ONU dá vitória a Lula considerando Moro suspeito
O Comitê de Direitos Humanos da ONU (Organização das Nações Unidas) concluiu que o ex-juiz Sergio Moro foi parcial em seu julgamento dos processos contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no âmbito da Operação Lava Jato. A decisão é o primeiro golpe internacional contra o ex-ministro da Justiça do governo de Jair Bolsonaro.
O órgão também concluiu que os direitos políticos de Lula foram violados em 2018, quando ele foi impedido de disputar as eleições. Depois de seis anos de análise em Genebra, a decisão é legalmente vinculante e, com o Brasil tendo ratificado os tratados internacionais, o estado tem a obrigação de seguir a recomendação. Mas sem uma forma de obrigar os países a adotar as medidas ou penas contra os governos, o comitê sabe que muitas de suas decisões correm o risco de serem ignoradas
No caso brasileiro, o STF (Supremo Tribunal Federal) já o considerou Moro como tendo agido de forma parcial e anulou as condenações. Mas recomendações ainda serão publicadas pelo comitê da ONU nos próximos dias e podem pedir medidas para reparar o dano sofrido por Lula.
O comitê é o encarregado de supervisionar o cumprimento do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, assinado e ratificado pelo Brasil. Tanto o governo como os advogados de Lula já foram informados sobre o resultado do caso, mas o anúncio oficial ocorre apenas nesta quinta-feira.
Procurada, a defesa do ex-presidente indicou que não poderia comentar o resultado por causa de um embargo imposto pela ONU. Já Moro também foi procurado pela reportagem, mas ainda não comentou a decisão. Lula foi representado na ONU pelos advogados Valeska Zanin Martins e Cristiano Zanin Martins, além do britânico Geoffrey Robertson.
O órgão internacional avaliava o caso desde 2016. A queixa envolvia quatro denúncias feitas pela defesa do petista, todas elas atendidas pelo comitê de forma favorável ao ex-presidente: a detenção de Lula pela PF em 2016 em uma sala do aeroporto de Congonhas, considerada como arbitrária por seus advogados; a parcialidade do processo e julgamento; a difusão de mensagens de caráter privado de familiares de Lula; e a impossibilidade de uma candidatura em 2018; O Comitê concluiu que houve violação dos direitos do ex-presidente em todos os artigos. O STF já considerou que Moro havia violado regras do processo e anulou as condenações, permitindo que Lula esteja livre para se candidatar à Presidência em 2022.
Mas, ainda assim, o processo continuou nas instâncias internacionais. Foram duas as decisões do STF. A corte considerou Moro parcial e anulou as condenações de Lula por decidir que os casos não deveriam ter ficado com a Justiça do Paraná. Bastidores No caso brasileiro, em meados de agosto de 2018, o comitê deu uma primeira vitória ao ex -presidente. O órgão concedeu medidas cautelares e solicitou às autoridades brasileiras que mantivessem os direitos políticos de Lula até que seu caso fosse avaliado pelo STF e que o mérito do caso fosse tratado em Genebra. A decisão do comitê foi ignorada pelo estado brasileiro.
Mas o UOL apurou que a reação do Brasil foi levada em consideração pelo comitê, que considerou como um fato grave. Na decisão emitida agora, a opção do Brasil por ignorar as medidas cautelares foi criticada. No início de março de 2022, o tema entrou na agenda dos peritos que formam parte do comitê, mas nem todos concordavam que uma condenação contra o estado brasileiro deveria ser emitida.
Para uma parcela deles, ao reverter a situação, o STF já deixou claro que as instituições brasileiras estavam funcionando e que não seria necessário que o Comitê se envolvesse numa decisão. O debate, sem um acordo, teve de seguir para os 18 peritos do Comitê que, juntos, tomaram uma decisão final. Eles tinham de avaliar tanto a admissibilidade do caso como a questão do mérito.
A esperança do governo brasileiro era de que o caso jamais fosse aceito para ser avaliado pela ONU, alegando que a Justiça doméstica estava dando respostas ao processo e que, portanto, recorrer a instâncias internacionais não era adequado. Em documentos obtidos pelo UOL, o governo de Jair Bolsonaro insistia que Moro agiu dentro das regras de um estado de direito e que o processo caminhou por todas as instâncias.
No final do ano passado, numa comunicação enviada para a ONU, os advogados do ex-presidente ainda insistiram que o caso precisa continuar a ser examinado e que existem “danos Irreversíveis” contra o ex-presidente, entre eles sua prisão por 580 dias e a decisão de o impedir de ser candidato em 2018. Segundo a petição assinada pelos advogados Geoffrey Robertson, Valeska Zanin Martins e Cristiano Zanin Martins, “as violações sofridas por Lula ainda estão sendo descobertas através de uma investigação em andamento”. Na queixa, a defesa cita reportagem do UOL na qual se revelou como o Ministério Público manteve contatos com a empresa que buscava vender um equipamento de espionagem de Israel, o Pegasus. O produto nunca foi comprado.
A petição ainda atualiza os peritos da ONU sobre as anulações dos processos contra Lula e indica que Moro tinha “manipulado as regras”. “A Corte decidiu que Lula não teve um julgamento justo e imparcial”, apontam. Os advogados ainda dizem que Moro “decidiu fazer parte do Governo eleito (Bolsonaro)” e que o ex-juiz “foi diretamente beneficiado pela condenação e prisão do peticionário”. “Ele aceitou participar do governo de Jair Bolsonaro e agora é considerado como um candidato até mesmo para Presidente da República nas eleições que ocorrerão em 2022”, diz a petição.
UOL