Adraike, Radarde ou Alade – o povo vai conhecendo Haddad
“Não sei o nome não, mas estou grudado em quem Lula mandar. Ele é o filho de Lula, né? Escutei dizer que era”, pergunta o aposentado José Paulino Filho, 75, após ser informado pelo repórter que Fernando Haddad (PT) é o substituto do líder petista na disputa à Presidência.
Em Solidão, Quixaba e Calumbi, três cidades do sertão pernambucano onde, em 2006, Lula teve índice de votação em torno de 90%, Haddad é um número.
Mesmo oficializado desde o dia 11 de setembro, muita gente não sabe o nome, quem ele é, quais cargos exerceu e nem de onde veio. Alguns viram “passar no repórter”, mas não lembram muito bem.
No coração do lulismo, que se espalha por outras cidades do sertão nordestino,o grau de desconhecimento em relação a Fernando Haddad é exatamente do mesmo tamanho da disposição para votar nele.
Entre os mais pobres, faixa que representa a base do eleitorado lulista, onde o petista mais cresceu segundo as últimas pesquisas, uma minoria sabe o primeiro nome. O sobrenome difícil, “que a língua não consegue dizer”, ganha variações: Adraike, Adauto, Andrade, Alade e Radarde.
A embalagem publicitária do “Haddad é Lula e Lula é Haddad” é a mais visível tradução do sertão. A resposta mais frequente e veloz, quando questionados em quem vão votar, é uma só: Lula.
A efetiva transferência de votos, sobretudo no Nordeste, é resumida pelo agricultor Severino Marques da Costa, 52. “Não precisa conhecer esse aí do nome em inglês. Quando a gente apertar o número de Lula na urna, aparece na foto. Aí eu falo: ‘prazer, Adraike’.”
Severino tem cinco filhos. Fala sem parar. Ele faz uma conta simples. “Como era a minha vida quando Lula era presidente? Ah! É o que basta para eu votar nesse aí”, explica.
Mora em Calumbi, uma cidadezinha com pouco mais de 6.000 habitantes. Na última eleição que disputou, Lula teve 91,46% dos votos de lá.
Em poucos minutos de conversa, na frente da casa de Severino, forma-se uma roda para falar sobre a eleição. “Eles querem saber em quem a gente vai votar, comadre. Chegue mais e fale aqui com os moços”, diz empolgado, como quem já espera a resposta.
“Ave Maria. Vou votar em Lula”, responde ligeiro Maria Francisca Pereira, 61. Ao ser lembrada de que o ex-presidente não é candidato, emenda. “Não importa. Vou votar no número dele. Estamos vivos. Como alguém daqui pode não votar em quem Lula mandar?”, questiona.
É gente que vive com muito pouco, quase nada, e precisa tirar parte do valor do bolsa família para comprar água.
“É como todo mundo diz aqui. A gente vota nesse pé de planta, numa cachorra e até num jumento. Não é Lula que está mandando? Pronto. Se deixarem, eu vou ficar no lugar dele lá na prisão”, completa Wilson Arailton da Silva, 31.
O Nordeste, conforme pesquisa Datafolha divulgada na quinta (20), é a única região em que mais da metade dos eleitores (53%) diz que o apoio de Lula seria determinante na escolha do candidato.
Entres os estados pesquisados, Pernambuco é o único em que Haddad aparece na frente de Jair Bolsonaro (PSL).
“Vou votar nesse aí. Tô com o papelzinho dele, mas não sei quem é não. É muito bonito, mas Lula é mais lindo”, brinca Abelardo da Silva Viana, 32.
O agricultor Patrocínio Alves Diniz, 68, que vive do que planta em Calumbi, respira fundo e diz: “Lula cometeu um erro muito grande: colocar Dilma. Mas vou votar no candidato dele mesmo assim”.
As faixas etárias e de renda mais influenciadas pelo apoio de Lula, conforme o Datafolha, também são as que menos sabem que Haddad é o seu nome na disputa.
Entre os indecisos, 60% dizem que podem votar —sendo que 45% votariam com certeza— em um nome indicado por Lula. No mesmo grupo, no entanto, 68% ainda não sabem quem o petista apoia em 2018.
Em Quixaba, onde Lula teve 91,94% dos votos em 2006, a resposta em relação a Haddad é quase sempre a mesma.
A aposentada Antônia Patrício de Lima, 63 anos e 11 filhos, não sabe dizer quem é o candidato do PT, mas não tem a mínima dúvida dos botões que vai apertar em 7 de outubro. Aponta para a cisterna do lado de fora de casa para indicar a resposta sobre seu voto.
“Tô lembrada não. Como é mesmo o nome? Acho que vi uma vez passar no repórter. Mas, olhe, Deus é um só. Primeiramente Deus e depois Lula. Não, não. Troque aí. Os dois empatados. Lula e Deus”, finaliza a conversa.
“É que minha língua não consegue dizer. É Fernando Radarde, sei lá como diz o nome dele, é do partido de Lula. Só vou saber de alguma coisa dele depois que ele ganhar. Aí a gente vai ter conhecimento”, diz Expedito Porfírio de Lima, 44, vaqueiro em Quixaba.
Numa mesa de um restaurante em Solidão, onde o líder petista teve 88,5% dos votos na última vez que disputou a eleição, o agricultor José de Jesus Barbosa, 25, começa dizendo que vai votar em Lula.
“Lula não é nem candidato. Vocês falando de política aí com os meninos e não sabem de nada. Sabem nem quem é candidato”, reclama o dono do estabelecimento.
“Interessa não. Como é mesmo o nome dele? Desse candidato aí?”, pergunta ao vaqueiro Ednaldo Ribeiro da Silva, 39, que divide um copo de cachaça com José de Jesus na mesma mesa após uma manhã de trabalho pesado na roça. “É Adauto. Fernando Adauto”, responde. “Pronto. É isso. É Lula”, repete algumas vezes.
Perto de lá, num sítio da Zona Rural de Quixaba, mãe e filha discutem sobre o voto para presidente. “Eu não posso negar o que Lula fez por aqui não. Mas erraram muito. Vou votar nesse Haddad aí não. Estou indecisa, pensei em votar em Bolsonaro”, diz Rosângela Maria Ferreira, 29, enquanto lava alface na cozinha.
Sentada numa mesa, a mãe, Maria do Socorro, 54, já interrompe. “Não fale uma coisa dessas. É Lula um milhão de vezes. Não conheço o moço que vai ser o candidato, mas ele vai soltar Lula. Não sei de nada, mas estamos com ele. Minha filha, você sabe que o pobre nunca teve o que comer aqui”, falou. A neta de oito anos retruca: “Lula nada. É Bolsonaro”. A avó reclama: “Pare com isso, menina”.