Relator da regra fiscal tenta sabotar o governo

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Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

O relator do projeto de lei do novo marco fiscal, deputado Cláudio Cajado (PP-BA), incluiu travas aos planos do governo federal de utilizar o excesso de arrecadação para investimentos, de acordo com o texto divulgado na noite desta segunda-feira.

Segundo a proposta original do Executivo, se a meta de resultado primário fosse alcançada, mesmo que fosse um déficit (gastos maiores do que as receitas), o excedente poderia ser utilizado na sua totalidade para ampliar os investimentos.

O parecer impõe limitações. O valor que poderá ser destinado a investimentos adicionais será de 70% do excedente de arrecadação. Além disso, se houver déficit, o governo terá que usar essa verba para melhorar o resultado primário e não poderá gastá-la com obras.

Cajado ainda estabeleceu que “em qualquer hipótese” a ampliação dos investimentos com base nesta regra não poderá ultrapassar o montante de 0,25 ponto percentual do Produto Interno Bruto (PIB) do ano anterior. Neste caso, não há grande mudança porque o governo já tinha proposto no PL que o limite seria de R$ 25 bilhões anuais.
Por outro lado, ele manteve o piso de R$ 75 bilhões de investimentos por ano, corrigido pela inflação (o IPCA).

O relator propôs que o presidente não seja punido por crime de responsabilidade se descumprir a meta, desde que tenha adotado medidas para limitar a realização de despesas, com a possibilidade de preservar um valor mínimo para “o funcionamento regular da administração pública”.

De acordo com o projeto, a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) estabelecerá qual será este patamar, mas ele não poderá ser inferior a 75% do valor autorizado na respectiva lei orçamentária.

Em outra inovação, o parecer determina que o governo adotará todas as medidas de congelamento de gastos previstas na Constituição Federal (como proibir reajuste de salários ou expansão de incentivos tributários) se for verificado que a proporção da despesa primária obrigatória em relação à despesa primária total foi superior a 95%.

Cajado também sugeriu que o cálculo sobre o incremento de arrecadação desconsidere mais dois tipos de receitas não recorrentes: as verbas com programas especiais de recuperação fiscal criados após a publicação desta lei e os recursos obtidos pelo governo com o saldo não requisitado das contas do PIS/Pasep após 20 anos.

Elas se somarão às quatro exceções já propostas pelo governo no projeto: receitas primárias com concessões e permissões, com dividendos e participações, com exploração de recursos naturais e com transferências legais e constitucionais para repartição com outros entes.

Esse dado é importante porque o aumento das despesas acima da inflação terá um teto de 70% do incremento da arrecadação de um ano para o outro (e essas receitas extraordinárias ficarão de fora desta conta).

O parecer diminuiu os tipos de despesas que serão excetuados do cálculo da meta fiscal. A proposta do governo era estabelecer 13 exceções, mas o relator cortou cinco delas. Com isso, passarão a ser computados os gastos com o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), com o piso nacional de enfermagem e com a capitalização de estatais não financeiras e não dependentes.

A proposta é que continuem como exceções as despesas com projetos socioambientais e de universidades públicas custeadas com recursos próprios, transferências dos demais entes para a União executar obras e serviços de engenharia, créditos extraordinários, os gastos não recorrentes da Justiça Eleitoral, com precatórios a serem pagos com desconto e os precatórios do Fundef para Estados e municípios.

O deputado recuou de um ponto que visava endurecer o novo marco fiscal: que as metas a serem perseguidas pelo governo nos próximos quatro anos constassem em lei complementar, mais difícil de ser alterada. As metas, de acordo com o parecer, ficarão na LDO.

A LDO depende de maioria simples para ser alterada, equivalente à metade dos parlamentares presentes à sessão. Já uma lei complementar exige maioria absoluta, ou seja, metade mais um de todos os 513 deputados e 81 senadores.

Cajado dizia que não deixaria as metas na LDO para dar “robustez” ao texto já que essa lei “é alterada três ou quatro vezes por ano” pelo Congresso.

O relatório estabelece o conceito de que a política fiscal da União “deve ser conduzida de modo a manter a dívida pública em níveis sustentáveis, prevenindo riscos e promovendo medidas de ajuste fiscal em caso de desvios, garantindo a solvência e a sustentabilidade intertemporal das contas públicas”. Isso não existia no texto do governo.

Para garantir essa sustentabilidade da dívida, as metas de resultados primárias deverão buscar a estabilidade entre a Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG) e Produto Interno Bruto (PIB), afirma o texto.

O cálculo sobre esse indicador será elaborado pelo Banco Central, que tem status de independência em relação ao governo devido ao mandato de seu presidente e diretores.

O parecer incluiu regra para determinar que o Fundo Constitucional do Distrito Federal terá seus valores corrigidos anualmente pela nova regra do marco fiscal (a inflação mais um percentual que dependerá do crescimento das receitas).

Atualmente, esse fundo segue um percentual da receita corrente líquida (RCL), o que tem gerado altas maiores – alcançou R$ 21 bilhões em 2023, alta de quase R$ 5 bilhões em relação ao ano anterior. Esse mecanismo é utilizado para custear despesas do governo local, como a segurança, e não era tratado no texto original do governo federal.

Valor Econômico