Partidos discriminam mulheres na divisão do fundo eleitoral

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Foto: Wilton Junior/Estadão

A menos de um mês da eleição, os partidos têm privilegiado os homens em detrimento das mulheres na distribuição de recursos para as campanhas de deputados federais. Até agora, os caciques partidários colocaram R$ 1,26 bilhão do fundo eleitoral para eles e R$ 518,8 milhões para elas.

Embora representem 36,4% dos postulantes à Câmara, o equivalente a 2.094 candidatas, as mulheres só tiveram 29,1% do fundo para financiamento dos gastos. Os homens são 63,6% dos candidatos (3.662) e tiveram 70,9% do fundo. A título comparativo, é como se cada mulher tivesse recebido, em média, R$ 247,7 mil do fundo eleitoral e cada homem, R$ 344,7 mil.

Com menos dinheiro, as chances de eleição diminuem. Atualmente, dos 513 deputados, 77 são mulheres – o equivalente a 15% do plenário. Na população, elas são 51%.

O cenário expõe a discrepância entre gêneros na política, apesar dos incentivos legais para equiparação das condições de disputa. Uma das consequências é o desequilíbrio na representação feminina na política nacional.

O fundo eleitoral é o principal mecanismo de financiamento de campanhas, instituído após a vedação de doações por empresas privadas. Para este ano, são R$ 4,9 bilhões em recursos públicos distribuídos às siglas, para despesas com candidatos a todos os cargos.

Por lei, 30% desses recursos devem ser repassados às mulheres. Contudo, cada sigla faz como bem entender e nada as impede de concentrar a cota em um número reduzido de candidatas ou privilegiar uma candidatura à Presidência ou a governadora de Estado.

Só quatro partidos com candidaturas a deputado repassaram a mulheres mais da metade dos recursos do fundo eleitoral a que tinham direito: UP (86,9%), DC (62,2%), PSOL (55,7%) e PCdoB (50,9%).

No PL do presidente Jair Bolsonaro, candidato à reeleição, as mulheres que tentam vagas na Câmara receberam 28,5% do que foi distribuído pela agremiação presidida por Valdemar Costa Neto. No PT do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, elas tiveram 34,2%.

Em números absolutos, as candidatas do PL ganharam 35,7 milhões; os homens ficaram com R$ 89,5 milhões. No PT, presidido pela deputada Gleisi Hoffmann, as mulheres receberam R$ 48,7 milhões. Os homens, R$ 93,9 milhões.

O repasse máximo do PT às candidaturas a deputado federal foi de R$ 1,5 milhão. Das 125 candidatas do partido, apenas nove receberam o valor máximo. Entre os homens, foram 37 dos 188 lançados. O PL repassou para dez candidatos entre R$ 1,5 milhão e R$ 3 milhões. Oito mulheres receberam repasses nesses valores.

As doações de pessoas físicas também privilegiam os homens na disputa para uma vaga na Câmara. O levantamento do Estadão com base nos dados fornecidos pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostra que essa modalidade de financiamento aprofunda a desigualdade. As candidatas arrecadaram R$ 14,5 milhões com doações individuais. Já os candidatos, R$ 55,9 milhões.

A eleição de deputados federais é considerada importante para os partidos. A configuração do plenário na próxima legislatura definirá o rateio entre as siglas dos bilhões reservados até 2026 para os fundos eleitoral e Partidário. Quanto mais deputados, mais dinheiro o partido recebe.

As iniciativas para ampliar a participação feminina têm demonstrado resultados ainda considerados tímidos por estudiosas. Para a pesquisadora Joyce Luz, do Observatório do Legislativo Brasileiro, o financiamento é um gargalo. “Por mais que tenha a reserva de 30% para candidatas, isso não se converte em quantidade de cadeiras. Uma das razões é o financiamento. Com menos dinheiro, elas têm menos visibilidade entre o eleitorado, menos recursos para santinhos e propaganda”, disse Joyce.

Estadão