Autor prega que Rosa Weber sejá substituída por mulher

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Foto: Jardiel Carvalho/Folhapress

Parte da legitimidade do STF (Supremo Tribunal Federal) depende do entendimento da sociedade de que os magistrados agiram de acordo com a lei, o que demanda maior controle sobre declarações públicas e relacionamentos com a classe política.

Esse é um dos aspectos destacados pelo professor de direito constitucional do Insper Diego Werneck em seu novo livro, “O Supremo: Entre o Direito e a Política”, que será lançado na quinta-feira (17) pela editora Intrínseca.

Na obra, o professor busca explicar o funcionamento da corte ao leitor comum, passando por questões como “eles podem fazer isso?”, “por que esse caso?”, “por que tanta exposição?”.

“O Supremo é, hoje, um tribunal legítimo, que cumpre um importante papel em nossa democracia, mas com disfunções de desenho e de comportamento de seus integrantes que vêm erodindo aos poucos sua legitimidade enquanto tribunal”, diz em um trecho.

Em entrevista à Folha, ele defende que os ministros adotem o mesmo comportamento discreto da ministra Rosa Weber para conseguir julgar temas polêmicos, como o aborto. Werneck diz ainda que a indicação de uma mulher para substituir a magistrada é fundamental.

Para o professor, que defende que “tanto eleições quanto processos judiciais precisam ter um ponto final, goste-se ou não do resultado”, ao não encerrar o chamado inquérito das fake news —instaurado em 2019 para apurar ataques à corte— o STF mantém vivas suspeitas sobre os critérios que norteiam o comportamento dos ministros e seus limites de atuação.

“Parece haver um empurrão político para que o tribunal se mantenha à frente desse processo de responsabilização do que aconteceu no governo Bolsonaro. É claro que o tribunal vai ter um papel fundamental nisso. O que não está claro para mim é por que é preciso que o STF esteja à frente desses inquéritos todos?”, diz.

O autor considera o saldo de decisões do ministro positivo para a democracia, mas afirma que é preciso observar cada caso. Em janeiro, Werneck criticou a decisão de ofício do ministro que afastou o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), do cargo após os ataques do dia 8 de janeiro.

Embora considere o comportamento de Moraes adequado, ele diz que qualquer personalização é perigosa para o Supremo.

“Moraes foi lançado a esse protagonismo, mas, a longo prazo, o tribunal que a gente quer não é aquele em que indivíduos sejam mais poderosos do que a instituição”, diz.

Para Werneck, a mudança no regimento da corte impondo o prazo de 90 dias para pedidos de vista serem devolvidos ao colegiado e restringindo decisões individuais dos ministros foram a “autocrítica do Supremo”.

No caso de Ibaneis, apesar de considerar que a decisão não teve fundamentos convincentes, o professor afirma que ela foi imediatamente submetida ao plenário, um procedimento importante em casos excepcionais como os dos ataques de 8 de janeiro.

“Essas decisões eram heterodoxas. Eram argumentos inéditos em muitos casos e juristas discordam. Essa discordância é importante e deve lembrar o Supremo que está lidando com poderes que não podem ser normalizados.”

O professor apoia medidas para reduzir o julgamento de políticos pela corte, em decorrência do foro especial, e reforça que o tribunal deve redobrar a cautela com a velocidade dos julgamentos, manifestações públicas dos ministros e com quem eles se encontram.

Na obra, Werneck que “seria um equívoco grave imaginar que uma instituição que, em boa parte, se justifica por sua função de frear abusos cometidos por outros poderes não deveria ser constantemente monitorada e aperfeiçoada para evitar abusos cometidos por ela própria”.

À Folha o professor defende que os ministros sigam o código de ética da magistratura e as recomendações do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) para uso de redes sociais. Uma delas, diz, reforça que juízes precisam entender que o cargo que exercem impossibilita certas manifestações.

Ele cita o comportamento de Rosa Weber como o “padrão ouro” do que se espera dos integrantes do tribunal. Em relação ao ministro Luís Roberto Barroso, próximo presidente da corte e alvo de críticas após dizer “derrotamos o bolsonarismo” em evento da UNE (União Nacional dos Estudantes) em julho, Werneck diz que será preciso que ele tome cuidado com o que fala.

“Antes de ser presidente do Supremo, ele é um juiz. O núcleo duro da atividade do Supremo é julgar e a coisa mais importante é convencer as pessoas de que não tem lado e de que está fazendo o maior esforço possível para aplicar regras que ele mesmo não criou.”

Para julgar temas polêmicos, como a descriminalização do aborto nas 12 primeiras semanas de gestação, Werneck diz que o tribunal precisa “recuar na exposição pública e repensar o seu modo de funcionamento” para que “as únicas controvérsias que surjam sejam sobre a decisão em si esse argumento convence ou não”.

O professor considera fundamental que o presidente Lula (PT) busque candidatas mulheres para a vaga de Rosa Weber pelo fato de a corte só ter tido três ministras até hoje. A ministra vai se aposentar em setembro.

“Ainda que a vaga fosse de um homem, essa questão se colocaria com muita força. É uma obrigação moral importante de qualquer presidente que tivesse esse poder e, no caso do presidente Lula, é um compromisso que parece alinhado com os valores que ele e seu governo professam. É difícil imaginar que não haja mulheres no Brasil que preencham os requisitos para a indicação.”

O professor afirma que, apesar disso, o machismo existente na área jurídica dificulta a trajetória das mulheres e a proximidade delas com atores políticos para que sejam consideradas para as vagas.

Ele acrescenta que a indicação é um momento em que o presidente exerce “a política presidencial com P maiúsculo” e que, assim como Jair Bolsonaro destacou a indicação de André Mendonça como evangélico, Lula pode dizer: “Vou indicar uma mulher, uma mulher negra, porque eu acho importante”.

O professor classifica na obra como indicações patológicas aquelas feitas com a finalidade de interferir politicamente no Supremo, colocando no tribunal “alguém com disposição para ser um agente de quem o indicou”.

Werneck afirma que esse não parece ser o caso do ministro Cristiano Zanin, que, assim como André Mendonça, tem “grande responsabilidade de evitar danos à imagem do tribunal”.

Apesar de Mendonça ter se somado ao ministro Kassio Nunes Marques como voto contrário nos processos para tornar réus os acusados pelos ataques de 8 de janeiro, Werneck vê nos votos dele “algum meio do caminho em alguns temas”. Já sobre Kassio Nunes Marques, ele afirma que o ministro já tem falhado no teste de se distanciar da visão de Bolsonaro.

Folha