Tarcísio pune secretário que denunciou corrupção

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Foto: Governo de SP/Divulgação

Há oito meses no cargo, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), começa a esquadrinhar, nos bastidores, uma reforma de seu secretariado a partir de meados de setembro, segundo auxiliares próximos. Os titulares da Agricultura, Antônio Junqueira, e do Turismo, Roberto de Lucena, são citados como nomes que não têm correspondido às expectativas do mandatário e que poderiam acabar perdendo o cargo.

A primeira mudança, no entanto, vai começar pelo segundo escalão, com a saída do secretário-executivo da Agricultura, Marcos Renato Böttcher, cuja exoneração deve ser publicada já nesta segunda-feira (28). Um grupo ligado ao deputado estadual Itamar Borges (MDB) faz pressão pela troca do auxiliar.

A cabeça do número 2 da Pasta foi posta a prêmio após ele entregar ao Tribunal de Contas do Estado (TCE-SP) um relatório com denúncias de irregularidades na construção de estradas do programa Melhor Caminho, no interior paulista. As informações, reveladas pelo Estadão, dizem respeito ao período em que Borges e Francisco Matturro estiveram à frente da secretaria, durante os governos de João Doria e Rodrigo Garcia (PSDB).

No último dia 18, uma resolução publicada no Diário Oficial instituiu um grupo de trabalho que seria presidido por Böttcher para “tratar dos problemas contratuais” com empreiteiras no âmbito do programa. A proposta era realizar reuniões semanais em que seriam apresentados relatórios sobre os problemas encontrados e sugestões de correção. Haveria ainda a possibilidade de convidar integrantes de outras secretarias para participar das discussões.

A iniciativa, no entanto, foi desautorizada pelo governador e, três dias depois, revogada após queixas de políticos da base. Uma das justificativas para a criação do grupo era a “elevada demanda” de órgãos externos por soluções para as irregularidades.

Na última segunda-feira (21), mesmo dia em que a criação do grupo foi revogada, Borges reclamou da postura de Böttcher durante jantar do governador com prefeitos do MDB no Palácio dos Bandeirantes. As queixas foram consideradas válidas pelo entorno do mandatário.

Segundo auxiliares de Tarcísio, a convocação de uma equipe com essa finalidade excede os limites da atuação e prejudica as atividades finalísticas da pasta. Eles lembram que a Controladoria Geral do Estado (CGE) e o Ministério Público já investigam os problemas detectados no Melhor Caminho.

Também afirmam que a secretaria não tem apresentado resultados a contento. Entre as críticas, está a lentidão na instalação de tecnologia 4G em regiões rurais de São Paulo.

Na próxima terça-feira (29), o próprio secretário Antônio Junqueira, que também está em risco, deve se licenciar do cargo por 15 dias por questões de Saúde.

Procurados, o governo de São Paulo e a Secretaria de Agricultura não se manifestaram. Böttcher também não se pronunciou. Já o deputado Itamar Borges afirmou, por meio de assessoria, disse ter tomado conhecimento da demissão do número 2 da Agricultura por meio da reportagem.

“Independente dos fatos que pretenda correlacionar à esta medida administrativa, não cabe ao parlamentar, integrante do Poder Legislativo Estadual, opinar, por meio de comentários públicos, neste tipo de questão. Nomeações de secretários e demais colaboradores das secretarias são atribuições exclusivas do Poder Executivo”, informou em nota sua assessoria.

O ex-secretário Francisco Matturro não foi encontrado para falar sobre o relatório. Já o secretário de Turismo, Roberto de Lucena, questionado sobre uma possível saída do governo, limitou-se a afirmar que não vai tratar sobre o assunto.

Questionado pelo Estadão se pretende fazer em breve uma reforma no secretariado, o governador Tarcísio de Freitas afirmou apenas que isso não acontecerá neste momento. “Por agora, não”, afirmou ele na sexta-feira, 25, quando participou da inauguração de uma estrada vicinal em Barretos, interior do Estado.

O relatório entregue ao TCE-SP pela Secretaria de Agricultura em março aponta para “graves irregularidades” no programa Melhor Caminho, de construção de estradas rurais, entre os anos de 2021 e 2022. Segundo o documento, foram pagos cerca de R$ 200 milhões por obras que não foram concluídas. Outros R$ 300 milhões foram gastos, conforme a análise da gestão de Tarcísio Freitas (Republicanos), sem passar pelo protocolo de processos internos que garantem a qualidade das obras. Os atos aconteceram nas gestões de João Doria e Rodrigo Garcia (PSDB), que não se manifestaram quando das revelações.

De acordo com o documento, R$ 200 milhões foram pagos por obras que não haviam sido concluídas e outros R$ 300 milhões, gastos sem passar pelo protocolo de processos internos que garantem a qualidade dos projetos.

Em alguns casos, transferências foram efetuadas às empresas contratadas sem que os despachos em que os fiscais atestam a realização do serviço fossem registrados no sistema eletrônico. Ao todo, 420 obras foram paralisadas, canceladas ou nem iniciadas.

O programa foi relançado em outubro de 2021, quando Borges (MDB) comandava a Agricultura no Estado. Na época, ele prometeu asfaltar 5 mil quilômetros de vias rurais em um ano. A meta representaria um aumento de dez vezes no ritmo de execução em comparação à versão anterior do programa, criada em 1997, que entregou 12 mil quilômetros em 24 anos.

No entanto, somente 1,6 mil quilômetros foram concluídos até maio deste ano, um terço do total previsto. Ao todo, foram contratados R$ 844 milhões para tirar as obras do papel, com a contratação de 59 empreiteiras, de uma empresa para elaborar os projetos e de outra para gerenciá-los.

Mesmo com os problemas identificados e pareceres contrários da Consultoria Jurídica da Pasta e da Subprocuradoria Geral do Estado o governo pagou, no fim de dezembro de 2022, R$ 50 milhões em aditivos de reequilíbrio econômico financeiro sob justificativa de impactos econômicos da guerra na Ucrânia e da pandemia da Covid-19.

O MP abriu 147 investigações para apurar identificar todos os detalhes e envolvidos em supostos desvios. A suspeita é de que esses fatos possam configurar ‘em tese, ato de improbidade administrativa doloso’.

Estadão