Governos estaduais perdem secretários para eleições

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Foto: Zanone Fraissat-20.ago.21/Folhapress

O fim do prazo para se desvincular de instituições públicas e se filiar a partidos fez ao menos 147 secretários deixarem seus cargos nos governos estaduais. Eles devem usar a visibilidade que tinham no Poder Executivo como trampolim para concorrer a cargos eletivos em outubro.

Levantamento feito pela Folha junto a todas as unidades da federação mostra que os locais com o maior número de trocas na última semana foram Rio de Janeiro (15), Maranhão (12), Rio Grande do Sul (11) e São Paulo (10). O Tocantins foi o único que não respondeu.

Quase metade dos possíveis candidatos saiu de sete pastas que costumam ter destaque no debate público. São elas: Agricultura (11 titulares deixaram esses postos), Fazenda (11), Saúde (10), Educação, Infraestrutura, Turismo e Direitos Humanos (8 em cada uma) —veja a lista completa ao final.

“Na pandemia os secretários de Saúde foram estrelas, apareciam diariamente na mídia. Eles e os secretários de Educação trabalham com corpos de funcionários muito grandes, todo mundo sabe quem está no comando”, lembra Gustavo Fernandes, professor de gestão pública da escola de administração da FGV (Eaesp).

Entre os secretários de Saúde que vão tentar a sorte nas urnas está Carlos Lula, do Maranhão, que ainda teve uma vitrine nacional como presidente do Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde). Ele quer ser deputado estadual pelo PSB.

Para ele, as candidaturas foram um caminho natural após a visibilidade alcançada na crise. Parte deles concorrerá pela primeira vez.

“Em muitos casos, a candidatura não foi nem desejo pessoal, mas o governador pediu, o partido pediu. Será uma nova forma de trabalhar em favor do sistema público de saúde”, afirma.

Somente três secretários deixaram seus postos para concorrer a governador, mas vindos de outras áreas: Jerônimo Rodrigues (PT) na Bahia, Rafael Fonteles (PT) no Piauí e Eduardo Riedel (PSDB) no Mato Grosso do Sul.

O agora governador Ranolfo Vieira Júnior (PSDB), do Rio Grande do Sul, também acumulava o cargo de vice com a pasta da Segurança Pública e tentará se reeleger.

Os dois petistas nordestinos nesse grupo têm perfil parecido, mas trajetórias distintas rumo às urnas. São relativamente jovens, nunca concorreram a cargos eletivos e ganharam notoriedade dentro da burocracia dos governos piauiense de Wellington Dias (PT) e baiano de Rui Costa (PT).

Fonteles, titular da Fazenda em seu estado, foi preparado pelo governador para sua sucessão e desde o ano passado já era tratado como pré-candidato. À frente de uma pasta mais técnica, esteve blindado durante a gestão e não costumava ser alvo de críticas dos adversários.

Já a pré-candidatura do baiano Rodrigues foi uma surpresa e se consolidou apenas em março, após os senadores experientes Jaques Wagner (PT) e Otto Alencar (PSD) desistirem da disputa. Ele era secretário de Educação, um calo das gestões petistas na Bahia, por isso foi alvo de duras críticas de oposicionistas após decidir concorrer.

O mato-grossense-do-sul Riedel, por sua vez, é ligado ao setor de agricultura e pecuária, um dos pilares da economia local. Deixou a Secretaria de Habitação e Infraestrutura e é apontado desde o ano passado como candidato à sucessão do governador Reinaldo Azambuja (PSDB).

Dois ex-secretários de Educação devem disputar cargos de vice-governador no Nordeste. Um deles é Rafael Britto (MDB), em Alagoas, cotado para a chapa liderada pelo deputado estadual Paulo Dantas (MDB) e apoiada pelo ex-governador Renan Filho (MDB).

O outro é Felipe Camarão (PT), do Maranhão, escolhido nesta semana para estar ao lado do governador Carlos Brandão (PSB), vice que assumiu com a renúncia de Flávio Dino (PSB). Secretário de Dino desde 2015, ele também nunca pleiteou cargos eletivos.

Mais um personagem de peso surgido no setor é Rossieli Soares (PSDB), que quer chegar à Câmara dos Deputados por São Paulo. João Doria já sugeriu que pode convidá-lo para voltar ao Ministério da Educação caso seja eleito presidente —ele comandou a pasta no governo de Michel Temer em 2018.

Também ex-ministro e recém-saído da Fazenda do governo paulista, Henrique Meirelles (União Brasil) ainda tem futuro incerto. Depois de desistir de tentar o Senado por Goiás, ele é um dos cotados para a vaga de vice de Rodrigo Garcia (PSDB), que assumiu o posto de Doria e tentará se reeleger.

A Segurança Pública é outro palanque importante para pré-candidatos, principalmente à direita do espectro político. Foi dali que saíram cinco secretários de olho nas eleições, incluindo o delegado Allan Turnowski no Rio de Janeiro.

Antes à frente da Polícia Civil, que tem status de secretaria no estado, ele é a principal aposta do PL para deputado federal e tem usado o massacre do Jacarezinho como trunfo político: “27 criminosos morreram, o RJ ficou mais seguro, o bem venceu o mal”, postou na última quinta (7).

Em Alagoas, Alfredo Gaspar de Mendonça também vai concorrer a deputado federal, mas trocou de lado e se filiou à União Brasil, partido de oposição ao ex-governador Renan Filho (MDB). Ele alegou falta de alinhamento ideológico com o MDB local, que vai apoiar o ex-presidente Lula (PT).

Há ainda os que deixaram as secretarias estaduais para ficar por trás das cortinas. É o caso de Rodrigo Maia, que há poucos dias se filiou ao PSDB e descartou a candidatura a deputado federal pelo RJ para continuar apenas coordenando a campanha de Doria.

O mesmo fará Osmar Júnior (PC do B), ex-secretário de Governo do Piauí. Ele vai comandar as campanhas de Rafael Fonteles (PT) e Wellington Dias (PT) para governador e senador, respectivamente.

Outros que saíram das pastas na última semana são deputados de mandato, que haviam optado por exercer uma função nos governos, com musculatura de articulação, mesmo tendo vencido para o parlamento em 2018. Agora eles voltam às suas cadeiras.

Nesse grupo estão o deputado federal Sandro Alex (PSD), ex-titular de Infraestrutura e Logística no Paraná, e o deputado estadual Rodrigo Novaes (PSD), antes à frente do Turismo em Pernambuco. Eles ficaram entre os mais votados nos seus estados há quatro anos.

O próximo passo é formalizar as pré-candidaturas entre 20 de julho e 5 de agosto, e as candidaturas até 15 de agosto. Para Gustavo Fernandes, professor da FGV, as chances de que esses ex-secretários sejam eleitos não são pequenas.

“Qualquer pasta dá potencial a um candidato a deputado estadual e, se apareceu muito, a deputado federal ou até senador. Daqui a dois anos, já podemos esperar outra onda de secretários saindo para serem prefeitos de grandes cidades”, ressalta.

A maior consequência dessa dança das cadeiras, diz, é uma descontinuidade das gestões, geralmente pouco institucionalizadas. “A solução é proibir isso? Não. Mas é mudar a máquina para que se possa tocar políticas públicas independentemente de quem esteja ali”, avalia.

Folha