Lira é um Eduardo Cunha vitaminado

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Foto: Gabriela Biló/Folhapress

Falta articulação política no ministério de Lula-3, todos concordam, mas se esquecem de mostrar o outro lado da medalha: a ofensiva na base da chantagem, sem nenhum escrúpulo nem limites, defechada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira, fiel discípulo de Eduardo Cunha – lembram-se dele? – para encurralar o governo eleito. Isso só é possível porque, em outubro, a população elegeu um governo de esquerda, por pequena margem, e uma Câmara dominada pelo Centrão, com a extrema-direita bolsonarista ainda viva, que só pensa em se vingar da derrota na eleição presidencial, boicotando os projetos do governo e criando crises sucessivas, com várias CPIs abertas ao mesmo tempo.

Manda quem controla o cofre e as emendas dos parlamentares, já era assim no governo anterior, e os sucessores de Eduardo Cunha se acostumaram com a boca livre. Para não perder o cargo, Bolsonaro entregou o orçamento secreto a Lira e a administração do governo aos militares, e foi se dedicar à campanha pela reeleição, quebrando as finanças públicas. Cobram de Lula a pacificação do país, uma promessa de campanha, mas como perpetrar esse milagre num clima de beligerância permanente entre o Executivo e o Legislativo, com os derrotados sempre à espreita para na primeira esquina desfechar mais um golpe, em que os reais interesses do país são desprezados em favor do varejão da pequena política clientelista, alimentada por velhos esquemas de corrupção. Acuado pelas investigações da Polícia Federal no seu núcleo político em Alagoas, o insaciável Lira quer sempre mais, é um poço sem fundo. Enquanto ministérios, emendas, verbas e cargos servirem como moeda de troca, em nome da governabilidade, o país continuará ingovernável. Lula deve se lembrar o que Eduardo Cunha fez com a presidente Dilma Rousseff, desde o primeiro dia do seu segundo mandato, com as pautas-bomba e chantagens de toda ordem, que acabaram levando à sua derrubada num golpe parlamentar. Cunha também acabou cassado, foi condenado e preso por corrupção, mas hoje está livre, leve e solto, circulando pelo poder em Brasília para oferecer seu know-how a quem se interessar em fustigar o governo. Agora, o cerco é ainda maior, porque naquela época ainda não havia o bolsonarismo em marcha, com seus generais de pijama, que tirou a extrema-direita do armário, e se recusa a largar o osso, para manter seus privilégios e mordomias garantidos pelo governo anterior. Além disso, cresceu o poder das bancadas do boi, da bala e da bíblia, que se espalharam pelo Congresso Nacional, para defender os interesses dos ruralistas, dos evangélicos neopentecostais e das forças de segurança, com a liberação de armas e munições e a abertura da Amazônia para o crime organizado passar a boiada. Diante desta realidade, sinto o governo fragilizado neste momento, apesar da melhora gradativa dos índices econômicos, até porque não pode lutar com as mesmas armas nas redes sociais das milícias digitais bolsonaristas, que continuam fazendo a cabeça de boa parte da população, propagando os maiores absurdos sobre o presidente, sua família e seu governo. É este outro lado da moeda que também precisava ser mostrado para explicar as dificuldades enfrentadas por um governo que assumiu há apenas cinco meses e alguns dias, e correu o risco na semana que passou de ver derrubada toda a nova estrutura ministerial, deixando sérias sequelas no de Meio Ambiente e no dos Povos Indígenas, que foram esvaziados. Qualquer tentativa de governo de implantar políticas públicas de interesse social é logo bombardeada pelos órfãos da velha mídia tucano-lavajatista, que a cada semana infla uma nova crise do fim do mundo. Nem se Lula chamasse o papa Francisco para cuidar da articulação política os discípulos da escola Eduardo Cunha de fazer política se dariam por satisfeitos. No Brasil, parece que o futuro nunca chega e o passado sempre volta a nos assombrar. Vida que segue.

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