Bolsonaristas acham que junho de 2013 “reduziu” corrupção

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Foto: Arte/Infoglobo

Passada uma década das manifestações de junho de 2013, o turbilhão que sacudiu o tabuleiro político nacional ainda causa reflexos no país. A pesquisa Ipec/O GLOBO foi às ruas entre 1º e 5 de junho e identificou que quatro em cada dez brasileiros dizem ter alterado a forma como escolhem seus candidatos a partir de então. Outros 40%, porém, não acham que os eventos daquele ano reduziram a corrupção. O levantamento revela ainda uma parcela significativa de cidadãos que sequer se lembra das Jornadas de Junho, que ganharam força com protestos contra o aumento das tarifas de ônibus em São Paulo, mas extrapolaram os limites dos transportes públicos e alcançaram outras reivindicações nas cinco regiões do Brasil.

Pesquisa Ipec/O GLOBO mostra respostas sobre a forma de escolher políticos após 2013  — Foto: Editoria de arte Ipec/O GLOBO

O Ipec mostra que, para 39% dos eleitores, as manifestações de 2013 mudaram seu modo de escolher os candidatos nas eleições. A proporção de homens com essa certeza é superior à de mulheres: 44% contra 35%. Por outro lado, mais de um terço (35%) afirma o oposto: os episódios não influenciaram em nada seu voto, somente quatro pontos a menos em relação ao primeiro grupo. As percepções variam por região: no Sul, um quinto (20%) afirma ter apoiado as manifestações se orgulhando disso, enquanto em outras regiões a taxa é de 15%. Já o Sudeste é o recordista de esquecimento ou não resposta (40%), justamente onde ficam os centros urbanos que registraram os principais protestos.

Carolina Botelho, cientista política do Instituto de Estudos Avançados (USP) e pesquisadora associada da Uerj, conecta essa mudança de votos a uma direita “repaginada” a partir de 2013. Ela analisa que os protestos atraíram para as ruas um movimento de massas da direita que estava represado desde a época da ditadura militar, e que fortaleceu candidatos identificados com pautas conservadoras. Até então, vigorava desde a redemocratização a ideia de uma “direita envergonhada”, de um grupo que existia, mas não se assumia por causa da memória da ditadura.

Apesar da reeleição da ex-presidente Dilma Rousseff no ano seguinte, a direita radical começou a ganhar espaço. Naquela eleição de 2014, o então deputado Jair Bolsonaro quadruplicou a quantidade de votos que vinha recebendo à Câmara nas décadas anteriores, da faixa dos 100 mil para 400 mil.

— O que muda na classe política é que a direita consegue vocalizar e levar pessoas para as ruas, e os políticos ligados a essas questões tentam trazer para si esse eleitorado. Bolsonaro é parte disso, teve em parte uma inteligência política (para se apropriar desse movimento). Essa é uma mudança profunda — analisa Carolina.

Aos poucos, o combate à corrupção tornou-se uma das principais bandeiras de 2013. Dez anos depois, no entanto, 40% dos eleitores avaliam que aqueles episódios não ajudaram a diminuir essa prática. Outros 35% pensam que houve, sim, uma diminuição do crime. Ao responderem se roubou-se menos dos cofres públicos pós-2013, 11% nem concordam, nem discordam, e os que não souberam responder são 16%.

Para Leonardo Avritzer, professor titular do departamento de Ciência Política da UFMG, Junho de 2013 ajudou a colocar o tema da corrupção na agenda política, pauta que dificilmente era listada como prioridade em pesquisas de opinião na década anterior. Ele classifica a Lava-Jato como “o grande paradoxo brasileiro” por ter sido uma investigação concentrada em combater a corrupção e, mesmo assim, ter se transformado em uma ação “enviesada e politizada”, o que acabou não contribuído para resultados práticos.

— Hoje as ações anticorrupção incidem sobre ambos os lados do espectro político. No entanto, aqueles que discordam estão mais certos, porque o Brasil não tem hoje uma instituição despolitizada de combate à corrupção — afirma Avritzer.

No campo da direita, é popular a avaliação de que Junho de 2013 representou um “despertar” para a nova direita. Essa interpretação se insere, por exemplo, em obras cinematográficas como “Nem tudo se desfaz”, do cineasta Josias Teófilo, simpatizante do escritor Olavo de Carvalho, ideólogo do bolsonarismo. E a esquerda costuma tratar Junho como a incubadora do “ovo da serpente”, termo usado para expressar uma espécie de prenúncio do desastre.

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Por outro lado, se houve “despertar”, também há um evidente esquecimento — ao menos declarado. São considerados altos os índices de dúvida ou incompreensão na pesquisa sobre 2013. O apagão de memória é mais intenso entre moradores de periferias, onde 35% dos respondentes dizem não se lembrar das manifestações. A taxa é de 25% para o público geral, e sobe para 32% entre os mais jovens (16 a 24 anos) — que eram crianças ou estavam no começo da adolescência àquela época.

Embora tenha havido um ponto de virada na popularidade dos atos ao longo daquele mês — ganharam adesão nas ruas e na opinião pública —, 41% das pessoas afirmam hoje não ter apoiado os protestos, sem arrependimentos. Na outra ponta, o índice é de 20% entre quem diz sentir orgulho de ter apoiado os atos. A pesquisa foi feita com 2 mil entrevistas presenciais em 127 municípios. A margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos dentro de um intervalo de confiança de 95%.

O Globo