Bolsonaro confessou que ia dar golpe

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Foto: Agência Brasil

Às primeiras notícias de que poderíamos ouvir o canto do tenente-coronel Mauro Cid sobre a tentativa de golpe de Estado planejada para impedir a posse de Lula, o advogado de defesa do ex-ajudante-de-ordem de Bolsonaro correu a declarar que não haveria delação.

Um militar, ainda mais um oficial de alta patente, jamais delataria seu superior ou seus subordinados. No caso desses últimos, simplesmente os puniria por suas faltas. No caso de um superior, no máximo confirmaria ou não o que ele pudesse ter feito de errado.

E assim, por meses a fio, ficou a impressão de que Mauro Cid se limitaria a assinar embaixo das provas já obtidas pela Polícia Federal sobre o mal comportamento de Bolsonaro. Contestá-las agravaria sua situação e o deixaria sujeito a penas mais severas.

Não foi o que aconteceu. Mauro Cid foi muito além do que seu celular apreendido já havia revelado, e muito além do que a Polícia Federal já sabia ou desconfiava. Quanto além ele foi, nem tão cedo ficará claro. Mas isso não importa agora.

Uma vez que cantou, e que cantou bonitinho, ele obrigará outros colegas de farda a cantarem também para não serem acusados de cúmplices em pelo menos dois crimes: abolição violenta do Estado Democrático de Direito e tentativa de golpe de Estado.

Alguns relatos dão conta de que o Comandante da Marinha à época, o almirante Almir Garnier Santos, disse sim à proposta de golpe de Bolsonaro, enquanto os comandantes do Exército, general Freire Gomes, e da Aeronáutica, brigadeiro Carlos Batista, disseram não.

Outros relatos dão conta que o brigadeiro ficou calado, e que o general, em reunião com Bolsonaro no final de novembro, ameaçou prendê-lo se ele insistisse com a ideia do golpe. Essas coisas deverão ser esclarecidas quando o general e o brigadeiro forem depor.

Sim, porque a Polícia Federal irá ouvi-los. Como certamente ouvirá outros militares graduados, como os generais Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional, e Walter Braga Neto, ex-ministro da Defesa e vice na chapa de Bolsonaro.

Augusto Heleno adiantou-se e disse que Bolsonaro nunca conversou com ele sobre golpe, e que ele nunca ouviu falar em golpe. Braga Netto será interrogado sobre um vídeo postado pelo prefeito bolsonarista de Tapurah, Carlos Alberto Capeletti (PSD-MT).

No dia 14 de novembro do ano passado, Capeletti, que estava acampado com centenas de golpistas à porta do QG do Exército, em Brasília, contou o que ele e um grupo de amigos tinham acabado de ouvir de Braga Neto:

“Na saída do mercado Carrefour encontramos o general Braga Netto, que veio ao nosso encontro, e nos tranquilizou falando que não é para nos preocupar que vai acontecer algo muito bom para toda a sociedade do Brasil ainda nesta semana”.

Outro vídeo, esse de 18 de novembro, exigirá explicações de Braga Netto. Nesse dia, diante do choro de uma mulher que se queixava de enfrentar chuva e sol no acampamento, o general pediu-lhe:

“Não perca a fé”.

Bolsonaro começou a perder a fé no golpe em 24 de novembro. Esse foi o dia em que o general Freire Gomes, depois de consultar a maioria dos membros do Estado Maior do Exército, disse não ao golpe durante reunião no Palácio da Alvorada.

Como o golpe seria possível se os generais comandantes do Sul (Fernando Soares), do Sudeste (Thomaz Paiva), do Leste (André Novaes) e do Nordeste (Richard Nunes) eram contra? E se o governo dos Estados Unidos informara a tempo que também era contra?

No último pronunciamento que fez aos brasileiros, pouco antes de se evadir para os Estados Unidos no dia 30 de dezembro, referindo-se à posse de Lula dali a dois dias, Bolsonaro afirmou a certa altura:

“Eu busquei dentro das quatro linhas, dentro das leis, saída para isso aí”.

Dentro das quatro linhas não havia, como não há, saída legal para abortar a posse de um presidente eleito. Sem querer, Bolsonaro confessou o golpe que pretendeu dar.

Metrópoles