Micronanico, candidato do Novo tem grande espaço na mídia
Foto: Egberto Nogueira/Ímãfotogaleria/VEJA
Pré-candidato a presidente da República pelo Novo e com a quase impossível missão de furar a bolha da polarização entre Jair Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o cientista político e empresário Luiz Felipe D’Avila, de 58 anos, repete o previsível discurso de quem vem muito atrás nas pesquisas, dizendo acreditar em uma virada. Obviamente, fora o candidato, poucos acreditam nisso a menos de três meses do pleito. Oscilando na faixa entre zero e 2% das intenções de voto nas pesquisas, ele tem como base de seu discurso de campanha o alerta ao eleitorado sobre as agruras sociais, políticas, ambientais e econômicas promovidas pelos governos do PT (e do MDB) e pelo atual. Um dos possíveis integrantes da caravana da terceira via, o candidato atribui o fracasso do movimento às pretensões fisiológicas e personalistas de poder, que impediram a união dos candidatos em torno de um projeto para o Brasil. Em um escritório de coworking transformado parcialmente em comitê no Jardim Europa, área nobre de São Paulo, D’Avila, que chega e sai do local de bicicleta, recebeu a reportagem de VEJA para falar sobre os problemas do país, a difícil situação vivida pelo centro democrático, o risco de naufrágio da pauta liberal que o Novo defende e o desafio de manter o partido relevante depois de surpreender em 2018, quando o presidenciável João Amoêdo chegou em quinto lugar na estreia da sigla em uma disputa presidencial.
Diante de tanta dificuldade de romper a polarização entre Lula e Bolsonaro, dá para acreditar na viabilidade de sua candidatura, levando-se em conta que nomes mais conhecidos naufragaram nessa tentativa? Claro que sim. O cenário é igual ao do governador do meu partido, Romeu Zema, em 2018. Ele tinha 1 ponto em julho e 2 em agosto, era o último colocado em Minas e venceu a eleição. Eu sempre pergunto às pessoas se a vida delas melhorou ou piorou nos últimos dez anos. A resposta quase unânime é que piorou. A realidade está muito difícil e o passado é uma tragédia. Os quatro governos petistas entregaram ao Brasil a maior recessão da história, com 13 milhões de desempregados e um pior resultado fiscal nas contas públicas. Depois, veio o governo Bolsonaro, com toda a crise mundial e a pandemia, e sua incapacidade de implementar as mudanças liberais que tinha prometido. O brasileiro não é masoquista e não votará em duas tragédias.
Pelo andar das pesquisas, parece que votará nas duas, sim. As pessoas ainda não estão preocupadas com o voto. Elas estão preocupadas em sobreviver economicamente, em pagar boleto. Por outro lado, reconheço que a política está muito distante da realidade das pessoas. Ela se tornou algo de gabinete, fechado em partidos, sem conversar com as pessoas. Isso é fruto do radicalismo e da polarização. A política tornou-se um assunto tóxico.
Por que a terceira via para a eleição presidencial não engrenou? Porque nunca teve união em torno de um projeto de país. O que sobra é fisiologismo político e conversa dos caciques partidários. Os partidos não se preocupam com eleições majoritárias por causa do Fundo Eleitoral. Rifam essas candidaturas em detrimento das eleições para deputado. O fundo deturpou a política.
“A terceira via tornou-se uma cadeira elétrica. Quem se sentou ali foi fritado. Todos que passaram por lá: Sergio Moro, Eduardo Leite, Mandetta, João Doria, Rodrigo Pacheco”
O senhor sonhou em ser o nome da terceira via? Esse tipo de política não interessa ao Novo. A visão imediatista, eleitoreira, sem pensar no país, fez com que a terceira via inexistisse. Falar que não é Lula nem Bolsonaro é muito pouco. A terceira via tornou-se uma cadeira elétrica. Quem se sento ali foi fritado. Todos que passaram por lá: Sergio Moro, Eduardo Leite, Mandetta, João Doria, Rodrigo Pacheco…
Simone Tebet será a próxima? Não sei. Mas, se seguir em frente, será uma candidatura muito fragilizada pela história do MDB.
Entre Lula e Bolsonaro, em um segundo turno, para quem vai seu voto? Eu anularei, como o fiz em 2018. Estou na campanha para combater o populismo e resgatar a democracia, que hoje está em risco. Não vou compactuar com um desses populistas que colocará a democracia em xeque, que colocará a economia em xeque. Eu não quero ter meu nome vinculado a duas candidaturas desastrosas.
Como o senhor viu as falas de Bolsonaro sobre as urnas eletrônicas diante de embaixadores? Uma lástima. Foi o maior constrangimento na política externa que eu já vi na história do Brasil. Convocar embaixadores para deslegitimar o sistema eleitoral foi uma vergonha. O Brasil hoje é um pária internacional. No último encontro que o Bolsonaro participou no G20, nenhum chefe de Estado quis conversar com ele. Só sobraram os garçons para ele conversar. O mecanismo eleitoral eletrônico funciona há 25 anos, com eleições periódicas, limpas, transparentes e reconhecidas internacionalmente como um modelo.
O que Bolsonaro fará em caso de derrota? Teme algo parecido com o ocorrido nos Estados Unidos, com a invasão do Capitólio? Acredito que a tensão está subindo a um nível preocupante. Mesmo que não haja invasão no Congresso ou no Supremo, o grande problema é o não reconhecimento da vitória do vencedor. Em uma democracia, o telefonema mais importante é o do perdedor para o vencedor, para dar-lhe boa sorte e dizer que a partir daquele momento somos todos brasileiros. Isso não vai acontecer em caso de vitória de um deles.
Não há nada de positivo no governo Bolsonaro? Apesar de ter sido um governo trágico do ponto de vista institucional para a democracia, Bolsonaro aprovou projetos importantes, como o marco legal do saneamento básico, a independência do Banco Central, o marco das startups, a nova lei do gás. O Brasil avançou em temas importantes, apesar do governo.
Bolsonaro terá ganho eleitoral com o aumento dos benefícios sociais às vésperas da eleição? Não sei qual impacto vai ter. No fundo, como o Lula diz, “pega o dinheiro do Bolsonaro e vota em mim”. Política tem a ver com emoção, com coração. E, nesse sentido, o Lula consegue atrair mais gente do que o Bolsonaro. Não é só dinheiro, é questão de empatia, de esperança. E essa é a primeira campanha que vejo desde a democratização em que a palavra esperança não existe. O que existe é votar em um mal menor.
Pouco se fala na pré-campanha das crises social, econômica e ambiental. Por que o debate está tão raso? Porque a política não conversa com as pessoas. Se conversasse, os políticos perceberiam que esses são os assuntos que interessam para a população. Esse debate o Novo sempre promoveu.
Pelo visto, tanto Lula quanto Bolsonaro não deverão seguir o teto de gastos. Qual a consequência disso? Será um risco tremendo, que trará consequências diretas para o bolso da população. Veja a situação em que a Argentina se encontra. O Brasil, se não tiver juízo fiscal e houver um risco de calote, vai virar uma Argentina.
Bolsonaro prometeu mais de cinquenta privatizações, mas entregou poucas, como a da Eletrobras. Por que é tão difícil desestatizar no Brasil? Porque o Bolsonaro não acredita nas privatizações. Nós vamos privatizar tudo: Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil, Petrobras, Correios, absolutamente tudo. Nós acreditamos que privatização é aumento da concorrência. E, quanto mais promovemos a concorrência, melhor a qualidade do produto e menor o preço. Assim é no mercado do mundo todo.
Uma eventual vitória de Lula enterraria de vez a pauta liberal no país? Não enterra, pois continuaremos lutando por essa pauta. Mas é evidente que o Lula, se for eleito, não vai aprovar nenhuma medida liberal. Isso significa que o Brasil vai continuar sendo um país pobre, desigual, com baixo desenvolvimento econômico. Com a pauta do Lula, não vamos recuperar nunca a capacidade de retomada do crescimento econômico, nunca vamos retomar a produtividade e a competitividade nacional. Vai continuar sendo o mesmo Lula de sempre: mais favor para os amigos e criação de campeões nacionais, que são um desastre.
Quando estava no PSDB, o senhor coordenou a campanha de Geraldo Alckmin à Presidência em 2018. Como vê a mudança de lado dele? Vejo com tristeza. Ele tem grande história na política e acabou emprestando sua reputação ao Lula e ao PT, que sempre foram contrários às reformas.
“É evidente que, se for eleito, Lula não vai aprovar nenhuma reforma liberal. O Brasil continuará sendo um país pobre, desigual e com baixo desenvolvimento econômico ”
Outra dificuldade que sua candidatura enfrenta é a desunião interna do Novo. Uma prova disso é a pouca visibilidade que a maioria dos deputados federais do Novo dá ao senhor nas redes sociais. O que era difícil fica mais complicado com a legenda rachada? O partido está completamente unido em torno do meu nome e eu, comprometido com as campanhas deles e de todos os outros pré-candidatos. Nas nossas convenções vemos que o apoio é total ao meu nome.
Apesar de Zema dizer que o candidato a presidente dele é o senhor, ele não se descolou de vez de Jair Bolsonaro. Ele vai colocar o pé nas duas canoas agora e apoiar Bolsonaro no segundo turno? Eu não acho que ele fará isso. Todos os sinais e todas as declarações são no sentido de me apoiar, que ele está fechado com o Novo. Quem está se aproximando do Zema é o Bolsonaro, não o contrário. O presidente sabe que ele está fazendo uma gestão extraordinária em Minas.
A aliança de Zema com o PP foi alvo de crítica interna no partido. O ex-presidenciável do partido, João Amoêdo, por exemplo, disse que o acordo é um marco no processo de destruição do Novo. É a primeira reeleição do Novo e precisamos de alianças para garantir a governabilidade, ou seja, a maioria na Assembleia Legislativa. Se o Zema tivesse a maioria desde o início, teria mais facilidade para aprovar as reformas importantes. Até hoje a Assembleia não aprovou a renegociação da dívida com o governo federal por uma questão simplesmente eleitoral.
Após a boa impressão deixada pelo Novo em 2018, a eleição seguinte foi ruim para o partido, que só ganhou uma prefeitura. A sigla encolheu? Os princípios e valores continuam firmes. Elegemos o governante da maior cidade de Santa Catarina, que é Joinville. Hoje o prefeito Adriano Silva tem 88% de popularidade e é mais uma vitrine importante para o Novo, além do Zema. O partido diminui, volta a crescer, isso é normal. O importante é que, quando chega ao poder, faz a diferença. A gente mostra o que é a política do Novo na prática, na gestão do orçamento, na atração de investimento.