Prefeito de SP inunda empresas de ônibus com dinheiro

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Foto: Danilo Verpa/Folhapress

A Prefeitura de São Paulo tem aumentado cada vez mais o gasto com o subsídio dos ônibus pago às empresas responsáveis pelo serviço na cidade. Mesmo com a complementação financeira feita com dinheiro público, as contratadas não recebem cobranças por melhorias no transporte municipal.

Em 2022, a gestão de Ricardo Nunes (MDB) gastou R$ 5,1 bilhões — o custo total do sistema foi de R$ 10,3 bilhões. Trata-se de um aumento de 50% em relação a 2021, quando o repasse público foi de R$ 3,4 bilhões. Os dados são do relatório da SPTrans, responsável por gerenciar o transporte na capital paulista.

De janeiro até agosto de 2023, o subsídio foi de R$ 3,7 bilhões. A expectativa é de que, até o final deste ano, esse valor seja de R$ 7,4 bilhões e o custo total pelo serviço de R$ 12 bilhões. A previsão foi dada pelo diretor de administração de infraestrutura da SPtrans, Anderson Clayton Maia, no ano passado, em audiência pública na Câmara dos Vereadores.

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No ano passado, mais de 2 bilhões de passageiros usaram o transporte municipal. É uma média de 6,8 milhões por dia útil. Em relação a 2021, houve um aumento de 22,75%, quando 1,67 bilhão de pessoas usou os coletivos.

O subsídio é um valor pago pela prefeitura para que o sistema de transporte não dependa exclusivamente da tarifa e também para custear as gratuidades oferecidas, como a de idosos e estudantes. O valor é definido pela diferença entre o custo do sistema e a arrecadação da receita, diz a autarquia responsável pelo transporte na capital paulista.

Sem o subsídio, a tarifa seria de R$ 10,45, informa a SPTrans. O subsídio é uma política necessária e o valor “não é para as empresas, mas ao sistema de transportes”, argumenta.

O preço da passagem está congelado em R$ 4,40 desde 2020. No ano passado, Nunes e o então recém-eleito governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), negociaram o congelamento das tarifas de ônibus e metrô. Isso foi possível porque ambos os governos contam com caixas financeiros bilionários.

Enquanto a tarifa paga pelo passageiro foi mantida, o custo do sistema aumentou, considerando a cesta de insumos prevista no contrato de concessão, como reajuste no valor da mão de obra e valores como de manutenção, peças, renovação da frota e pneus.
SPTrans, responsável por gerenciar o sistema de ônibus na cidade de SP

“Profundamente racional” que setor receba subsídios, declara o ex-secretário municipal de Mobilidade e Transportes Sérgio Avelleda — ficou à frente da pasta na gestão de João Doria, de 2017 até abril de 2018. Ele, que também é coordenador do núcleo de Mobilidade Urbana do laboratório de Arq.Futuro do Insper, destacou que, assim como educação e saúde, o transporte é um direito garantido na Constituição.

Avelleda disse ainda que outros meios de transporte também são subsidiados pela Prefeitura, mas de forma indireta. “Tenta pesquisar quanto é gasto com carro. Esse número não existe, porque as despesas estão dispersas em várias rubricas. Dá a sensação que não custa nada. Esse é o debate. Por que só o usuário do transporte público é chamado a pagar a conta?”, diz.

Problema não está no pagamento do subsídio pela prefeitura, mas na falta de fiscalização para melhorias no serviço, avaliam especialistas e vereadores da capital paulista. A SPTrans rebate e diz que fiscaliza a operação das empresas “24 horas por dia”.

O subsídio é importante, mas hoje ele é um tapa-buraco. Não vemos melhorias, nem um aumento na qualidade do que é oferecido para população. Existe também uma falta de firmeza da SPTrans em fiscalizar o trabalho feito por essas empresas.
Rafael Calabria, coordenador do programa de mobilidade urbana do Idec

Para Calabria, a prefeitura deveria vincular o gasto com algum critério, como o aumento na frota de veículos e a modernização. Com duração de 15 anos, a licitação assinada em 2019 prevê melhorias no sistema como ônibus mais modernos com ar-condicionado e motores menos poluentes.

A Prefeitura tem instrumentos para fiscalizar e manter a qualidade da operação dos ônibus por meio da SPTrans e outros órgãos. Está faltando rigor na fiscalização de operação, importante para que não haja prejuízo para o sistema ou para o usuário.
Senival Moura, vereador do PT

Segundo a SPTrans, se alguma irregularidade é constatada, como o descumprimento das partidas programadas ou comportamento de motoristas, uma autuação é aplicada. Os passageiros podem também registrar críticas ou sugestões pelo 156.

Nunes pediu um estudo à SPTrans para analisar a possibilidade de implementar a tarifa zero na cidade. Isso aconteceu em novembro do ano passado, e o gesto é visto como estratégia para tentar a reeleição em 2024.

Nunes deve ter como principal adversário na disputa o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL). O partido do parlamentar tem como uma de suas bandeiras a tarifa zero no transporte público. Por isso, o prefeito tem usado o tema do transporte para acenar à esquerda.

A postura do emedebista, entretanto, é diferente da adotada em 2021. Nunes disse que seria “inevitável” aumentar o valor da passagem com a alta do preço do diesel. Questionada sobre uma suposta ação eleitoral, a Prefeitura de São Paulo repetiu a resposta enviada pela SPTrans e disse que os subsídios são pagos para manter a tarifa no valor mais baixo possível e garantir as gratuidades.

Câmara dos Vereadores discute uma proposta de tarifa zero gradual. Um projeto de lei que prevê duas gratuidades por dia útil para desempregados e pessoas de baixa renda está em discussão na Casa. O projeto é “autorizativo”, ou seja, não obriga a prefeitura a cumprir, mas permite que a administração municipal implante a decisão.

“A possibilidade do município implantar um vale-transporte social é real”, afirma o vereador Paulo Frange (PTB), presidente da subcomissão da tarifa zero. Ele nega, entretanto, que a discussão na Câmara tenha caráter eleitoral. “É um assunto tratado há algum tempo.”

A SPTrans disse ao UOL que lidera o estudo sobre a tarifa zero a pedido do prefeito e que não há “detalhes disponíveis para divulgação no momento”.

Uol