GSI desenvolve outras atividades além de proteger o presidente

Todos os posts, Últimas notícias

O Planalto poderia ter evitado a crise produzida pela divulgação das imagens que forçaram a exoneração do general Gonçalves Dias da função de ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional. Lula cogitou extinguir o GSI após o 8 de janeiro. Discutiu a providência com auxiliares. Mas acabou optando por desossar o órgão, preservando o emprego do general, um amigo de duas décadas. Na última quinta-feira, um dia depois de forçar o pedido de exoneração do auxiliar, Lula declarou que Gonçalves Dias, a quem chama de GDias, “saiu por conta própria”.

Consumada a lambança, a hipótese de extinção do GSI voltou a ser debatida pelo governo. Discute-se também a alternativa de retirar o status ministerial do órgão, que passaria a ser chefiado por um civil. A decisão final será tomada por Lula no retorno de sua viagem a Portugal e Espanha. O presidente deve se reunir na próxima quinta-feira com Ricardo Capelli. Acomodado interinamente na poltrona de chefe do GSI, Capelli foi incumbido de preparar um “diagnóstico” sobre as atribuições da repartição, que dispõe de cerca de 1.200 servidores, a maioria militares.

A exposição das gravações que revelaram a complacência de Gonçalves Dias e a cumplicidade de seus subordinados com invasores bolsonaristas que depredaram o Planalto fez Lula reviver na semana passada a irritação que o atormentara após o 8 de janeiro. O incômodo foi reativado pela percepção de que, decorridos mais de 100 dias do quebra-quebra, o GSI ainda não havia sido “descontaminado”. Lula encomendara a completa “desbolsonarização” da pasta comandada na gestão anterior pelo general Augusto Heleno, Mas apenas 35% do quadro do GSI foi renovado.

A prevenção do novo governo com o GSI, latente desde a fase de transição, tornou-se evidente após a intentona bolsonarista. Iniciado em janeiro, o debate sobre o que fazer com a pasta prolongou-se até o início de março. Amadurecida a opção de esvaziar o GSI, Lula expressou sua insatisfação com o trabalho do general GDias com dois movimentos. Num, retirou do organograma do GSI a Agência Brasileira de Inteligência, transferindo-a para a Casa Civil, chefiada por Rui Costa. Noutro, escolheu para comandar a Abin, à revelia do general, o ex-diretor da Polícia Federal Luiz Fernando Correa.

Antes, Lula já havia retirado do GSI a atribuição de cuidar da segurança do presidente da República, do vice-presidente Geraldo Alckmin e dos familiares de ambos. A tarefa foi transferida para a Polícia Federal. Criou-se por decreto a Secretaria Extraordinária de Segurança Imediata, vinculada diretamente ao gabinete presidencial.

Pesou na decisão de não extinguir por completo o GSI o argumento de que a pasta é responsável por coordenar outras atividades essenciais ao funcionamento do Estado. Por exemplo: os programas de energia nuclear e de segurança cibernética. A acomodação produziu um arranjo desconexo, pois o GSI continuou exercendo atividades vinculadas à área de inteligência. E não foi eximido por completo das tarefas relacionadas à segurança. Embora a proteção direta de Lula e Alckmin seja feita pela PF, agentes do GSI ainda participam da organização dos deslocamentos de ambos e da preparação de viagens e eventos oficiais.

A retomada do debate sobre a redefinição do papel administrativo do GSI é calibrada por uma preocupação política. O Planalto não quer fornecer matéria-prima que possa ser utilizada pela oposição bolsonarista na CPI do 8 de Janeiro, cuja instalação no Congresso tornou-se incontornável.

A milícia parlamentar de Bolsonaro se move para transformar a investigação legislativa numa usina de desinformação. Embora não exista dúvida quanto ao fato de que o governo foi vítima de uma tentativa de golpe, Lula e seus operadores se equipam para inibir o desejo do bolsonarismo de reescrever a história.

Nesse contexto, o depoimento prestado por GDias à Polícia Federal na sexta-feira foi classificado no Planalto como “desastroso”. Ele reconheceu que houve no 8 de janeiro um “apagão” geral da inteligência das Forças de Segurança do Estado. Mas se absteve de assumir responsabilidades. Dedicou-se a terceirizar culpas. A despeito da ausência de autocrítica, o Planalto realiza a autopsia da atuação precária do GSI sem criticar publicamente o general amigo de Lula.

No diagnóstico a ser folheado por Lula ao retornar de viagem, a fragilidade da proteção do Planalto no dia da invasão deve ser atribuída à infiltração de militares simpáticos a Bolsonaro na estrutura do GSI. Tenta-se construir uma versão aceitável até para a inaceitável decisão de GDias de impor sigilo de cinco anos para as imagens captadas pelas câmeras do circuito interno do Planalto.

As filmagens foram finalmente liberadas por ordem do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes. Embora Moraes tenha anotado no seu despacho que não há sustentação legal para o sigilo, o Planalto deve alegar que as gravações compõem o acervo probatório de um inquérito que a própria Suprema Corte classificou como sigiloso.

De resto, vai-se repisar a tese segundo a qual a divulgação indiscriminada das filmagens expõe detalhes da planta da sede do governo, comprometendo a segurança.

UOL