Bolsonaristas radicais tentam mandar no governo Tarcísio

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Foto: Rodrigo Costa/Alesp

A tramitação de projetos de interesse do Executivo paulista na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) revela uma atuação apartada de deputados bolsonaristas em comparação ao restante da base do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos). O grupo, com seis deputados, ganhou status de fiel da balança em pautas prioritárias para o governo após votações mostrarem um desgaste na base, de 52 deputados, que protagonizaram embates em temas mais sensíveis.

O cálculo feito por aliados é que, se partidos que se declaram independentes, como a federação PSDB-Cidadania, decidirem se opor ao governo em alguma pauta, a base precisará do núcleo mais radical para fechar os 48 votos necessários e atingir quórum em votações. Isso por que esse grupo, que até ano passado, se opunha aos governos tucanos, ajudou a passar projetos do governador, mas também tem pressionado Tarcísio quando a proposta não agrada.

Um exemplo desta dinâmica ocorreu no dia 6 de junho, quando o governo falhou em conseguir o quórum para acatar a tramitação em urgência de um projeto de 2021 que aumenta as taxas processuais cobradas pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. Deputados narram que, no intervalo da sessão, enquanto o líder de governo Jorge Wilson (Republicanos) pedia a presença de todos para votar pela proposta, o deputado Gil Diniz (PL) solicitava que os aliados não fossem ao plenário.

Na votação, partidos que apoiam o governo, além de siglas “independentes” e de oposição, pediram obstrução. Deputados bolsonaristas do PL, como Gil Diniz, Lucas Bove, Major Mecca, Paulo Mansur e Tenente Coimbra, não registraram voto, contrariando a liderança do partido. A proposta acabou sendo acatada apenas por 26 deputados, e não passou.

Outro exemplo do desgaste aconteceu na terça-feira, 20, quando o governo não conseguiu alcançar número mínimo de deputados para votar um projeto de lei que autoriza contratação de empréstimo para a construção do trem São Paulo-Campinas. Na ocasião, até deputados governistas do União Brasil obstruíram a votação, e o projeto não foi votado. Um dia depois, reverteu o cenário para aprovar a proposta.

O líder de governo Jorge Wilson (Republicanos) nega que exista dificuldade de articulação. A principal justificativa é a aprovação de todos os projetos enviados pelo Executivo à Alesp até agora. Aliados de Tarcísio no Palácio do Bandeirantes também veem uma base unida, que não enfrenta os ruídos iniciais do começo do governo.

No entanto, Diniz, que atua como liderança informal do grupo bolsonarista, também preconizou uma disputa com o Executivo ao convocar a secretária de Cultura de São Paulo, Marília Marton, para explicar a programação da TV Cultura à Alesp. Posteriormente, ele recuou e transformou a convocação em um convite.

Não adianta falar apenas de tecnicidade quando temos uma base diversa que quer se sentir parte do governo
Gil Diniz (PL-SP), deputado estadual

Como mostrou o Estadão, a secretária de Cultura se tornou foco das pressões do grupo depois que o canal exibiu documentário sobre o papel da extrema direita nos ataques golpistas de 8 de janeiro, em Brasília. A secretária, porém, não tem ingerência sobre a programação da emissora, controlada pela Fundação Padre Anchieta.

“O governador tem todo nosso apoio. Estamos trabalhando para aprovar os bons projetos do governo. Eu não preciso de emenda, voto por convicção. Mas alguns secretários precisam entender que nós somos políticos e trabalhamos politicamente. Não adianta falar apenas de tecnicidade quando temos uma base diversa que quer se sentir parte do governo”, disse Gil Diniz.

A ala bolsonarista ainda endossou previamente a pré-candidatura do deputado federal Ricardo Salles (PL) à Prefeitura de São Paulo, enquanto Tarcísio apoia a reeleição do prefeito Ricardo Nunes (MDB). Parlamentares fizeram reuniões frequentes na casa do ex-ministro, mas Salles acabou desistindo da disputa.

Os embates rendem conversas na Casa de que o PL paulista pode se tornar o novo PSL. O partido foi inflado em 2018 para agregar aliados de Bolsonaro e depois rachou quando ele deixou a sigla.

Membros mais antigos do partido dizem acreditar que os quadros mais radicais atuam desta forma por interesses ideológicos. Argumentam, porém, que Tarcísio tem perfil menos político que os governadores anteriores, e tem sido resistente à liberação de cargos, por exemplo, demanda que também vem do Centrão.

Reclamações por melhor diálogo também são levantadas por deputados que se declaram mais moderados. No União Brasil, por exemplo, aliados querem maior poder de indicação por cargos, em especial no segundo e terceiro escalões, como mostrou a Coluna do Estadão. O entendimento é que o PSDB ainda comanda espaços importantes e o PSD, do secretário de Governo, Gilberto Kassab, conseguiu avançar nas indicações, enquanto que partidos com bancadas maiores na Alesp não tiveram a mesma entrada.

Outra pressão partiu do vice-líder de Tarcísio na Alesp, Guto Zacarias (União Brasil). Após o governo de São Paulo liberar um edital de R$ 750 mil para financiar paradas LGBTQIA+ na capital e no interior do Estado, o deputado protocolou um projeto de lei em que proíbe o governo de destinar verba pública a qualquer reunião que defenda, reivindique direitos ou celebre política pública sobre “qualquer tipo de comportamento sexual”.

Deputados também trabalham pela liberação de recursos via emendas. Tarcísio sinalizou com a possibilidade de atender pedidos de emendas não impositivas, desde que sob um critério de transparência.

“A Secretaria de Governo e Relações Institucionais está finalizando o modelo de divulgação dessas emendas, que serão atendidas de acordo com o diagnóstico de necessidades e prioridades do Estado”, afirmou o governo em nota ao Estadão. Se liberados, os valores, ainda não definidos, vão se somar aos R$ 10,5 milhões que cada parlamentar já tem direito de distribuir.

A liberação de emendas não obrigatórias poderia facilitar o apoio em projetos polêmicos. Parlamentares preveem maior resistência para aprovar pautas mais complexas que o Executivo pretende enviar à Alesp. São exemplos um projeto de reforma administrativa e a recolocação de 5% dos recursos da Educação para a Saúde, além da privatização da Sabesp, prometida para 2024.

“Os projetos apresentados (anteriormente) não têm uma oposição ferrenha porque são de aumentos, desapropriação de área, abono. Por outro lado, o governo se mostra desarticulado quando apresenta projetos que poderiam ser positivos e criam ruído, como no caso dos policiais”, disse o líder do PT na Alesp, Paulo Fiorilo.

Estadão