Bolsonaro só vence se ultrapassar Lula no 1o turno, diz especialista

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Foto: Arte/O Globo

O economista Maurício Moura, autor do livro “Eleição disruptiva, por que Bolsonaro venceu” (Editora Record), sobre a vitória do presidente em 2018, acha que o candidato do Partido Liberal não é favorito para conseguir a reeleição. Ele explica que o presidente precisa estar à frente de Lula já no primeiro turno, do contrário, dificilmente irá tirar votos do petista, mesmo com mais um mês de disputa. Segundo Moura, o Auxílio Brasil não tem dado o efeito esperado porque Bolsonaro cortou o Auxílio Emergencial, durante a pandemia, e passou a sensação de que o benefício era temporário. Na sua visão, os evangélicos não são decisivos na disputa, mas os eleitores do Sudeste, especialmente as mulheres, e em estados como São Paulo e Minas Gerais. Moura é CEO e fundador do Instituto de Pesquisa Ideia e professor visitante na George Washington University, nos Estados Unidos. Escreveu o livro sobre a eleição de 2018 ao lado do cientista político Juliano Corbellini. Veja abaixo a íntegra da entrevista.

– O seu livro ajudou a entender que o fenômeno Bolsonaro em 2018 foi muito além da facada, embora ela tenha contribuído. O que o senhor está enxergando agora?

O contexto global, naquele ano, me ajudou a antecipar a vitória do Bolsonaro. O que tem acontecido nos últimos quatro anos é que a narrativa de outsider perdeu fôlego na política. Todos os partidos que ascenderam ao poder nessa época perderam força. Na Espanha, tem o Podemos e o Cidadãos, que tiveram muito voto e diminuíram a força. Na Itália, o Movimento 5 Estrelas, na França, o partido do Macron. Na América Latina, estamos vendo uma onda de vitórias da oposição, seja de direita ou esquerda. De direita, no Equador e no Uruguai, de esquerda, Chile, Peru, Colômbia, Bolívia. Ano que vem, a oposição também vem forte na Argentina.

– E o que mais temos de mudança agora?

Esse é o primeiro contexto, de vitórias da oposição no mundo. E agora o presidente Bolsonaro é protagonista, é governo, não mais um outsider da elite política, como em 2018. A pergunta que todos fazem é: Bolsonaro merece a reeleição? O que as pesquisas mostram é que ele está frágil nessa condição, porque tem mais reprovação do que aprovação. E quando a gente compara com Fernando Henrique, Lula e Dilma, ele tem números muito piores. Se a gente comparar até com a Dilma, que foi a menos popular dos três, ele tem o mesmo patamar de ótimo e bom dela, mas o ruim e péssimo da Dilma era 15 pontos abaixo do que tem hoje Bolsonaro. Então a Dilma tinha mais gente classificando o governo dela como regular.

– É uma disputa para ver quem tem menos rejeição?

Exato, mas do outro lado temos um candidato que também tem muita rejeição, que é o Lula, e um partido também com alta rejeição, que é o PT. O problema, para Bolsonaro, é que a rejeição dele continua maior. Ele está indo contra várias marés históricas de ter um governo mal avaliado e conseguir ganhar. O Macri passou por isso na Argentina e não foi reeleito. Bolsonaro não tem a narrativa central de ser de fora do governo, e, na verdade, só é competitivo porque há outro candidato com muita rejeição.

– E por que não há espaço para o crescimento de um candidato de terceira via?

Porque temos dois candidatos com núcleos de apoio muito altos, tanto Lula quanto Bolsonaro. Mas um ponto importante é que Bolsonaro, na minha opinião, tem menos votos atualmente do que o antipetismo pode entregar. Então acho que ele tem espaço para crescer. Existe sempre a surpresa nas urnas, em relação às pesquisas. O grande problema para ele é que precisa terminar o 1º turno na frente de lula ou conseguir tirar votos dele no 2º turno, o que é muito difícil de acontecer.

– Ou herdar votos de todos os outros.

Exato, mas no 2º turno o mercado disponível de votos é de oposição. Quem vota no Ciro já rejeitou Bolsonaro. A mesma coisa com a Simone Tebet. Se o Bolsonaro não ganhar no primeiro turno, tem que pegar todos os votos dos outros ou tirar do Lula. É um cenário difícil para ele. Mas, a meu ver, a diferença nas urnas vai ser bem mais apertada, porque a diferença na rejeição está na casa dos 5 pontos entre Lula e Bolsonaro.

– O que tem mostrado a pesquisa do Instituto Ideia/Exame?

Na semana que vem, temos uma nova rodada. Ela está semelhante ao que vem sendo apontado por alguns institutos, com uma diferença mais apertada entre Lula e Bolsonaro.

– Por que o senhor avalia que o Auxílio Brasil não deu o resultado esperado pelo governo?

O Auxílio Brasil ajudou, mas não foi suficiente para o Bolsonaro virar. O presidente ganhou muita popularidade em 2020, com o Auxílio Emergencial na pandemia, mas ele tirou o benefício no final do ano. Ficou a memória de que é temporário. Isso dificulta ele ter o retorno agora. Mas o Auxílio Brasil é muito eficiente nas cidades até 400 mil habitantes, porque com o mesmo dinheiro você compra mais. O problema, para ele, é que nas regiões metropolitanas se tem muito mais voto.

– Que peso você dá ao público evangélico?

Como o Censo está atrasado, não existe consenso entre os institutos sobre o percentual de evangélicos no país. A mesma coisa acontece para as faixas de renda, quando fazemos esse tipo de recorte. Há essa discordância e métodos diferentes. Mas, no caso dos evangélicos, o mais importante, a meu ver, é que eles não pensam igual, há vários grupos diferentes dentro dos evangélicos.

– O presidente tem apostado nesse eleitor.

Eles não são decisivos como muita gente avalia, e acho que Bolsonaro vai ter o mesmo desempenho de 2018. Mas não acredito que eles vão decidir as eleições.

– Quem decide?

Acho que será a classe C, além das mulheres e da região Sudeste. Minha avaliação é que continua difícil para o Bolsonaro, tanto no Sudeste quanto entre as mulheres. Ele perde para o Lula no Sudeste e em 2018 ele ganhou já no primeiro turno. Bolsonaro perdeu votos de lá para cá.

– E no Sudeste, São Paulo e Minas são decisivos?

Sim, e o melhor desempenho dele é no Rio de janeiro. Em Minas, o candidato Romeu Zema, que pode ganhar no primeiro turno, tem tido uma postura neutra até agora.

– Mas se o Zema ganhar no primeiro turno ele não pode apoiar Bolsonaro no segundo?

O Aécio, na prática, não apoiou o Alckmin em 2006, que era do mesmo partido. Conhecendo bem os mineiros, acho que a postura neutra deve se manter também em um eventual segundo turno na disputa presidencial.

– E como avalia São Paulo?

Acho que está completamente aberto. Há pesquisas mostrando percentual de indecisos na pergunta espontânea entre 50% e 70%. Pode acontecer de tudo, até o Haddad ficar fora do segundo turno.

– Para terminar, qual seu palpite sobre a eleição para presidente? Quem ganha?

Acho que vai ter segundo turno. Não enxergo o fenômeno de voto útil na reta final. Os eleitores do Ciro e da Simone estão confortáveis com a escolha. Acho que o Lula é favorito, mas vai ser mais apertado do que têm mostrado as pesquisas neste momento.

O Globo