Compositor baixo inunda internet com jingles pró Lula

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Foto: Reprodução

Em praça do centro de Iguaí, cidade de 27 mil habitantes do sudoeste da Bahia, um homem de camisa estampada e chapéu de feltro na cabeça dança uma música em ritmo de axé segurando uma placa de ovos com 30 unidades.

No vídeo, postado em seu canal no Youtube, ele canta uma música de refrão simples, mas pegajoso. Com os versos “chega de ovo, é Lula de novo”, repetidos 35 vezes durante a canção, ele traz o tema da inflação para o centro do debate eleitoral e faz uma crítica indireta ao presidente Jair Bolsonaro (PL).

Por trás deste e de outros cerca de 700 vídeos com jingles favoráveis ao candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está o compositor baiano Júlio Hermínio Luz, 48, conhecido como Juliano Maderada.

Proprietário, produtor e compositor da banda Maderada, grupo de arrocha cujas músicas tocam pelos paredões no interior da Bahia, Juliano se viu sem trabalho e sem renda durante o período mais crítico da pandemia da Covid-19.

Decidiu compor e cantar jingles em busca de visibilidade e retorno financeiro. Montou um canal do Youtube e se impôs como meta produzir e publicar ao menos uma música por dia.

“Caí para dentro desse mundo dos jingles por necessidade, precisava colocar comida na mesa. Nós, artistas, ficamos sem proteção nenhuma na pandemia. Fomos os primeiros a parar e os últimos a retornar às atividades”, afirma.

A partir de abril de 2021, quando Lula recuperou os seus direitos políticos e ficou apto para disputar eleições, Juliano começou a produzir jingles em série favoráveis ao ex-presidente, de quem já era eleitor, e postar em suas redes.

Um dos primeiros jingles a fazer sucesso foi “Saudade do tempo de Lula”, em música em ritmo de piseiro que chamou a atenção da equipe do petista, ganhou as demais redes sociais e passou a ser tocada em atos da pré-campanha.

Ao mesmo tempo, Juliano passou a também compor jingles provocativos ao presidente Jair Bolsonaro e seus apoiadores, seguindo uma tradição de jingles contra adversários típica de pequenas cidades, especialmente no Nordeste.

 

O canal Maderada Brasil chegou ao mês de setembro com mais de 112 mil inscritos e 26 milhões de visualizações. Com a notoriedade, vieram contatos com o meio político e convites para conhecer o ex-presidente. Foram três encontros com Lula em Salvador, onde Juliano levou um violão emprestado e apresentou algumas de suas composições.

Do sucesso no Youtube, os jingles ganharam as outras redes e estouraram no Tiktok, rede social que ganhou relevância nesta eleição e na qual o presidente Jair Bolsonaro tem maior número de seguidores e capilaridade.

Um levantamento da pesquisadora Maria Carolina Lopes de Oliveira, divulgado em reportagem da BBC Brasil, apontou que as três músicas mais populares associadas a Lula no Tiktok em junho são de Juliano Maderada, que chegaram a 25,8 mil execuções naquele mês.

O sucesso de jingles como “Ei, Lula, eu vou votar em tu”, que segue a tradição nordestina dos forrós com duplo sentido, ajudou Lula ganhar engajamento no Tiktok, a despeito de o petista ter um número menor de seguidores do que Bolsonaro.

Este é um campo em que a campanha do petista vem tentado ganhar terreno para se contrapor a Bolsonaro, que tem uma militância digital engajada e uma forte presença nas redes sociais desde as eleições de 2014.

Apesar do sucesso, Juliano não tem relação formal com a campanha de Lula. Parte de seus jingles são usados para animar atos de campanha do petista e de candidatos aliados nos estados.

“Não consigo dimensionar o alcance das músicas. Não tem muito controle, é como se fosse um domínio popular. O mais importante é que eu me tornei mais conhecido, meu trabalho foi valorizado”, afirma.

Sua principal fonte de renda vem da monetização dos vídeos no Youtube, no Tiktok e nos jingles que passou a compor para candidatos a governador, senador, deputado federal e estadual.

Dentre eles estão o candidato a governador da Bahia Jerônimo Rodrigues (PT), o senador Otto Alencar (PSD-BA) e o deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS).

 

Eleitor de partidos de esquerda, Juliano afirma não ter problemas em compor jingles para candidatos de outras legendas. O veto alcança somente determinados temas.

“Tem coisas que não topo fazer, como jingles que falam de arma ou fazem apologia à violência. Já recebi pedidos assim, mas prefiro passar a bola para outros parceiros”, diz.

Mesmo com os novos trabalhos, não deixou de fora da rotina o jingle diário focado na eleição nacional, sobretudo os com críticas a Bolsonaro. Em geral, tratam de temas que ganharam destaque na imprensa: um dos mais recentes trata dos imóveis comprados com dinheiro vivo pela família do presidente.

Os jingles críticos a Bolsonaro trouxeram junto ataques vindos de apoiadores do presidente que normalmente chegam por meio de mensagens no WhatsApp. Juliano diz já ter recebido ameaças de agressão e fotos de armas.

Na pequena Iguaí, por outro lado, diz que não ter embates com os eleitores de Bolsonaro. “Sabe como é cidade pequena, né? Eles até ficam com raiva, mas são todos meus amigos. Não tenho problema com ninguém”.

Folha