Padilha contesta fraqueza da base de Lula

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Alexandre Padilha em seu gabinete no Planalto. Ministro das Relações Institucionais nega ‘toma lá, dá cá’, nas conversas com o Congresso Fernando Donasci/OGlobo

Escolhido para capitanear as negociações com o Congresso, uma das funções mais determinantes para que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tenha sucesso no terceiro mandato, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, se equilibra entre as demandas cotidianas do Parlamento e as críticas pelo fato de o governo ainda não ter conseguido arregimentar uma base sólida. Em entrevista ao GLOBO, ele rechaça a versão de que instituiu o “toma lá, dá cá”, usando cargos da máquina federal em troca de apoio, mas diz que a atual administração “não trata parlamentar como gado”. Padilha rebate o líder do PDT no Senado, Cid Gomes (CE), que o acusou de estar levando o próprio chefe “para uma tragédia”, e afirma que o presidente vai liderar o diálogo com Câmara e Senado, para não se tornar refém do Centrão, como ocorreu com governos anteriores. Para isso, as conversas incluem a oposição.

O presidente da Câmara, Arthur Lira, disse que o governo ainda não tem base consistente no Congresso. Ele está errado?

O governo tem a base necessária para aprovar tudo o que buscou aprovar até aqui. Este é um governo que não trata parlamentar como gado.

Mas o senhor acha que a base já foi testada?

Essa base passou em todos os testes que teve.

Considera que foram testes substanciais?

Sim. Derrotamos a candidatura bolsonarista no Senado, onde teremos aliados em todas as comissões. Na Câmara, assumimos a presidência das principais comissões.

O senador Cid Gomes (PDT) disse ao GLOBO que o senhor “está levando Lula para uma tragédia” e que o Centrão vai mandar no governo. O senhor concorda com a afirmação?

Achar que alguém vai mandar no presidente Lula é não conhecê-lo. Se há algo que tenho certeza é: Lula não vai terceirizar a articulação política, como Bolsonaro fez. Ele vai dialogar com todo mundo.

Não há risco de ocorrer essa “tragédia” a que ele se refere?

Tragédia seria se não tivéssemos tido 27 governadores de todos os partidos no Planalto se solidarizando ao governo 24 horas após os ataques do dia 8 de janeiro. E, 48 horas depois, o Congresso foi convocado para aprovar a intervenção (federal na segurança pública do Distrito Federal). Sem isso, sequer haveria ambiente para retomar o ano do Judiciário em 1º de fevereiro. Nós temos que isolar a extrema-direita, que tentou um golpe.

Para isolar a extrema-direita, o governo não está abrindo muito espaço ao Centrão?

O presidente Lula está no lugar onde sempre esteve. Essa capacidade de articulação política permitiu que nós evitássemos uma tragédia, que seria um golpe no país.

A tentativa de construção da base tem se dado por meio da cessão de cargos e liberação de emendas. Isso não passa a imagem de “toma lá, dá cá”?

Veja a fotografia do nosso Ministério. Há ministros que não são filiados a partido nenhum. Se fosse “toma lá, dá cá”, eu não faria o diálogo que estamos fazendo com os partidos de oposição. Podemos dialogar com eles para votar o novo marco fiscal do país.

Na semana passada, o senhor anunciou o pagamento de R$ 3 bilhões em emendas para atender a prefeituras. Isso ajuda no diálogo com o Congresso?

Essas emendas, que estavam paradas, são restos a pagar (recursos do Orçamento anterior que não foram liberados) do governo Bolsonaro. Há emendas individuais, de transferência especial, de bancadas. As emendas são públicas, há transparência, e vamos continuar com esse ritmo de liberação de restos a pagar.

Há ainda outros R$ 3 bilhões, que eram do orçamento secreto, que foi proibido. Essa verba voltou aos caixas dos ministérios e estaria sendo liberada sem transparência, por meio da rubrica RP2. Desse montante, quanto já foi destinado até aqui?

É mentira que a RP2 surge depois do fim do orçamento secreto. Essa modalidade sempre existiu. Vamos executar a RP2 como ela sempre foi executada. É direcionada pelo governo. Discutiremos com os ministérios quais são os programas prioritários.

O deputado Elmar Nascimento, líder do União Brasil, diz que o partido não integrará a base por divergências internas, embora controle três ministérios. O governo não ficará refém da sigla, que pode exigir mais espaços a cada votação?

Para navegar bem, precisamos saber que cada partido tem suas características. A relação com todas as legendas sempre será de diálogo e novos pleitos. O PT, meu partido, tem 12 ministros, secretários-executivos e sempre tem novos planos. É absolutamente natural. Parlamentares do União Brasil foram importantes na aprovação da PEC da Transição e entregaram os votos na eleição das presidências de ambas as Casas.

A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, tem feito antagonismo ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em algumas ocasiões. Qual é o papel dela nas discussões de governo?

Gleisi, como presidente do PT, precisa ter suas posições. Alguns têm que cumprir papel de ser presidente de partido, e outros têm que cumprir papel de governar o nosso país.

Com a base atual, o governo vai aprovar o novo arcabouço fiscal, apresentado por Haddad?

O marco fiscal é um tema que ultrapassa o governo Lula. É de interesse do país. Tenho dialogado permanentemente com todos os líderes, de base e oposição. Não só os 17 partidos que compõem o governo, mas as siglas que se declaram de oposição têm compromisso em aprovar o mais rápido possível a regra.

Até quando? Há um prazo?

Arthur Lira havia anunciado que, chegando o marco fiscal, iria votar em 15 dias, mas o nosso prazo é que aconteça o mais rapidamente possível.

O governo decidiu apresentar o arcabouço no dia em que o ex-presidente Jair Bolsonaro retornou ao Brasil. A decisão teve por objetivo abafar a repercussão da chegada dele?

Não. Tanto é que estava previsto para a gente apresentar na volta do presidente Lula da China (viagem que não ocorreu). Uma coisa que precisa ficar clara: as peripécias do Bolsonaro não movem nenhum passo das nossas decisões e ações do governo.

O GSI falhou ao não reforçar a segurança do Planalto durante os ataques de 8 de janeiro?

Certamente, houve falhas individuais de servidores civis e militares. A melhor resposta sobre as responsabilidades individuais nós teremos quando o conjunto das apurações que são coordenadas pelo Ministério da Justiça for concluído.

O Globo