por estratégia digital de Doria há anos e expoente da ala que aposta mais na exposição e no combate. O próprio Doria entrou na sala para ver o que acontecia. O motivo da altercação foi pontual, com Machado defendendo que análise de pesquisas fosse feita por um especialista no tema, e não por Braga.

Mas ela transpareceu o entrechoque maior em curso. No dia seguinte, Machado foi voto vencido, pois queria total ausência de comentários sobre o jantar dos adversários. De todo modo, houve uma modulação no tom, e todos seguem no barco.

Essa fase light pode ter data para acabar, dizem interlocutores do governador. Eles creem que o embate numa campanha com Lula e o presidente Jair Bolsonaro (PL) invariavelmente exigirá momentos de assertividade, queira ou não o candidato.

Resta agora combinar com os adversários e com o combustível que usam contra si: o baixo desempenho nas pesquisas eleitorais.

No mais recente Datafolha, sua melhor pontuação foi 4%, algo abaixo numericamente dos intermediários Ciro Gomes (PDT, 7%) e Sergio Moro (Podemos, 9%) e bem distante dos líderes Lula (48%) e Bolsonaro (22%).

Até aqui, Doria está com a faca no pescoço. Há dois aspectos centrais a motivar seus adversários, além obviamente das rixas pessoais colocadas, uma especialidade do PSDB —depois dos anos de Fernando Henrique Cardoso no Planalto (1995-2002), o partido só foi unido para uma eleição, em 2014, quando quase viu Aécio eleito.

Primeiro, se a candidatura não decolar, há o medo de que o baixo desempenho se transmita por toda a cadeia de postulações de governadores, senadores, deputados federais e estaduais.

Nesse cenário, ocorre a famosa “cristianização”, em referência à campanha malfada de Cristiano Machado à Presidência em 1950, quando o então PSD o abandonou em favor de Getúlio Vargas.

Segundo, dinheiro. O PSDB teve R$ 318 milhões na eleição de 2020, e Araújo deverá comandar um Fundo Eleitoral de R$ 378,9 milhões, que será disputado pela campanha presidencial e por todas as outras.

Por óbvio, se Doria estiver empacado, candidatos tucanos Brasil afora pressionarão por mais recursos para si, e essa é uma disputa que já começou.

O governador paulista contava com essas dissidências desde que venceu as difíceis prévias do partido, que até hoje geram acusações cruzadas: adversários falam em tentativa de fraude, aliados, em um modelo desenhado para derrotar Doria.

Seu plano de voo lembra um pouco o de Aécio em 2014, quando foi dado como derrotado antes e durante a campanha. A diferença é a de que o mineiro tinha apoio integral do partido, e Doria conta com um balé bastante complexo para tentar ampliar suas opções de jogo.

Além de montar uma federação partidária com o Cidadania, que está praticamente acertada, ele conversa com MDB e União Brasil (a amálgama DEM-PSL). É consenso que ambos os partidos, grandes, ricos e com líderes que nem sempre se conversam, dificilmente acertarão uma aliança duradoura com Doria.

Mas estrategistas do tucano acreditam que uniões pontuais em estados podem desaguar num apoio nacional para esta eleição caso a resistência do tucano em permanecer no páreo se mantenha como está.

Eles acreditam que o ex-juiz Sergio Moro, por exemplo, já perdeu o gás inicial da apresentação de sua candidatura, e que Ciro Gomes segue como um apêndice à esquerda de Lula.

Há dificuldades óbvias: Doria tem boa relação com os chefes do MDB, o ex-presidente Michel Temer e o presidente da sigla, Baleia Rossi, mas o partido no Nordeste, senador Renan Calheiros (AL) à frente, está com o petista.

Aqui entram outros fatores a considerar, como o caminho do PSD de Gilberto Kassab, que já trabalha com a hipótese de levar Leite para lançar com candidato, dada a relutância de seu preferido para a missão, o senador Rodrigo Pacheco (MG). E o dito PSDB histórico está sob assédio até de Lula.

Seja como for, por toda a fumaça no ar, há pouca definição efetiva até o fim de maio, quando cessa o prazo para a montagem das federações. O relógio corre contra Doria, que joga uma partida na qual depende de outros jogadores para tentar viabilizar-se.

Daí sua mudança de tom, restando saber se ela foi demasiado tardia ou não.

Folha  

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