Ministros do STJ fazem eleição paralela para vaga na Corte

Destaque, Todos os posts, Últimas notícias

Foto: Sérgio Lima/STJ/Divulgação

Na reta final da acirrada disputa por três vagas em aberto do Superior Tribunal de Justiça (STJ), um grupo influente de ministros se reuniu na semana passada em Brasília para discutir as candidaturas com mais chances e combinar seus votos na eleição que ocorre nesta quarta (23).

Até uma “votação simulada” foi feita com cédulas em papel para antecipar o que seria o sufrágio real e servir como termômetro para mapear o favoritismo no universo de 63 postulantes, conforme a equipe da coluna apurou com cinco fontes que acompanham de perto a disputa.

De acordo com os cálculos dessas fontes, o grupo em questão tem 14 ministros. É liderado pelo ministro Luis Felipe Salomão, que já foi ministro do TSE, é corregedor nacional de Justiça e um dos mais próximos aliados de Alexandre de Moraes no Judiciário.

Eles se reúnem com frequência para alinhar posições em casos relevantes da Corte. Embora não sejam ainda a maioria dos 30 ministros, eles constituem o único bloco coeso do tribunal.

Por isso, terão influência decisiva na eleição em que os ministros vão formar duas listas de candidatos a serem enviadas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na primeira, para preencher as vagas destinadas a desembargadores, os ministros selecionarão quatro nomes, dos quais o presidente da República escolherá dois. A segunda lista será composta por três advogados e servirá para preencher a vaga da OAB.

Nos últimos meses, 57 desembargadores e seis advogados fizeram uma campanha acirrada, marcada por dossiês, duelo de padrinhos, lobby de políticos, corpo a corpo em eventos jurídicos no exterior, intrigas de bastidores e até uma ofensiva de candidato para limpar a própria ficha criminal antes da data da votação.

Num cenário tão conflagrado, o grupo de Salomão ganha ainda mais importância, não só pelo número de ministros, mas também pelo perfil de seus integrantes, mais articulados no Judiciário e no mundo político – como Mauro Campbell e Benedito Gonçalves, relator das ações que investigam Jair Bolsonaro no TSE.

Embora procure atuar de forma discreta, a existência do grupo não é segredo nem no STJ e nem no meio jurídico.

Tanto que, pouco depois das votações realizadas na semana passada – uma delas num restaurante do Lago Sul de Brasília –, os principais candidatos, assim como seus lobistas e apoiadores, já conheciam os resultados e os usavam como uma espécie de prévia da votação oficial.

Segundo os cinco relatos obtidos pela equipe da coluna, dois desembargadores apareceram na dianteira para figurar na lista quádrupla: Elton Martinez Carvalho Leme, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), e Carlos Vieira von Adamek, do TJ de São Paulo.

Elton é apoiado pelo próprio Salomão e, de acordo com as fontes ouvidas pela coluna, “ficou perto da unanimidade” no grupo.

Já Adamek, que conta com o lobby do ministro do Supremo Dias Toffoli, ficou em segundo lugar.

O candidato do ministro Alexandre de Moraes, Airton Vieira, também do Tribunal de Justiça de São Paulo, ficou em terceiro.

Depois deles, vieram o desembargador do TJ da Bahia Maurício Kertzman – que é apoiado pelo senador do PT Jaques Wagner e tem conseguido arquivar inquéritos para tentar limpar a ficha antes da votação – e o mineiro José Afranio Vilela.

Na lista de advogados, a liderança coube a Daniela Teixeira, da OAB do Distrito Federal – que fez uma campanha considerada agressiva por ministros do próprio STJ, incluindo a ala feminina da Corte.

Também apareceu bem posicionado na simulação outro candidato apoiado por Toffoli: Otávio Rodrigues.

Depois da simulação, os membros do grupo assumiram o compromisso de votarem em bloco nos dois primeiros colocados na eleição oficial. Como cada ministro vota em quatro nomes, para as outras duas vagas cada um indica quem preferir.

Tamanho apoio do grupo de Salomão a esses candidatos pode acabar definindo os vencedores da eleição no STJ – desde que não haja traições entre eles, é claro.

A própria notícia de como os membros do grupo votaram nessa simulação pode acabar levando a ofensivas de última hora e cobranças por atitudes mais enfáticas em favor de um ou outro.

Além disso, como a votação da lista da OAB ocorrerá logo depois da dos desembargadores, há quem tenha dúvidas se os ministros do STJ vão favorecer nas duas votações o mesmo ministro do Supremo, Dias Toffoli, que apoia dois dos candidatos apontados como favoritos na lista de Salomão.

Há, porém, outros fatores a serem considerados para a votação da próxima quarta-feira. Entre os chamados “independentes”, que não circulam na órbita do todo- poderoso ministro do STJ, Adamek enfrenta menos resistência que Airton Vieira, que vem sendo criticado por conta de posições ultraconservadoras, a favor da pena de morte e da redução da maioridade penal, conforme informou a equipe da coluna.

Para entrar na lista, seja a quádrupla (da Justiça Estadual) ou a tríplice (da OAB), é preciso que os candidatos obtenham, pelo menos, 17 votos.

É comum que as votações se arrastem por várias rodadas, até que os nomes menos escolhidos sejam eliminados e os mais votados consigam angariar apoio suficiente para atingir o mínimo necessário. O pleito é secreto, o que abre brecha para traições de todos os lados.

“Essas listas prometem traições em alto grau, o que em tese pode levar a resultados inesperados”, afirma um ministro do STJ fora da órbita de Salomão.

Também deve contar na composição das listas a região de origem de cada candidato, para contemplar diferentes grupos políticos. Por isso, é considerado pouco provável que tanto Adamek quanto Vieira, os dois de São Paulo, entrem na lista.

“Se Adamek entrar num primeiro escrutínio, Vieira pode ser rifado no segundo, para não haver dois paulistas na lista”, diz à equipe da coluna um atento observador da disputa entre Toffoli e Alexandre de Moraes.

Isso significa que o apoio do grupo de Salomão pode selar o favoritismo de um candidato, mas ainda assim é preciso trabalhar para não ter o veto dos ministros.

A equipe da coluna procurou o STJ, mas Salomão não havia se manifestado até a publicação deste texto. O espaço da coluna segue aberto.

O Globo