Presidente do Senado se alinha a Bolsonaro
Foto: Geraldo Magela/Agência Senado
Com dificuldades na articulação política no Congresso, o presidente Jair Bolsonaro conta com a atuação do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), para evitar atrasos na aprovação do novo marco legal do saneamento, uma das prioridades do Palácio do Planalto para o ano e considerada essencial pela área econômica para destravar investimentos no setor. O senador, que é próximo do ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, tem atuado nos bastidores como um “avalista” de projetos do governo.
Na avaliação do Planalto, Alcolumbre está mais alinhado às pautas de interesse do Executivo do que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), visto como um político com agenda própria. Apesar de apoiar as propostas econômicas de Bolsonaro e de ter sido chamado até de “primeiro-ministro” durante a tramitação da reforma da Previdência, Maia com frequência faz críticas ao governo e à relação do presidente com o Congresso.
No caso do saneamento, a estratégia de Alcolumbre é costurar um acordo para que o texto seja analisado no Senado logo na volta do recesso parlamentar, em fevereiro, e encaminhado diretamente para sanção presidencial. “Devemos concluir a votação do saneamento até a primeira quinzena de março”, disse o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), em sintonia com o presidente da Casa.
O projeto foi aprovado pela Câmara no ano passado e é tratado no governo como prioridade, ao lado do pacote do ministro da Economia, Paulo Guedes. Como o Estado mostrou no domingo, 12, empresários chineses estão com olhos voltados no setor de saneamento, mas aguardam a aprovação do novo marco legal para investir. A proposta abre caminho para a privatização de estatais, que, segundo dados do governo, podem valer R$ 139 bilhões.
O grupo China Railway Construction Corporation, um dos maiores em infraestrutura, já está em conversas para comprar uma parte da Sabesp, companhia de tratamento de água e esgoto em São Paulo.
O acordo previsto por Alcolumbre, e apoiado pelo governo, envolve barrar alterações no mérito da proposta, o que, pelas regras do Congresso, obrigaria uma nova análise pelos deputados. Na Câmara, o projeto só passou após um acerto com parlamentares do Nordeste para aumentar a sobrevida dos contratos assinados entre prefeituras e estatais sem licitação. A negociação, na época, contou com a participação do presidente do Senado.
Senadores aliados a governadores do Nordeste, mais resistentes à proposta, admitem apoiar o texto do jeito que passou na Câmara. “O relatório aprovado na Câmara está bem razoável e dá condição de as empresas dos Estados caminharem para uma privatização com mais valorização dos seus ativos”, afirmou o líder do PSD no Senado, Otto Alencar (BA), aliado do governador da Bahia, Rui Costa (PT).
O projeto prevê o fim dos chamados contratos de programa, assinados entre prefeituras e empresas estaduais sem licitação, e a substituição pelos contratos de concessão, permitindo participação da iniciativa privada.
O texto aprovado na Câmara autoriza a renovação dos contratos das empresas estatais por mais 30 anos, desde que o processo ocorra até março de 2022. O prazo foi uma condição colocado por governadores e parlamentares para apoiar a proposta.
O presidente da Comissão de Infraestrutura do Senado, Marcos Rogério (DEM-RO), afirmou que a estratégia de Alcolumbre não é a ideal. Rogério concorda com essa articulação, porém, pela importância do tema. “Impedir que o Senado faça ajuste não é o melhor caminho, mas espero que o texto esteja redondo, pronto, e que ajustes não sejam necessários”, afirmou. A comissão presidida por Rogério será a primeira a analisar a proposta na volta do recesso.
“Alcolumbre está muito próximo do presidente Bolsonaro, tem acentuado essa aproximação em várias agendas muito mais que o presidente da Câmara. Nós não concordamos e vamos tentar alterar o projeto”, disse líder da Rede no Senado, Randolfe Rodrigues (AP).
Esta não é a primeira vez que Alcolumbre atua como uma espécie de fiador de pautas do governo. Um dos exemplos foi a tentativa de tornar o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente Jair Bolsonaro, embaixador nos Estados Unidos. Apesar do esforço, o governo não conseguiu votos e o presidente da República recuou da indicação.
O movimento para chancelar uma proposta do governo sem alterá-la para evitar atrasos também foi usada no caso das mudanças nas aposentadorias dos militares. O Senado aprovou o projeto com o mesmo conteúdo da Câmara, garantindo uma reestruturação na carreira apoiada pelo presidente Jair Bolsonaro.
“Davi tem temas que são importantes para o País e tem feito esse esforço. Nas pautas estruturantes, ele terá um protagonismo em defesa do Brasil independente da ação política do governo”, disse Rogério. Para ele, a relação entre o Planalto e os parlamentares ficou “mais alinhada” pela articulação do presidente do Senado.
Como contrapartida, Alcolumbre foi atendido ao longo do ano passado na liberação de recursos para emendas parlamentares indicadas por eles e por aliados, além da nomeação para cargos na máquina pública, como no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).