Mulheres evangélicas estão mais preocupadas com sobrevivência
Estimados em 30% da população brasileira, os evangélicos formam uma parcela do eleitorado bastante disputada pelos candidatos a cargos no pleito de outubro. Partidos montaram núcleos específicos para dialogar com esse público que, diferentemente do senso comum, não caminha de forma homogênea quando chegam as eleições. Desvendar essas diferenças é o desafio dos estrategistas políticos, que passa pela compreensão do papel da mulher como influenciadora nas decisões das famílias evangélicas.
Analistas sociais e políticos avaliam dois recortes das pesquisas de intenção de votos que apontam que o presidente Jair Bolsonaro (PL) não tem o controle absoluto desses votos, apesar de liderar as sondagens de opinião no segmento evangélico. Nos cultos, por exemplo, a presença das mulheres é majoritária. De cada três fiéis que frequentam igrejas, dois são mulheres, segundo levantamento do Observatório Evangélico, que acompanha os debates envolvendo o tema.
Como as pesquisas divulgadas nos últimos meses indicam que a rejeição a Bolsonaro é bem maior entre as mulheres do que no eleitorado masculino, a aposta dos concorrentes é de que, entre os evangélicos, o voto de oposição pode crescer justamente entre as eleitoras crentes. De acordo com a última pesquisa Ipespe, feita entre 18 e 20 de abril, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) lidera com folga no segmento feminino em geral, com 48%, contra 26% de Bolsonaro. Entre os evangélicos, a liderança é do atual chefe do Executivo: com 45%, contra 34% do petista.
Quando os resultados das pesquisas disponíveis são agregados, a aprovação do governo se mostra bem menor entre as mulheres, em torno de 20%, do que entre os homens, de cerca de 30%. É no cruzamento desses dados que reside a esperança da oposição de conquistar uma parcela mais expressiva do eleitorado feminino evangélico.
“A evangélica está se perguntando, neste momento, quem é o menos pior”, opina o antropólogo Juliano Spyer, coordenador do Observatório Evangélico. Ele destaca que essas eleitoras são, “majoritariamente pretas, pobres e moradoras da periferia”, mais refratárias ao discurso bolsonarista de defesa das armas e de confronto com opositores e instituições e mais ligadas às pautas que envolvem a própria família, como desemprego, inflação, violência e moradia.
“Essa é uma grande fragilidade do discurso de Bolsonaro e um desafio para a campanha dele: torná-lo mais palatável para esse público feminino. Posar com crianças fazendo sinal de arminha na mão pega muito mal, não é um gesto cristão”, observa Spyer.
Para reduzir a rejeição entre as mulheres evangélicas, Bolsonaro escalou a própria esposa, Michelle, e a ex-ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos Damares Alves para conversar mais diretamente com esse público.
“Isso não tem sido trabalhado pelas esquerdas, que têm dificuldade de dialogar com essas pessoas. Mais do que falar, os candidatos precisam ouvi-las. É justamente isso que Damares e Michelle estão fazendo”, avalia Magali Cunha, doutora em ciências da comunicação e pesquisadora do Instituto de Estudos da Religião (Iser). O cientista político Vinicius do Vale, da Universidade de São Paulo (USP), corrobora: “A primeira-dama e Damares são figuras com certa popularidade e estão tentando mostrar uma face de Bolsonaro menos extremada”.
Correio Braziliense