Zema tenta reorganizar extrema-direita

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Foto: Andreza Matais

Não é possível dizer se foi ou não a melhor forma. Afinal, ao defender o protagonismo das regiões Sul e Sudeste para fazer frente ao Norte e Nordeste, se envolveu numa polêmica nacional. Mas o fato é que o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo) deu a largada para um processo de reaglutinação da direita que andava meio acabrunhada, desde que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), há um mês, declarou inelegível o ex-presidente Jair Bolsonaro.

Zema, na entrevista que concedeu ao Estadão, pôs as cartas na mesa, mostrou seu jogo e se posicionou. Em um cenário ainda polarizado por Lula e Bolsonaro, o governador fez questão de afirmar que o ex-capitão nunca foi sua primeira opção na urna e reconheceu que o comportamento estridente e as atitudes beligerantes do ex-presidente nunca foram de seu agrado. Concordou até quando lhe foi perguntado se os eleitores não prefeririam alguém “menos encrenqueiro” e fez questão de abrir seu voto, anunciando que optou por Luiz Felipe d’Ávila no primeiro turno e que, só no segundo, votou em Bolsonaro “para evitar a vitória de Lula”.

Em outro movimento, tentou agradar a centro-direita que não faz parte do grupo bolsonarista. E defendeu a manutenção de políticas compensatórias, como o Bolsa Família. Definindo-se como um político “de direita e liberal”, disse que o programa era necessário em um país com tanta pobreza e se, para mantê-lo, precisasse mudar o rótulo de direita, aceitaria de bom grado o de “centro-direita”.

Governador do segundo maior colégio eleitoral do país, Zema, 58 anos, foi reeleito no primeiro turno com 56,2% dos votos. Não rejeita a hipótese de disputar a presidência da República. Tampouco a confirma e cita os colegas do Paraná, Ratinho Junior (PSD), do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), e de São Paulo, Tarcísio de Freitas (PR). Porém, insinua que ficaria satisfeito em tentar o Senado – se o cavalo da Presidência não passar encilhado à sua frente – e que prefere ser lembrado como um bom governador do que como mais um presidente. Só impõe uma condição para a escolha do candidato, a de que seja um nome que aglutine a direita. “Se for para lançar dois, três nomes (em 2026) aí é para dar de mão beijada a reeleição ao adversário”.

Zema, entretanto, conhece bem as condicionantes para que o nome “que aglutine” seja o dele. E, neste momento, seu principal adversário nessa escolha, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, nem pode pensar em participar desse carteado. Primeiro porque está num péssimo momento de sua administração e cheio de problemas locais para resolver. É certo que governador de São Paulo, assim como ministro da Fazenda, se bem-sucedidos, são quase que candidatos “natos” à Presidência da República. Aliados de Tarcísio, contudo, têm recomendado que deixe a afobação presidencial de lado e se concentre num bom governo para disputar a reeleição.

Se o pleito fosse hoje, a situação de Tarcísio não seria boa. Ele acaba de protagonizar mais um recuo de uma medida anunciada que repercutiu muito mal. Desta vez, foi da decisão de que as escolas de São Paulo abandonariam os livros físicos que seriam substituídos pelos digitais. Foi na contramão do que europeus e especialistas de outros países e daqui vem recomendando e num País onde 36 milhões de cidadãos não têm acesso à internet e 62% só conseguem entrar na rede por meio do telefone celular. Tarcísio já voltou atrás e quem quiser estudar no livro impresso poderá fazê-lo.

Em outro setor, o da segurança, a situação do governador é ainda pior. A Operação Escudo, desencadeada após a morte por criminosos do PM da Rota Patrick Bastos Reis, que fazia uma ronda no Guarujá, já resultou na morte de 16 pessoas e consome popularidade de Tarcísio, eleito com promessas de atacar a criminalidade e com a imagem de bolsonarista moderado. Por fim, ele enfrenta uma rebelião na Assembleia Legislativa, liderada pelos seguidores radicais de Jair Bolsonaro que querem cargos e verbas para aprovar a reforma administrativa.

Quem conhece e acompanha os processos eleitorais no país sabe que até 2026 muito jogo vai correr. Quem conhece e acompanha a política mineira sabe que não é do feitio dos políticos locais jogar com afobação e com pressa para se livrar das cartas. Zema, até ganhar seu primeiro mandato, sempre foi um empresário. Ele mesmo diz que até hoje se sente um estranho na política. Terá que se familiarizar porque nessa mesa de jogo, ninguém é amador e o mais lerdinho, voa.

Estadão