Dallagnol faz incursões virtuais contra condenação

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Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

Às vésperas do julgamento que pode afastá-lo da coordenação da Lava Jato no Paraná, o procurador da República Deltan Dallagnol investiu em um périplo virtual: marcou audiências por videoconferência com integrantes do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) com a intenção de fazer uma defesa de sua atuação e garantir sua continuidade à frente da operação.

A CNN confirmou com integrantes do conselho e com interlocutores do procurador que Dallagnol marcou conversas com ao menos cinco conselheiros. As videoconferências começaram na última semana e terminam nesta segunda-feira (17), véspera da votação.

Nas conversas, de acordo com os conselheiros e pessoas próximas ao procurador, Dallagnol lembrou seu currículo no Ministério Público, fez uma defesa da operação Lava Jato e admitiu que erros podem ter sido cometidos ao longo dos últimos seis anos, mas que não justificam seu afastamento.

A um conselheiro, o procurador teria concordado que erros podem ter sido cometidos, mas ponderado que eles teriam sido resultados do ineditismo da operação e que a força-tarefa sempre respeitou direitos.

Dallagnol também teria dito que nunca quis interferir na eleição para a presidência do Senado Federal em 2019 e que falou como cidadão naquela ocasião — o episódio é objeto de um processo administrativo disciplinar no CNMP, a pedido do senador Renan Calheiros (MDB-AL).

Ele alega que publicações feitas pelo procurador em suas redes sociais à época teriam interferido na votação. Dallagnol defendeu voto aberto para presidente do Senado, o que, na avaliação do senador, atrapalhou sua candidatura — ele acabou perdendo para Davi Alcolumbre (DEM-AP). A este conselheiro, o procurador teria dito que, apesar de ter expressado sua opinião amparada na Constituição Federal, não faria de novo por causa da repercussão que o caso teve.

O chefe da Lava Jato no Paraná ainda teria afirmado que autoridades com foro por prerrogativa de função nunca foram investigadas pelos procuradores da sua força-tarefa. As suspeitas de que autoridades com foro perante o Supremo Tribunal Federal (STF) estavam sendo investigadas são um dos motivos que pesaram na queda de braço entre a força-tarefa e a cúpula da Procuradoria-Geral da República.

Um conselheiro, que aguardava a conversa com o procurador, disse acreditar que Dallagnol pretende abordar sobre a imparcialidade de sua atuação e sua independência funcional a favor da sociedade. Este integrante do conselho avalia que o procurador está isolado.

O pedido de remoção de Dallagnol, feito pela senadora Kátia Abreu (PP-TO), usa como principal argumento contra o procurador a tentativa de a força-tarefa criar uma fundação para administrar parte de recursos que ficariam no Brasil a partir de um acordo que a Petrobras firmou com os Estados Unidos para indenizar acionistas lesados pelo esquema de corrupção na companhia.

A senadora afirma ter por objetivo “essencialmente resguardar as condições de atuação minimamente isenta do Ministério Público” e, consequentemente, garantir a “credibilidade institucional”. A parlamentar alega ainda que a remoção do procurador evitaria questionamentos quanto à imparcialidade do MPF.

A defesa do procurador pediu ao STF na última segunda-feira (10) a suspensão do julgamento no CNMP. Os advogados alegam que, se o pedido não for atendido, Dallagnol estará sujeito a um julgamento sobre fatos já repelidos pela Corregedoria-Geral do Ministério Público Federal e pelo próprio CNMP. Ou, ainda segundo a defesa, sobre fatos que foram trazidos uma semana antes do julgamento, sem o devido contraditório e sem que tenha o direito de produzir provas em sua defesa

O CNMP é composto por 14 integrantes, mas o colegiado está desfalcado esperando o Senado analisar três indicações que já foram aprovadas pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e que aguardam aval no Plenário. As vagas são referentes ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, ao Ministério Público Estadual e ao STF.

Seis conselheiros conversaram com a CNN sob a condição de anonimato. A maioria avalia que a ausência de dois representantes do MP não influenciará no resultado da votação. Um deles pondera que não é possível saber como os dois representantes votariam caso estivessem presentes, mas considera que poderia haver uma “tendência corporativista”, o que, eventualmente, contabilizaria votos favoráveis a Dallagnol.

Um sexto conselheiro acredita que as cadeiras vazias farão diferença na hora da votação. Para ele, apesar de o chefe da Lava Jato no Paraná ser uma “figura polêmica”, representantes do MP têm o conhecimento de como funcionam os trabalhos nas instituições das quais fazem parte e perante o Judiciário. Isso, na avaliação deste conselheiro, aumentaria as chances do procurador no colegiado.

Já um interlocutor de Dallagnol que falou à CNN em caráter reservado, avalia que a ausência de conselheiros representando o MP impacta na análise do processo do procurador no órgão. Para ele, os dois representantes poderiam votar a favor dele e aumentar as chances de vitória.

Outra pessoa próxima a Dallagnol considera que a experiência como membro do MP promove uma espécie de empatia com as dificuldades de conduzir uma operação do porte da Lava Jato, o que se traduziria em votos favoráveis ao chefe da operação.

A ausência de três conselheiros levanta ainda uma discussão com relação a quantos votos formam maioria no colegiado. Uma ala considera que é preciso basear-se nas 14 cadeiras originais. Neste caso, oito votos formariam maioria absoluta.

Outra ala entende que deve-se levar em conta apenas as cadeiras ocupadas, que atualmente são onze. Assim, a maioria seria de seis votos. O entorno de Dallagnol discorda desse entendimento.

Nos corredores do conselho, alguns integrantes falam em já haver maioria — de oito votos — para afastar o procurador da chefia da Lava Jato no Paraná. Interlocutores de Dallagnol contabilizam, reservadamente, ao menos seis votos pelo afastamento do coordenador da operação.

Antes mesmo da sessão, a defesa já estuda recorrer caso o procurador seja afastado após uma eventual derrota por maioria de seis votos.

Fala-se ainda na possibilidade de um pedido de vista de algum conselheiro, ou seja, mais tempo para analisar o caso, o que adiaria o julgamento do processo contra Dallagnol. A defesa do procurador ainda mantém esperança em uma decisão do ministro Celso de Mello, relator do pedido de suspensão do julgamento, no STF, antes da sessão de terça.

Em nota divulgada na quinta-feira (13), 25 procuradores que integram ou já fizeram parte da Lava Jato no Paraná saíram em defesa de Dallagnol, que, segundo eles, tem “atuação correta, dedicada e corajosa”.

Os investigadores acreditam que o que está em discussão na votação não são as atitudes de Dallagnol, mas “o futuro da Lava Jato, da causa anticorrupção e das garantias constitucionais da independência funcional e da inamovibilidade de membros do Ministério Público”.

“Caso o CNMP decida, com base nas representações em julgamento no dia 18 de agosto, pela remoção de ofício de Deltan Dallagnol, serão abalados o direito constitucional à livre manifestação e expressão, bem como as garantias da independência funcional e da inamovibilidade, que, diga-se, existem para a defesa da sociedade”, avaliam os colegas do chefe da Lava Jato no Paraná.

Também na quinta, um grupo de 13 senadores, conhecido como Muda Senado, pediu que o conselheiro Fernando Bandeira de Mello Filho, relator do pedido de afastamento de Dallagnol no CNMP, fosse declarado suspeito.

Bandeira, um dos mais críticos ao modo com que investigadores da Lava Jato conduzem as apurações, é secretário-geral da Mesa do Senado e foi chefe de gabinete de Renan Calheiros na presidência do Senado. O senador é alvo da operação e um dos que mais questiona os métodos dos procuradores.

Em novembro do ano passado, o procurador foi punido pelo CNMP com advertência por ofender ministros do STF. A sanção é a menor que pode ser aplicada a integrantes do MP e costuma ser adotada em caso de negligência no exercício das funções.

Apesar de uma punição leve, ela representa uma mancha no currículo, uma vez que o histórico disciplinar é levado em consideração pelo Conselho Superior do Ministério Público Federal em uma eventual promoção por merecimento, por exemplo.

Naquela ocasião, Dallagnol foi pessoalmente a Brasília e fez sua defesa aos conselheiros em meio a ataques de condenados da Lava Jato, políticos e integrantes do Judiciário após a publicação de reportagens da Vaza Jato, quando autoridades — Dallagnol entre elas — tiveram seus celulares invadidos e mensagens roubadas por hackers.

CNN Brasil