Foi só Alckmin se aliar a Lula para sofrer injustiças
O ex-governador Geraldo Alckmin (ex-PSDB, sem partido), provável vice na chapa à Presidência de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), teve uma decisão favorável e outra contrária na Justiça Eleitoral em casos que envolvem a suspeita de caixa 2 em campanhas eleitorais.
No último dia 10, a 1ª Zona Eleitoral de São Paulo arquivou um inquérito que apurava pagamento de R$ 3 milhões pela Ecovias. Já nesta quinta (17) a Justiça decidiu ratificar uma outra denúncia, na qual Alckmin é acusado de receber R$ 11,3 milhões em caixa 2 da Odebrecht.
A decisão mais recente da Justiça Eleitoral rejeita a absolvição sumária pleiteada pela defesa do ex-governador em relação à acusação de recebimentos ilegais nas campanhas eleitorais de 2010 e 2014, na disputa ao Governo de São Paulo.
Segundo a Promotoria, Alckmin recebeu R$ 2 milhões em espécie da Odebrecht na campanha de dez anos atrás e R$ 9,3 milhões quando disputou a reeleição. Ele foi eleito nas duas ocasiões.
Uma semana antes, a Justiça Eleitoral arquivou uma outra investigação contra Alckmin, que apurava delação do ex-presidente da Ecovias Marcelino Rafart Seras, pelo suposto recebimento de caixa 2 no valor de R$ 3 milhões,, informação revelada pelo Valor Econômico e confirmada pela Folha.
O Ministério Público Eleitoral opinou pelo arquivamento desse caso devido ao esgotamento das atividades investigativas e devido ao longo tempo entre os fatos e a presente data.
Na área cível, porém, esse arquivamento não compromete um acordo de colaboração da Ecovias e do ex-presidente da concessionária com a Promotoria do Patrimônio Público, que teve sua homologação final na última terça (15).
Pelo acerto, Marcelino e a empresa aceitaram pagar R$ 638 milhões e R$ 12 milhões, respectivamente, para compensar as irregularidades que admitem ter cometido, incluindo pagamentos de caixa 2 a Alckmin —que chama a delação de inverídica e injusta.
Em relação à manutenção da denúncia do caso da Odebrecht pela Justiça, nota assinada pelos advogados José Eduardo Alckmin, Márcio Elias Rosa, Marcelo Martins de Oliveira, Fabio de Oliveira Machado e Verônica Sterman, que defendem o ex-governador, afirma que ela não traz fato novo e que a versão do Ministério Público é “baseada exclusivamente em delação premiada, cujo teor é improcedente”.
Segundo a nota, a Justiça Eleitoral já se pronunciou a respeito das eleições de 2010 e 2014 e não subsiste nenhum apontamento. “A decisão permitirá que o procedimento prossiga e novamente fique evidenciada injustiça da acusação”, diz a defesa de Alckmin.
No caso da Odebrecht, a informação foi divulgada inicialmente pelo jornal O Estado de S. Paulo e confirmada pela Folha.
A decisão judicial, porém, diz haver “indícios concretos” no material. “Por certo que as declarações apresentadas em colaboração premiada foram respaldadas por um contundente e robusto conjunto de elementos de convicção, que bem dão conta de demonstrar a presença de indícios concretos de envolvimento dos investigados na prática dos delitos”, afirma trecho do documento da Justiça Eleitoral.
A decisão do juiz Emílio Migliano Neto afirma que não se trata do momento processual adequado para exame aprofundado do mérito da ação, mas ratifica o recebimento da denúncia.
Além de Alckmin, mais nove acusados se tornaram réus, incluindo seis delatores da Odebrecht e pessoas próximas do ex-governador.
Segundo a acusação, em 2010 a empresa usava o codinome “Belém” para fazer os repasses. O dinheiro, dizem os delatores, vinha do Setor de Operações Estruturadas, apelidado de “departamento de propina” da empreiteira.
Adhemar Cesar Ribeiro, cunhado de Alckmin, é apontado como intermediário dos pagamentos em 2010, mas as acusações foram consideradas prescritas e ele não foi incluído na ação.
Já em 2014 houve 11 repasses que, segundo o Ministério Público, foram intermediados pelo tesoureiro Marco Monteiro.
Os promotores eleitorais afirmam que, ao fazer os repasses para a campanha do ex-governador, a empreiteira visava benefícios econômicos no governo do estado, “seja nas obras do Rodoanel seja nas obras do sistema metro-ferroviário”.
Também dizem que a própria construtora reconheceu que havia esquema de cartel em obras em São Paulo.
Além disso, em 2010 e 2014, o grupo Odebrecht não podia fazer doações eleitorais no estado porque controlava a concessionária que administra a rodovia Dom Pedro 1º e porque participou do consórcio de construção da linha 6 do Metrô.
Procurada, a Novonor, novo nome da Odebrecht, afirmou que “tem colaborado de forma permanente e eficaz com as autoridades em busca do pleno esclarecimento de fatos do passado”.
“Hoje, está inteiramente transformada. Usa as mais recomendadas normas de conformidade em seus processos internos e segue comprometida com uma atuação ética, íntegra e transparente”, diz a empresa.
Em relação à delação da Ecovias, após a Justiça Eleitoral arquivar a investigação, Alckmin afirmou que lamentava que, “depois de tantos anos, mas em novo ano eleitoral, o noticiário seja ocupado por versões irresponsáveis e acusações injustas”.
Em nota, o ex-governador afirmou que não conhecia os termos da colaboração, mas que a versão divulgada não era verdadeira e que suas campanhas eleitorais jamais receberam doações ilegais ou não declaradas.
Alckmin afirmou que seguirá prestando as contas para a sociedade e a Justiça, como é dever de todos.
De acordo com o relato do ex-presidente da concessionária, os valores foram pagos a título de caixa 2 — primeiro, em 2010, em um total de R$ 1 milhão. Na ocasião, pelo PSDB, Alckmin foi eleito governador.
A segunda parte, no valor de R$ 2 milhões, teria sido para a campanha de 2014. Naquele ano, Alckmin se reelegeu ao governo paulista.
O pagamento teria se dado por meio de pessoas ligadas ao governador, segundo o relato do delator.
O acordo de não persecução da Ecovias com a Promotoria do Patrimônio Público foi fechado em R$ 638 milhões —valor que ela deverá bancar parte em obras e parte em dinheiro como compensação pelas irregularidades. Já Marcelino Rafart de Seras terá de pagar R$ 12 milhões ao Tesouro.
Em 2021, esse acordo chegou a ser rejeitado inicialmente pelo Conselho Superior do Ministério Público, mas acabou depois sendo homologado pelo órgão. Com isso, tanto a empresa quanto o executivo não serão processados.
O Ministério Público investigará ainda outras concessionárias de rodovias de São Paulo não contempladas pelo acordo. Antes, porém, será preciso fazer a homologação na Justiça.
Folha de SP