Bolsonaro nada em dinheiro antes de ser preso

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Foto: Brenno Carvalho/Agência O Globo

Os R$ 17,2 milhões em Pix recebidos pelo ex-presidente Jair Bolsonaro nos seis primeiros meses do ano equivalem a 32 vezes o valor de salário e aposentadoria a que ele teve direito no mesmo período.

Bolsonaro tem um rendimento bruto mensal de R$ 89 mil por mês, ou seja, R$ 534 mil entre janeiro e junho. O volume contempla duas aposentadorias — R$ 37 mil da Câmara dos Deputados e R$ 11 mil do Exército —, além de um salário de R$ 41 mil na função de presidente de honra do PL, como divulgou o próprio partido.

Um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão de combate à lavagem de dinheiro, mostrou que uma conta do ex-presidente recebeu R$ 17,2 milhões por meio de transações com Pix. As operações foram realizadas de 1º de janeiro a 4 de julho deste ano.

Segundo o documento, obtido pelo GLOBO, a movimentação seria “atípica” e se referia “provavelmente” a uma campanha de arrecadação para o pagamento de multas por descumprimento de regras sanitárias durante a pandemia de Covid.

Bolsonaro foi autuado em São Paulo por andar na rua sem máscara e tem pendências que somam quase R$ 1 milhão. Os casos foram levados à Justiça pela Procuradoria-Geral do Estado (PGE) diante do não pagamento, e já houve decisões judiciais favoráveis ao bloqueio de recursos para que a dívida seja quitada.

O órgão de inteligência financeira rastreou, ao todo, 769.717 operações de Pix efetuadas para a conta dele em seis meses. Ex-ministros e aliados do PL chegaram a divulgar a chave Pix do ex-presidente nas redes sociais para impulsionar a campanha por dinheiro.

Entre as pessoas que repassaram dinheiro a Bolsonaro, estão uma empresária do agronegócio, com R$ 20 mil; um dono de uma companhia da construção civil, com R$ 10 mil; um escritor, com R$ 10 mil; entre outros.

Na avaliação dos débitos do ex-presidente, o Coaf registrou que “foram realizadas aplicações em CDB/RDBs (investimentos em renda fixa) no valor total de R$ 17 milhões”.

Em nota, a defesa de Bolsonaro afirmou que os valores recebidos por ele têm “origem absolutamente lícita”.

“Para que não se levantem suspeitas levianas e infundadas sobre a origem dos valores divulgados, a defesa informa que estes são provenientes de milhares de doações efetuadas via Pix por seus apoiadores, tendo, portanto, origem absolutamente lícita”, diz a nota assinada pelos advogados Paulo Bueno, Daniel Tesser e Fábio Wajngarten.

Além da campanha de Pix e dos rendimentos, Bolsonaro tem direito a benefícios como ex-presidente da República. Apesar de não haver aposentadoria para o cargo, ele pode receber reembolso do que gasta em diárias e passagens no exterior — o que já custou R$ 731 mil aos cofres públicos neste ano, segundo dados do Portal da Transparência.

Neste sábado, Bolsonaro apareceu de surpresa em encontro estadual do PL Mulher em Florianópolis e aproveitou para agradecer seus apoiadores pelas doações em Pix.

— Muito obrigada a todos aqueles que colaboraram comigo no Pix há poucas semanas. Mais do que o valor depositado, quase um milhão de pessoas colaboraram. Dá para pagar todas as minhas contas e ainda sobra dinheiro para tomar um caldo de cana e comer um pastel com dona Michelle — disse ele, aos risos.

No ano passado, pagamentos vinculados ao então presidente também vieram à tona após a revelação de que o tenente-coronel Mauro Cid, à época ajudante de ordens, cuidava das contas e realizava o pagamento de despesas pessoais de Bolsonaro e sua mulher, Michelle Bolsonaro.

Em 2022, Bolsonaro recebia uma remuneração bruta mensal de R$ 41 mil, levando-se em conta o salário de presidente, a aposentadoria militar e o limite do teto constitucional. No ano, portanto, ele teve direito a R$ 533 mil, contando o 13º salário.

Deste valor, R$ 186 mil, o que representa pouco mais de um terço, foram sacados da conta pessoal em espécie para custear as despesas da família, segundo a defesa de Bolsonaro.

Em maio, o advogado e ex-ministro da Secom Fabio Wajngarten explicou que esse dinheiro era sacado na agência do Palácio do Planalto por Mauro Cid, que o repassava para Michelle pagar as suas despesas pessoais. A ex-primeira-dama ainda usava um cartão de crédito de uma amiga, assessora parlamentar, que depois era reembolsada.

A movimentação do dinheiro em espécie passando pelas mãos da equipe da ajudância de ordens e o uso do cartão de uma terceira chamou a atenção da Polícia Federal. Em uma conversa interceptada pela PF, Cid chega a comentar com uma assessora de Michelle que essa situação deveria mudar, porque os investigadores poderiam entendê-la como um esquema de rachadinha (desvio de recursos público).

— É a mesma coisa do Flávio. O problema não é quando. É como deputado, rachadinha, essas coisas — afirmou ele à assessora.

Tanto a defesa de Bolsonaro como a de Mauro Cid dizem que todos esses pagamentos foram feitos de forma lícita. Wajngarten frisou que nenhuma dessas despesas era paga com o cartão corporativo ou recursos públicos.

— Cem por cento do custo de vida da família Bolsonaro saiu exclusivamente da conta pessoal do presidente — afirmou ele na ocasião.

O Globo