Rejeição a Doria em SP começou pelos mais pobres e chegou aos ricos
Após dez meses à frente da Prefeitura de São Paulo, a queda de popularidade de João Doria não surpreende. É uma cidade praticamente impossível de administrar sem desgaste. A dívida pública monumental dificulta o trabalho de qualquer prefeito. Foi construída, primordialmente, pelas gestões Jânio Quadros (1986-1989) e Paulo Maluf (1994-1997).
O processo de desidratação de Doria, porém, está sendo mais lento que o das prefeitas e do prefeito petistas porque o tucano não tem contra si a mídia antipetista que infernizou Erundina, Marta e Haddad do primeiro ao último dia de seus mandatos, apesar de terem governado muito melhor que os prefeitos de direita.
Segundo informa o instituto Datafolha, o processo eleitoral que culminou com a vitória do tucano no ano passado começou pelo eleitorado mais rico e escolarizado da cidade para, só na véspera do pleito, alcançar estratos mais carentes na periferia, especialmente na zona leste.
A queda de sua popularidade noticiada no último domingo, porém, apresenta movimento inverso – já tinha sido detectada como tendência desde abril entre os de menor renda e de extremos da cidade, mas começa hoje a se manifestar entre os mais ricos e escolarizados.
O fenômeno é inversamente parecido com o da eleição presidencial de 2006, quando as classes sociais mais pobres empurraram as classes mais ricas na direção de Lula; agora, os pobres empurram os mais ricos, só que é contra e não a favor.
Contra Doria, claro.
Na área da zona leste que agrega distritos como Itaquera, São Miguel, Aricanduva e Cidade Líder, a aprovação a Doria já consolidava variação negativa de 12 pontos percentuais até o mês de junho, segundo o Datafolha. Na região norte mais distante, que reúne bairros como Perus, Brasilândia e Pirituba, a queda consolidada também chegava a dez pontos no mesmo período.
No centro expandido, porém, a rejeição a Doria só se tornou expressiva agora, depois de dez meses de gestão.
Como há alta correlação entre o grau de escolaridade e renda com os bairros onde os entrevistados moram, o padrão de prejuízo à imagem do prefeito se repete a partir dos menos escolarizados e com menor renda até chegar, AGORA, aos que têm nível superior e que ganham mais de dez salários mínimos.
Nesses dois estratos, nos últimos quatro meses a aprovação a Doria caiu 15 e 8 pontos, respectivamente.
Outra informação do instituto de pesquisa é bastante compreensível. Doria continua sendo muito pior avaliado entre os mais pobres, segmento dos que recebem até dois salários mínimos de renda familiar. A taxa de reprovação nos estratos inferiores da pirâmide social supera a média na população em mais de dez pontos percentuais.
Por regiões, a avaliação positiva é mais alta nos bairros “nobres” da zona oeste, como Perdizes, Itaim Bibi, Jardim Paulista e Morumbi e na área mais rica da zona sul, que agrega bairros igualmente “nobres” como Vila Mariana, Ipiranga e Moema.
As principais razões para a queda de popularidade de Doria são a crescente e justificadíssima percepção dos paulistanos de que ele frustra expectativas que seu governo havia levantado e causa a sensação de que se preocupa mais consigo do que com a cidade por se meter numa odisseia de viagens de campanha eleitoral antecipada a presidente da República.
Como os estratos mais ricos e escolarizados dos paulistanos não percebem tão facilmente fato tão claro quanto a campanha eleitoral antecipada do prefeito quanto os mais pobres, pode-se dizer que, apesar de mais ricos e instruídos, esses paulistanos que não enxergam a realidade agem de forma infantil por não quererem “dar o braço a torcer”.
A campanha eleitoral antecipada de Doria é escandalosa, descarada, só não vê quem é estúpido ou intelectualmente desonesto, o que também é burrice porque um prefeito que abandona sua administração de olho nos próprios interesses políticos jamais será um bom gestor em cargo algum.
Quanto ao primeiro aspecto, nota-se um aumento importante, de 11 pontos percentuais, na taxa dos que dizem que o prefeito fez menos pela cidade do que esperavam. O índice vai se aproximando do percentual elevado de paulistanos que não enxergam melhorias no seu bairro já há algum tempo.
Seja como for, aumenta diariamente em todos os estratos sociais da capital paulista a ideia de que o prefeito viaja mais do que deveria fazendo campanha eleitoral e isso pode trazer mais prejuízos do que benefícios para o município.
Seria de esperar que os mais ricos e escolarizados enxergassem antes um fato que está à vista de todos, mas está sendo o contrário. Contudo, o que importa é que as camadas populares da cidade enxerguem os fatos porque são elas que elegem os prefeitos. Os mais ricos, residentes dos bairros “nobres”, são um contingente inexpressivo do eleitorado paulistano.