Bolsonaro é o presidente que mais perdeu no STF

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Foto: Cristiano Mariz/O Globo e Mauro Pimentel/AFP

A decisão da presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Rosa Weber, de suspender trechos do indulto de Jair Bolsonaro que beneficiava agentes envolvidos no massacre do Carandiru arremata uma série de derrotas acumuladas no STF pelo conturbado governo do ex-presidente da República.

Ao longo de quatro anos de mandato, a Corte foi o alvo preferencial de incansáveis ataques do ex-ocupante do Palácio do Planalto – e foi também a sede de poder mais vilipendiada por extremistas bolsonaristas nos atentados terroristas do último dia 8 em Brasília.

Segundo a equipe da coluna apurou, Rosa vinha trabalhando na ação do indulto há semanas, mas os ataques no Supremo atrasaram a finalização da decisão de 31 páginas, já que não apenas o plenário da Corte como o próprio gabinete da presidente foram alvos de depredação dos manifestantes golpistas.

“A Constituição Federal consagra a independência entre os Poderes da República e edifica um complexo sistema de freios e contrapesos destinado a evitar o exercício arbitrário do poder estatal”, escreveu Rosa Weber ao suspender trechos do indulto de Bolsonaro.

“Ao Supremo Tribunal Federal não cabe atuar como órgão revisor. Impõe-se, contudo, a esta Casa, enquanto guardiã da Constituição, infirmar comportamentos exorbitantes dos limites constitucionais e atos maculados pelos vícios do abuso de direito ou do excesso de poder”, frisou a presidente do STF.

Do início ao fim de seu governo, e até depois dele (como no caso do indulto), Bolsonaro foi confrontado com decisões que contrariaram os seus interesses e o de seus aliados, o que impôs limites ao seu poder.

O STF decidiu, por exemplo, manter a demarcação de terras indígenas com a Funai, proibiu o governo federal de monitorar servidores “antifascistas”, suspendeu a indicação de Alexandre Ramagem, amigo do clã Bolsonaro, para a Polícia Federal e divulgou a íntegra de uma vexatória reunião ministerial marcada por palavrões, xingamentos e ameaças ao próprio STF.

O volume de derrotas de Bolsonaro cresceu com a pandemia, quando o STF se tornou o principal freio de contenção à desastrosa gestão do ex-mandatário no enfrentamento da Covid.

O STF garantiu, por exemplo, autonomia para que Estados e municípios adotassem medidas de isolamento social, deu aval à vacinação obrigatória, cobrou do Ministério da Saúde um cronograma para a imunização e determinou que o governo Bolsonaro seguisse divulgando diariamente o balanço de mortos e infectados pelo coronavírus.

Só nos primeiros dois anos de governo Bolsonaro, foram mais de 30 derrotas no STF. Não faltaram decretos, medidas, nomeações e outros atos do governo Bolsonaro que foram contestados na Suprema Corte.

A decisão do STF que mais irritou Bolsonaro nesse período, no entanto, não dizia respeito diretamente ao seu governo: a anulação das condenações impostas pela Lava Jato contra Lula, o que restaurou a elegibilidade do petista e abriu caminho para sua vitoriosa candidatura.

Apesar das perdas na arena política, Bolsonaro conseguiu vitórias na economia, com o STF validando medidas provisórias que flexibilizaram normas trabalhistas durante a pandemia, permitindo a redução de salários e jornadas, por exemplo.

Também viu o STF manter o foro privilegiado de Flávio Bolsonaro (PL-RJ) no caso das rachadinhas, além de anular relatórios do Coaf que embasaram a investigação.

Para o professor de direito constitucional pela FGV Direito Rio, Wallace Corbo, o indulto agora suspenso por Rosa Weber foi apenas um entre os vários atos editados por Bolsonaro que “contrariaram as mais básicas pautas civilizatórias”.

“Com a suspensão, o Supremo reforça um perfil institucional que se consolidou nos últimos quatro anos: de uma Corte que compreende seu papel de defesa dos direitos fundamentais contra as investidas dos governantes de ocasião”, disse Corbo à equipe da coluna.

“Nesse cenário, não surpreende que a instituição responsável por conter os atos inconstitucionais do ex-presidente tenha sido eleita por ele e por seus seguidores como o principal inimigo a ser destruído, como visto no dia 8 de janeiro.”

O Globo