Cena de PM agredindo moça ilustra situação da mulher no Brasil
Em tempos de estupro coletivo – mais uma praga de nossa cultura arcaica que ganha dimensão em tempos de ascensão do fascismo –, a opinião pública está sendo surpreendida por uma cena quase inacreditável.
Não faltam cenas de descontrole emocional de policiais militares pelas quais ele, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, é responsável. O que assusta mais, porém, é polícias militares abrigarem gente como os policiais do vídeo abaixo, que mostra policial usando um nível de força física contra uma mocinha magricela, de braços fininhos, que tira qualquer um do sério.
Salvo exceções de mulheres treinadas em artes marciais ou que sejam atletas preparadas, mulher não tem condições físicas de enfrentar uma luta corporal com qualquer homem, nem com um homem franzino. A questão é o potencial de força física entre homens e mulheres.
Em média, mulheres são 30% mais fracas que os homens. Na parte superior do corpo, a mulher tem 55,8% da força dos homens. Segundo Osmar de Oliveira, uma das autoridades brasileiras na Medicina do Esporte, enquanto o peso dos músculos dos homens atinge 40% do peso total do corpo, o das mulheres chega a 33%.
Os hormônios de cada gênero são responsáveis por essa diferença. Sabe-se que o desenvolvimento da força física está associado, no caso, ao hormônio masculino testosterona, que tem características anabólicas e androgênicas.
A mulher também produz testosterona, do contrário nem ficaria de pé. A produção desse hormônio no homem, porém, chega a 10 mg diária e, na mulher, não passa de 0,1 mg. O teste de feminilidade no controle antidoping adotado pelo COI (Comitê Olímpico Internacional) se baseia nisso.
Essa explicação pode parecer ociosa para pessoas racionais, pois não são necessários esses dados todos para que alguém entenda que é covardia um homem agredir uma mulher porque a natureza não deu a elas recursos físicos que deu aos homens, já que, na aurora da humanidade, às mulheres era pedido que criassem filhos e aos homens que guerreassem. Porém, certos homens parecem não enxergar como é injusto usarem sua maior força física contra uma mulher e, desse modo, usam essa vantagem para dominá-las de diversas formas.
Na imagem no alto da página, a cena espanta pelo seu simbolismo imanente. Um homem treinado, cheio de músculos, usa golpes de imobilização que só seriam necessários contra um homem forte, mas que, contra essa menina, chegam a ser ridículos – é como usar uma espingarda para matar um canário.
O simbolismo dessa foto, porém, serve também para denunciar abusos de homens contra mulheres que não envolvem força física, mas a famigerada força cultural do patriarcado, que envolve leis e costumes.
Pessoas do círculo de relações sociais do autor destas mal traçadas linhas (homens e mulheres) usaram “argumentos” quase inacreditáveis para minimizar o ainda notório estupro coletivo contra uma menor de 16 anos no Rio de Janeiro.
Vários homens desdenharam de minha abordagem sobre o caso em tela. Um homem qualificou esse tipo de preocupação como “falta do que fazer”. Ou seja, uma adolescente é estuprada por um grupo de homens (pouco importando se um, cinco ou trinta) e este que escreve, pai de três mulheres e avô de três meninas, é acusado de “falta do que fazer” por se preocupar com essa ameaça a TODAS as mulheres, inclusive àquelas que também desdenharam de minhas preocupações.
Já uma mulher que até concordou comigo que o comportamento da garota ou as roupas que ela porventura usasse não justificariam o estupro, minimizou a importância do problema por achar que “esse tipo de coisa só acontece em comunidades carentes”.
Sem nenhum dado disponível, essa mulher a quem me refiro chegou a afirmar que casos de estupro como os da USP são raros, que entre a elite o problema seria “pequeno”.
É doloroso. Pior que um homem condescender com o estupro é uma mulher agir dessa forma, como se se julgasse imune a um tipo de ataque que, como se sabe, não poupa nem aquelas que não têm formas físicas determinadas pelo estereótipo contemporâneo de “beleza”.
Infelizmente, uma das maiores chagas sociais da humanidade é negros apoiarem opressão de negros, mulheres apoiarem opressão de mulheres e até homossexuais apoiarem opressão de homossexuais – no caso dos homossexuais a ocorrência é menor, mas existe.
Sim, o Brasil é atrasado culturalmente. O machismo se insere em um contexto muito mais amplo de visões deturpadas da vida em sociedade que acaba impondo sofrimento a minorias. E a onda fascista que se abateu sobre o país vêm aprofundando o problema.
Nesse aspecto, os abusos contra mulheres precisam ser punidos com dureza e a punição precisa receber ampla publicidade, até porque há homens que não consideram crime o uso da força para obter sexo, pois atribuem a resistência feminina a um jogo de sedução no qual preferem acreditar para não admitirem que aquela mulher não quer, por fim, fazer sexo com eles.
Em resumo: muitos homens preferem acreditar naquela velha história de que quando mulher diz “não”, na verdade quer dizer “talvez”, e quando diz “talvez”, na verdade quer dizer “sim”.
Essa é uma teoria inventada por homens que querem justificar abusos contra mulheres quando se recusam a fazer sexo com eles. Esses abusos começam com um beijo roubado em uma “balada” e podem progredir até estupro seguido de assassinato ou mutilação.
Parece difícil fazer boa parte dos homens entender que não quer dizer NÃO.
A cena do PM agredindo a mocinha pode ter até conotação de ataque sexual, é uma cena que chega a ser um discurso, uma tese. Essa é uma imagem da qual as mulheres que lutam por igualdade devem se apropriar.
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PS: Até agora, não surgiu uma única notícia sobre punição contra o covarde da foto no alto da página.