Funai abre brecha a indicações políticas

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Foto: Jorge William/Agência O Globo

Entidades que atuam na defesa dos direitos das populações indígenas criticaram a mudança feita pela Fundação Nacional do Índio ( Funai ) nos critérios para a nomeação do coordenador-geral de índios isolados e de recente contato. Agora, o cargo poderá ser ocupado por qualquer pessoa de fora da administração pública, o que abre a possibilidade para indicações políticas. As entidades dizem que essa mudança fragiliza a proteção dos isolados.

A alteração foi publicada na edição desta quinta-feira (30) do Diário Oficial da União. A portaria assinada pelo presidente da Funai, Marcelo Xavier, muda o critério para a ocupação do cargo de coordenador-geral de índios isolados. Antes, o posto era uma Função Comissionada do Poder Executiva (FCPE), exclusivas a servidores públicos efetivos.

Agora, o cargo será do tipo Direção e Assessoramento Superior (DAS) de nível 4, que podem ser ocupados por pessoas sem vínculo efetivo com o serviço público.

Para o coordenador-executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Paulo Tupiniquim, a mudança é perigosa.

– Isso abre a possibilidade para a indicação política. Sabemos que o governo atual tem interesse nas terras em que há isolados. Essa mudança é muito perigosa para os índios. – afirmou Tupiniquim.

Beto Marubo, da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja), também criticou a mudança.

– Esse é mais um retrocesso na política indígena desse governo. Desde os anos 80, a coordenação de índios isolados vem sendo ocupada por pessoas extremamente qualificadas, geralmente do próprio quadro da Funai, que conhecem a situação e o funcionamento da instituição. Trazer alguém de fora é um risco. – afirmou Marubo.

A advogada do Instituto Socioambiental (ISA), Juliana Batista, disse que, apesar da mudança no critério de ocupação do cargo, ele precisa continuar a ser exercido por pessoas qualificadas.

– É importante que pessoas com conhecimento técnico adequado possam assumir funções tão qualificadas. – disse a advogada.

Desde o ano passado, a política de proteção aos índios isolados adotada pelo governo vem sendo colocada em xeque.

Índios isolados são aqueles que, voluntariamente ou não, não mantém contato com a sociedade envolvente. Eles são considerados os mais vulneráveis do país justamente por não estarem acostumados com a presença de não-índios, por não terem proteções imunológicas contra diversas doenças e por habitarem terras cobiçadas por caçadores, garimpeiros e madeireiros.

De acordo com a Funai, o Brasil tem 114 registros de índios isolados ou de recente contato. Desses, 28 já foram confirmados. Para defendê-los, a Funai criou 11 frentes que coordenam 19 bases, todas localizadas na floresta amazônica, em áreas de difícil acesso.

Em estados como o Amazonas, onde há diversos registros de índios isolados, a Justiça Federal teve que intervir e obrigar o estado a fornecer proteção para servidores da Funai que atuam na base de proteção localizada no Vale do Javari. A instalação foi alvo de diversos ataques a tiros.

No início de janeiro, O GLOBO revelou que o governo ignorou vetos sugeridos pela Funai ao projeto de lei que prevê a regulamentação da mineração em terras indígenas em que haja a presença de índios isolados. O projeto deve ser apresentado ao Congresso Nacional ainda neste ano.

Procurada, a Funai enviou uma nota classificando a mudança como um “procedimento comum necessário à organização interna de um órgão público”.

O Globo