Lula e Dino pensaram que golpe tinha vingado

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Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil

No meio da tarde do último domingo, quando bolsonaristas dominavam todos os prédios da Praça dos Três Poderes, o governo chegou a considerar que a extrema direita havia conseguido dar um golpe de Estado.

“O golpe se consumou? Tecnicamente, sim”, admite o ministro da Justiça, Flávio Dino. “Um golpe se consuma quando os conspiradores tomam os palácios. Pela primeira vez na história, eles ocuparam as sedes dos Três Poderes”, explica.

Às 15h40, o prédio do Supremo Tribunal Federal foi invadido por hordas que destruíram o plenário e saquearam até o brasão da República. Àquela altura, os salões do Congresso e do Palácio do Planalto já haviam sido depredados.

O presidente Lula estava em Araraquara, onde vistoriava estragos feitos pela chuva. Avisado do quebra-quebra, suspendeu a agenda e improvisou um gabinete de crise na sala do prefeito.

Em Brasília, Dino cobrava as autoridades locais, exasperava-se com a inação da polícia e assistia pela janela ao avanço dos extremistas. Quando ficou claro que o governo do Distrito Federal estava à deriva, recorreu ao presidente.

“Liguei e mencionei as alternativas jurídicas possíveis. Ele optou pela intervenção federal”, conta o ministro. A distância criou um problema inusitado. “Flávio, como eu assino?”, perguntou Lula. Sem a opção de esperar um portador, o ministro orientou o chefe a imprimir o documento, autografá-lo à mão e enviar uma foto pelo celular.

“Fizemos uma intervenção federal pelo WhatsApp. Era o único meio possível”, afirma Dino. Às 17h55, Lula anunciou a decisão. Com o decreto no aplicativo de mensagens, o ministro passou a distribuir ordens. Seu braço-direito, Ricardo Cappelli, desceu até a Esplanada e assumiu o comando da tropa.

Em cinco minutos, a polícia fez as primeiras prisões e começou a esvaziar o Planalto e o Supremo. A desocupação do Congresso ainda exigiria reforços da cavalaria e de helicópteros da PM.

O interventor penou para impor sua autoridade. Enquanto extremistas vandalizavam o Planalto, o comandante do Batalhão da Guarda Presidencial bateu boca com policiais da tropa de choque. Queria evitar a prisão de quem atacava o prédio que ele deveria proteger.

No fim da noite, Dino e Cappelli enfrentariam mais um obstáculo fardado. O Exército montou uma barricada para impedir que a PM entrasse no acampamento golpista ao lado do Quartel-General. As barracas só seriam desmontadas na manhã seguinte, quando muitos criminosos já haviam fugido do local.

Quem acompanhou as horas de tensão no Ministério da Justiça viu Dino travar diálogos ásperos com o chefe do Gabinete de Segurança Institucional, general Gonçalves Dias, e com o chefe da Casa Civil do DF, Gustavo do Vale Rocha.

A 785 km de Brasília, Lula farejou a sabotagem por trás da intentona fascista. Às 18h em ponto, o presidente constatou: “Houve incompetência, má vontade ou má-fé das pessoas que cuidam da segurança pública do Distrito Federal”.

Ao menos uma autoridade tem o que comemorar depois do quebra-quebra em Brasília: a ministra do Turismo, Daniela Carneiro. Desde o domingo passado, ninguém mais fala de suas conexões com milicianos. O 8 de Janeiro salvou a pele da primeira-dama de Belford Roxo.

O Globo