Sem ter petróleo, Argentina tem gasolina bem mais barata

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Foto: Denise Paro/UOL

Brasileiros passam até quatro horas em filas de postos de combustíveis em Puerto Iguazú, na Argentina, na fronteira com Foz do Iguaçu (PR), para comprar gasolina mais barata. O movimento está causando até falta de combustível para os moradores. Os cinco postos da cidade de 80 mil habitantes não conseguem atender a demanda porque passaram a receber volume menor de gasolina e diesel após a alta do petróleo.

Os brasileiros cruzam a fronteira para encher o tanque mesmo tendo que enfrentar filas e pagar mais que os consumidores argentinos. Em Puerto Iguazú, o combustível é mais caro para estrangeiros. Enquanto os argentinos desembolsam de R$ 5,17 a R$ 5,56 pelo litro da gasolina aditivada, brasileiros e paraguaios pagam cerca de R$ 6,65 a 6,82, conforme o câmbio. Em Foz do Iguaçu, a gasolina aditivada custa em média R$ 7,30 o litro, podendo chegar a R$ 7,49. Pelas regras dos postos de Puerto Iguazú, só é permitido aos estrangeiros abastecer o carro com gasolina aditivada, que é mais cara.

Os motoristas brasileiros ainda precisam seguir outras exigências. Só podem abastecer até 40 litros por tanque e respeitar horários determinados pelos postos. As bombas estão disponíveis para estrangeiros apenas das 12h às 18h e das 23h às 6h, em dias de semana, e das 12h às 6h em finais de semana e feriado. Nos postos, há filas diferenciadas para argentinos e estrangeiros, e alguns estabelecimentos não vendem combustível para brasileiros.

Apesar de todas as dificuldades, para alguns motoristas, cruzar a fronteira ainda compensa. O mototaxista Angelo Pereira vai a Puerto Iguazú a cada dois dias para encher o tanque. Ele e a esposa, que é motorista de aplicativo, dependem do combustível para sobreviver. Por isso, a diferença no preço compensa.

“Se formos trabalhar com o combustível brasileiro, não temos lucro”, diz. Pereira conta que percorre 30 quilômetros, ida e volta, entre Foz do Iguaçu e Puerto Iguazú.

Brasileiro que estuda medicina no Paraguai, Hiago Afonso vai a Puerto Iguazú toda semana, mesmo tendo que enfrentar uma espera de duas a quatro horas nas filas. Ele diz que gasta cerca de R$ 400 de sua camionete para encher o tanque no Brasil. Na Argentina, o valor cai para R$ 247. Para aproveitar a viagem, Afonso às vezes também compra carne pela metade do preço cobrado no Brasil.

As filas para abastecer não se restringem aos brasileiros. Com o combustível em falta, os argentinos às vezes precisam aguardar horas até que os postos recebam gasolina. Morador de Puerto Iguazú, o construtor Miguel Valverde conta que às vezes fica quatro horas em filas. Para Valverde, a presença de brasileiros é bem-vinda na cidade porque mexe com o comércio e gera dinheiro.

A alta demanda pela gasolina criou um comércio clandestino em Puerto Iguazú. Motoristas dizem que, quando o combustível acaba ou o horário de abastecer para estrangeiros chega ao fim, vendedores de gasolina circulam próximo às filas para oferecer o produto um pouco mais caro que nos postos.

Um motorista brasileiro revelou que foi abordado e convidado a ir à periferia da cidade, mas acabou desistindo. “Nós não sabemos que gasolina vamos comprar”, diz Nilvaldo da Silveira. Sabendo da prática ilegal, a polícia argentina intensificou a fiscalização em Puerto Iguazú.

Representante da Câmara de Combustíveis da província de Misiones, Faruk Jalaf diz que o desabastecimento atinge outras localidades da Argentina porque não há produção suficiente no país para atender a demanda.

No caso de Puerto Iguazú, situada em Misiones, a situação é pior porque a cota de combustível destinada à cidade é menor em relação a outras localidades do país, e a demanda de brasileiros e paraguaios é grande.

Por isso, o preço na fronteira é em geral mais alto que em outras localidades da Argentina. “Só uns 3% de moradores de Foz do Iguaçu levam toda gasolina”.

Jalaf ainda diz que as petroleiras instaladas no país preferem exportar o produto em vez de vendê-lo no mercado interno porque o preço praticado não cobre os custos de produção. “Os únicos que sofrem as consequências são os postos, porque têm os preços congelados”, afirma.

A gasolina, que no final do ano custava pouco mais de R$ 3,40, teve reajuste após o aumento no valor do barril de petróleo.

O professor do curso de Engenharia de Energia da Universidade Federal da Integração Latino-America (Unila) Ricardo Hartmann explica que o valor da gasolina na Argentina é mais em conta se comparado ao Brasil porque lá o governo faz a mediação de preços, ou seja, aplica uma política e não fica sujeito à variação do mercado internacional.

O Brasil não essa faz mediação desde o governo do ex-presidente Michel Temer. “Com a guerra, nós sofremos porque não há mediação. O governo optou por deixar o preço ao gosto do mercado.”

Uol