Ex-embaixadores acusam Bolsonaro de destruir diplomacia

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Foto: Silvia Costanti/Valor

O encontro promovido pelo presidente Jair Bolsonaro com embaixadores estrangeiros para atacar o sistema eleitoral brasileiro e divulgar informações falsas foi uma reunião “insólita” que “não se enquadra nas normas da diplomacia internacional” e que resultou “em constrangimento para os convidados e para o Brasil”, segundo ex-embaixadores ouvidos pelo Valor. A reunião ocorreu na tarde de 18 de julho, no Palácio da Alvorada.

“O encontro é inusitado, porque nenhum chefe de Estado convoca governos estrangeiros para criticar seu próprio país, as instituições de seus país, membros de outros Poderes e para colocar em dúvida a segurança de seu sistema eleitoral e a confiabilidade das urnas eletrônicas”, afirma Rubens Barbosa, que foi embaixador do Brasil em Londres (1994-1999) e em Washington (1999-2004).

Segundo Barbosa, as chancelarias estrangeiras provavelmente receberam relatórios sobre o encontro enviados por suas embaixadas que devem ter incluído também a resposta do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e do presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

Após o encontro, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Edson Fachin, disse que “é hora de dizer basta à desinformação e ao populismo autoritário que coloca em xeque a Constituição de 1988”.

Pacheco divulgou nota afirmando que a “segurança das urnas eletrônicas e a lisura do processo eleitoral não podem mais ser colocadas em dúvida”.

“É um episódio extremamente raro de um presidente convocar o corpo diplomático acreditado junto a seu governo para tentar desconstruir a democracia e a Justiça Eleitoral de seu país”, observa o ex-secretário-geral do Itamaraty, Marcos Azambuja, que foi embaixador do Brasil na Argentina (1992-1997) e na França (1997-2004).

Para ele, a reunião de Bolsonaro com os embaixadores “foi um momento de constrangimento para os que foram convidados, imagino, e constrangimento também para o Brasil, que se viu nesta situação de ter convidado o mundo para julgá-lo numa área em que o nosso comportamento tem sido artigo exemplar, o jogo eleitoral”.

O ex-embaixador avalia que há duas consequências imediatas que podem resultar do encontro. “O descrédito internacional pelo governo que o Brasil tem, e de certa maneira a reação nacional a isso tem sido tão intensa, tão unânime, que tenho impressão de que a tentativa de deslegitimar o processo democrático não vai prosperar”.

Para o ex-ministro das Relações Exteriores no governo Temer (2016-2018) Aloysio Nunes, a conferência convocada por Bolsonaro “foi uma reunião insólita que não pode ser vista como iniciativa diplomática”.

Filiado ao PSDB, Aloysio declarou em maio que votaria no pré-candidato a presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo o ex-chanceler, a retórica falseada de Bolsonaro mirou seu público doméstico. “O público visado por ele era doméstico, seus apoiadores mais radicais, com o objetivo de incutir nesse público um ânimo enérgico para a participação nas próximas desordens que ele não deixará de provocar até as eleições”.

Durante o encontro, Bolsonaro repetiu alegações falsas sobre as urnas eletrônicas, já desmentidas diversas vezes por autoridades. O presidente também reiterou ataques a ministros integrantes de cortes superiores. A reunião foi transmitida ao vivo, do início ao fim, pela TV Brasil, rede de televisão pública gerida pela Empresa Brasil de Comunicação (EBC).

Valor Econômico