Lira não consegue aprovar PEC eleitoreira por “queda no sistema”
Foto: Cleia Viana/Câmara dos Deputados
Depois de aprovada em primeiro turno, na Câmara dos Deputados, ontem, a PEC das Bondades — que já foi chamada de kamikaze pelo ministro da economia, Paulo Guedes — volta hoje ao Plenário, em sessão marcada para começar às 9h. Pouco antes do encerramento da primeira votação, com placar marcando 393 votos a favor, 12 contra e duas abstenções, o sistema eletrônico da Câmara parou de funcionar. Isso gerou desentendimento entre parlamentares governistas e de oposição, e obrigou o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), a adiar o segundo turno da votação.
O líder do PL na Câmara, Altineu Côrtes (RJ), chegou a falar em “fraude” e “ataque à democracia”, mas Lira negou qualquer possibilidade de violação do sistema que registra os votos dos parlamentares. De acordo com o presidente da Casa, dois servidores de internet “caíram” ou “foram cortados” ao mesmo tempo. Mas, na visão dele, o problema tecnológico é “grave” e “não usual”. Lira acionou a Polícia Legislativa para investigar os motivos da pane.
Ele informou ainda que, como essa não foi a primeira vez que o sistema apresentou falhas técnicas, pedirá à Polícia Federal (PF) e ao Ministério da Justiça que investiguem as causas da queda do sistema de internet da Casa, que tirou do ar, inclusive o site da Câmara dos Deputados. “A apuração será rigorosa e dura com essa coincidência na Câmara dos Deputados”, disse ele, deixando no ar a dúvida sobre uma possível ação externa.
Antes do episódio, a votação ocorria em harmonia com o acordo feito entre Lira e a oposição, fechado na manhã de ontem. Lira abriu a sessão avisando que iria votar, inicialmente, a PEC 11, que institui piso salarial para a categoria da enfermagem. E marcou hora para que a votação fosse concluída, às 18h45. “Conto com a colaboração dos líderes”, avisou. Era uma estratégia para medir a presença em Plenário.
Se houvesse quórum para aprovar a PEC 11, a PEC das bondades (PEC 15) entraria na sequência. Esse era o texto que interessava ao governo, porque viabiliza a concessão de benefícios sociais, como o aumento do valor do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600, o reajuste do vale-gás e a concessão de um voucher no valor de R$ 1 mil a caminhoneiros e taxistas autônomos. “Tem muita gente que não está gostando do jeito que Lira está fazendo as coisas, tratorando tudo”, criticou o deputado Felipe Rigoni (União Brasil-ES).
A PEC das Bondades é a maior aposta do governo de Jair Bolsonaro, pré-candidato à reeleição, para escalar nas pesquisas de intenção de votos. E a pressa para aprovar o pacote eleitoral tem dois motivos: o recesso parlamentar, que começa na semana que vem, e o desejo do governo de iniciar o pagamento dos benefícios já a partir de agosto, dois meses antes do primeiro turno das eleições presidenciais.
O texto obteve 407 votos a favor, quase 100 votos a mais do que o mínimo exigido para aprovação de uma mudança na Constituição, 308 votos.
Até a oposição dava como certa a aprovação da PEC das Bondades. Com ambições eleitorais, a maioria dos parlamentares preferiu não comprar briga com o eleitor se posicionando contra uma medida que transfere renda diretamente para os mais pobres, apesar de também atender a caminhoneiros e taxistas e provocar um rombo de mais de R$ 41 bilhões nas contas públicas.
Na opinião do economista e consultor político Vinicius do Carmo, como a PEC dos benefícios é provisória, a manobra do governo pode ser arriscada porque, mais à frente, os benefícios tenderão a se tornar uma política definitiva. “Está havendo um superávit, porém, vão torrar todo esse superávit com essas medidas apressadas e eleitoreiras. É arriscado, todo benefício temporário corre o risco de ser permanente. Se virar permanente, de onde virá o dinheiro para prolongar o benefício? É apenas inflação, não é sustentável no tempo”, alertou.
A líder do Republicanos, deputada Alê Silva (MG), defendeu a o caráter temporário das benesses e disse que “a esquerda sempre quer um pouquinho mais, quer que a PEC seja permanente, mas o governo está fazendo o que pode, com o que é viável agora para os cofres públicos”.