Membros bolsonaristas da CPI travam investigação

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Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

A CPI mista do 8 de janeiro completou no último dia 25 um mês de funcionamento envolta em um dilema que está emperrando os trabalhos de investigação sobre os atos que levaram à invasão e depredação das sedes dos Três Poderes.

A presença de parlamentares bolsonaristas – incluindo alvos de inquéritos no Supremo sobre ações golpistas – está fazendo com que os governistas evitem pedir compartilhamento de provas sigilosas e quebras de sigilo bancário e telefônico de personagens-chaves do 8 de janei

Aliados de Lula temem que, uma vez em poder da CPI, os documentos sigilosos acabem franqueando informações estratégicas da apuração aos próprios investigados, e poderiam ajudá-los a escapar de acusações ou tentar anular os inquéritos que hoje tramitam no Supremo.

Por causa disso, a CPI ainda não aprovou um requerimento de quebra de sigilo sequer. Até o momento, o colegiado acumula 163 solicitações para a derrubada do segredo bancário ou telemático de personagens e empresas suspeitas de conexão com o 8 de janeiro em um universo de 1.173 requerimentos apresentados até o fechamento desta reportagem.

Além disso, depois de um “boom” inicial de requerimentos na ocasião da instalação da CPI, os pedidos de quebra de sigilo praticamente cessaram desde o início de junho.

A maioria dos pedidos já protocolados é da autoria de governistas, mas eles mesmos estão segurando a sua aprovação. O governo tem 20 dos 32 membros da CPI.

Por outro lado, a CPI já aprovou cinco requerimentos de compartilhamento integral de inquéritos sigilosos do Supremo que envolvem parlamentares nos atos golpistas, todos protocolados por aliados próximos de Bolsonaro, como a senadora Damares Alves (Republicanos-DF) e Alexandre Ramagem (PL-RJ).

Só que, neste caso, é o Supremo quem resiste a entregar os papéis dos inquéritos relacionados ao 8 de janeiro e do das fake news à CPI.

Até os oito requerimentos do governista Rogério Correia (PT-MG), que solicitavam as “provas não sigilosas” de inquéritos que correm em segredo de justiça, foram rejeitados pela presidente do STF, Rosa Weber, na última semana por envolverem “diligências em curso”.

Antes, Alexandre de Moraes, relator dos inquéritos do golpismo de janeiro, já havia recusado o compartilhamento das informações com a CPI conduzida pela Assembleia Legislativa do Distrito Federal.

Um dos participantes da CPI, que é inclusive autor do requerimento de instalação da comissão, é o deputado André Fernandes (PL-CE), alvo de um inquérito do Supremo para apurar a responsabilidade pelos atos golpistas de 8 de janeiro. Um relatório da Polícia Federal encaminhado ao STF concluiu que o deputado incitou nas redes sociais os manifestantes que invadiram as sedes dos poderes.

Governistas pressionaram para que o parlamentar fosse excluído do colegiado pelo conflito de interesses, mas o presidente, Arthur Maia (União-BA), recusou-se a fazer isso.

Desde o dia 6 de junho, data em que Maia rejeitou a questão de ordem para barrar André Fernandes, apenas 11 requerimentos de quebra de sigilo foram apresentados por governistas. Foi uma mudança drástica no ritmo da base lulista no colegiado, que até então havia apresentado 134 requerimentos.

Entre os 163 pedidos de quebra de sigilo – bancário e/ou telemático – protocolados na comissão até o fechamento desta reportagem, apenas 18 foram assinados por integrantes da oposição.

Na maioria, eles são destinados a autoridades do governo federal como o ministro da Justiça, Flávio Dino, seu secretário-executivo e ex-interventor do Distrito Federal, Ricardo Cappelli, e o ex-chefe do Gabinete Segurança Institucional (GSI) Gonçalves Dias.

Já os governistas pediram principalmente as quebras de sigilo de bolsonaristas presos após os atentados às sedes dos três poderes e empresas suspeitas de terem financiado os acampamentos golpistas e a mobilização para o 8 de janeiro, além de George Washington Oliveira Souza, preso em dezembro por tentar explodir um caminhão nos arredores do aeroporto de Brasília. No caso do terrorista, os pedidos foram feitos após o seu depoimento à CPI.

Também são alvo desses requerimentos o ex-presidente Jair Bolsonaro e Silvinei Vasques, ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF) que depôs na CPI no último dia 21.

Já o ex-ministro da Justiça Anderson Torres e o ex-ajudante de ordens Mauro Cid, que ainda vão prestar depoimento, ficaram de fora da lista das quebras de sigilo até o momento. A dupla de aliados de Bolsonaro é pivô de um impasse entre Arthur Maia e Eliziane, como publicamos no último dia 19.

Segundo o deputado Rogério Correia, há um acordo para que a presidência da comissão paute requerimentos a partir desta semana – quase 40 dias após a instalação da comissão.

O objetivo era que a discussão sobre quais pedidos devem ser aprovados não atrapalhasse os depoimentos de José Naime, ex-chefe de Operações da Polícia Militar do DF preso desde janeiro, e do coronel do Exército Jean Lawand Jr, flagrado em diálogos golpistas com Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.

Ainda que o prazo máximo de funcionamento da CPI seja de seis meses, pelo regimento da Câmara, a demora na apreciação dos pedidos represados até agora impediu os parlamentares de terem acesso a informações e indícios para inquirições futuras e potenciais novas frentes de investigação.

Se antes da instalação havia dúvidas quanto à capacidade da CPI de revelar as entranhas golpistas do 8 de janeiro, agora a coisa já evoluiu para o campo da probabilidade. Sem informação, o mais provável é que a CPI ande de lado e não chegue a lugar nenhum

O Globo