Ex-decano critica PEC golpista contra STF
O ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello criticou nesta terça-feira a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que dá poderes ao Congresso para derrubar decisões da Corte. Para o ex-magistrado, o projeto tem um “espírito autocrático” e é inconstitucional porque fere a separação entre os Três Poderes.
A PEC criticada pelo ministro foi apresentada na semana passada pelo deputado Domingos Sávio (PL-MG) e contou como apoio de outros 174 parlamentares. A proposta tramita em meio a uma divergência entre o Congresso e o STF envolvendo os julgamentos sobre o marco temporal da demarcação das terras indígenas e a descriminalização do porte de drogas para uso pessoal e do aborto.
“A PEC 50/2023, ao atribuir ao Congresso Nacional o poder de superação legislativa dos julgamentos realizados pelo Supremo Tribunal Federal, além de incidir em grave retrocesso histórico, por reproduzir o espírito autocrático que inspirou medida ditatorial semelhante imposta pela Carta Política do Estado Novo de Getúlio Vargas (art. 96, parágrafo único) , subverte o dogma da separação de poderes, eis que converte o Poder Legislativo em anômala (e inadmissível) instância de revisão das decisões ‘transitadas em julgado’ proferidas pelo STF!!!”, escreveu Celso de Mello em mensagem enviada ao GLOBO.
De acordo com o ministro aposentado, a Constituição determina que o STF tem a “última palavra” em relação ao texto constitucional. “Emendas à Constituição , quando ofendem categorias temáticas protegidas por cláusulas pétreas , qualificam-se como atos eivados do vício insanável da ilegitimidade constitucional!”, escreveu.
O ex-decano do STF afirma, contudo, acreditar que a PEC não será aprovada, porque o Congresso “compõe-se de parlamentares ilustres, de elevada competência, respeitabilidade e fidelidade aos grandes princípios que iluminam o texto da Constituição da República”.
Discussão sobre mandatos
O atual decano do STF, ministro Gilmar Mendes, criticou outra proposta que tem sido defendida por parlamentares: a adoção de mandatos para os ministros da Corte. Em publicação nas redes sociais, o ministro afirmou que, apesar do que dizem os defensores do projeto, o mais provável é que ele transforme o Supremo em “mais uma agência reguladora desvirtuada”.
“É comovente ver o esforço retórico feito para justificar a empreitada: sonham com as Cortes Constitucionais da Europa (contexto parlamentarista), entretanto o mais provável é que acordem com mais uma agência reguladora desvirtuada. Talvez seja esse o objetivo”, escreveu o ministro.
Nessa segunda-feira, o presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), voltou a defender a ideia, afirmando que a proposta era boa para o país.
— Considero que é uma tese interessante para o país. Muitos países adotam essa metodologia, muitos ministros do Supremo já defenderam isso. Há matéria legislativa nesse sentido aqui no Senado e acho que é um tema sobre o qual deveríamos nos debruçar e evoluir, não simplesmente aprovar de qualquer jeito. É bom para o Poder Judiciário, para a Suprema Corte, para o país — afirmou Pacheco.
Gilmar questionou ainda por que a Corte é a única instituição sobre o qual há propostas de reformas. O ministro destacou que o país passou há pouco por uma tentativa de golpe de estado.
“A pergunta essencial, todavia, continua a não ser formulada: após vivenciarmos uma tentativa de golpe de Estado, por que os pensamentos supostamente reformistas se dirigem apenas ao Supremo?”, questionou o decano do STF.
O Globo