Castro gostou de Lula defendê-lo de vaias

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Foto: Domingos Peixoto/Agência O Globo

Apesar de nutrir um sentimento agridoce em relação à passagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pelo Rio, o entorno do governador Cláudio Castro (PL) vê como positivos os discursos que o presidente fez após vaias da militância lulista ao mandatário fluminense. A leitura é de que a postura “estadista” de Lula, que pregou convivência entre adversários políticos, vai ao encontro do que Castro defende: uma parceria pragmática com a União, pouco vinculada ao jogo eleitoral – até porque os anseios do governador, que quer o Senado em 2026, não são conflitantes com a ascensão de Lula.

No saldo geral da passagem do presidente pelo Estado, avalia-se que o diálogo entre os dois tende a permanecer desse jeito no futuro próximo. Não devem virar aliados, tampouco inimigos. Dependente da União, o Rio costuma levar demandas a Brasília – entre elas, revisões do Regime de Recuperação Fiscal, no qual está desde 2017. O Estado também é o maior beneficiário do novo PAC: são R$ 342,6 bilhões em investimentos, com predomínio do setor de óleo e gás.

A primeira vaia ao governador foi ouvida em Campo Grande, na zona oeste do Rio, durante agenda capitaneada pelo prefeito Eduardo Paes (PSD). O evento no estádio Ítalo Del Cima tinha ampla plateia de militantes. Ali, Lula saiu em defesa de Castro, mas emendou o discurso com um sermão sobre a atuação das polícias. Naquela semana, um jovem de 13 anos havia sido morto em operação policial na Cidade de Deus, também na zona oeste.

O contexto da visita presidencial, diante de mais uma morte em favelas do Rio, foi mesmo considerado delicado para o governador – e teria sido ainda pior se ocorresse dias depois, quando outros dois jovens foram vítimas da violência urbana carioca. Na terça-feira (15), perguntado sobre as mortes, Castro reconheceu pela primeira vez que “alguma coisa está fora do protocolo”. Aliados do governador, no entanto, têm martelado uma suposta hipocrisia de Lula ao focar na polícia do Rio, dado que a da Bahia, Estado comandado pelo PT desde 2007, assumiu a primeira posição da lista das que mais matam no país.

O perfil do público do evento de Campo Grande já tinha ligado o alerta de Castro para possíveis vaias. Estava precificado. Apesar de ter desistido de ir para outra agenda poucas horas depois, o governador e o presidente confraternizaram à noite na Gávea Pequena, residência oficial do prefeito, onde ficaram até cerca de 23h.

No dia seguinte, sexta-feira (11), a cena foi mais impactante. O lançamento do PAC, no Theatro Municipal, registrou sucessivas vaias ao governador, além de gritos de “assassino”. Ele discursaria como anfitrião, mas desistiu. Lula precisou iniciar sua fala no evento com uma defesa enfática de Castro e do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), também vaiado. Demonstrou incômodo e até certo constrangimento com a situação, que aliados do petista de fato consideraram descabida.

“O evento era algo muito institucional, uma agenda positiva essencial do governo Lula. Não era para ter sido marcada por esse tipo de militância”, avalia um interlocutor do presidente no Rio.

O discurso no PAC, mais do que o do dia anterior, foi descrito por aliados de Castro como “de estadista”, “exemplar” e “maravilhoso”. E sinalizou que, assim como não é do interesse do governador deixar de receber Lula em futuros compromissos no Rio, o presidente também não abre mão da parceria federativa.

Apesar da defesa firme, Castro e Lira desistiram de participar, naquela tarde, de almoço no BNDES com Lula e ministros. Optaram por uma feijoada no Palácio Laranjeiras, residência oficial do governador.

Mesmo com todo o drama, aliados avaliam que Castro saiu por cima na relação com Lula. Enquanto isso, o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), foi alvo de indiretas durante o evento do PAC por causa de comentários críticos à região Nordeste feitos dias antes. No Rio, o núcleo duro de Castro compara: Zema é um exemplo de quem tem interesse em protagonizar embates nacionais com Lula, algo longe dos planos do mandatário fluminense. Castro tenta construir, com o máximo de pragmatismo, um processo político que lhe assegure vaga no Senado em 2026.

Pesquisas do governo do Rio mostram no Estado uma tendência parecida com a nacional, registrada nesta semana pela Quaest: Lula tem aumentado o grau de aprovação.

Valor Econômico