Golpistas picharam Palácios com frases literais de Bolsonaro
A tomada das sedes dos três poderes em Brasília, no dia 8 de janeiro, por uma horda radical seguiu um roteiro de ideias disseminadas pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ao longo de mais de cinco meses. Os gritos de guerra, as pichações e as vestimentas dos golpistas que destruíram os prédios públicos ecoaram a voz da mentoria de Bolsonaro, que em julho abriu nova ofensiva para estimular a base radical a intensificar investidas contra as instituições. O Estadão analisou mais de 30 horas de vídeos gravados e divulgados pelos extremistas no domingo e encontrou, durante os ataques, reproduções literais de mensagens e ideias propagadas pelo ex-presidente.
O material disponível nas redes demonstra que o discurso de Bolsonaro do dia 24 de julho na convenção do PL foi o estopim da marcha sequencial que resultou nas invasões e destruições de áreas do Palácio do Planalto, do Congresso e do Supremo Tribunal Federal. Naquele dia, o então presidente se lançou à reeleição classificando os apoiadores como um “exército” e os motivando a um juramento: “Repitam aí: eu juro dar minha vida pela minha liberdade”, pediu no que todos repetiram em coro. “Mais uma vez…”, pediu novamente insuflando que todos falassem ainda mais alto.
Da convenção do PL aos atos de violência do último domingo, um período de cinco meses, Bolsonaro repetiu um roteiro de como questionar o processo eleitoral, agenda que viria a permear a sanha golpista nas ruas. As imagens mostram que teve o efeito de inflamar gradualmente a militância radical.
“Se eu não for eleito com 60% dos votos no primeiro, algo de errado ocorreu no TSE”, disse, ao SBT, em 19 de setembro. A narrativa do ex-presidente foi ecoada no dia 8, durante a tentativa de golpe. “Fomos roubados, fomos roubados descaradamente”, disse Fabrizio Cisneros, que invadiu o STF usando um boné com o nome do ex-presidente.
Bolsonaro passou para o segundo turno das eleições em desvantagem. Às vésperas dessa rodada do pleito, surgiu com novas denúncias sem lastro contra o TSE. O ataque apontava fraudes em inserções da propaganda eleitoral em rádios. Não era verdade. Em muitos casos, a própria campanha de Bolsonaro deixou de enviar os programetes no período correto. “Realmente é um enorme desequilíbrio no tocante às inserções e, obviamente, interfere na quantidade de votos no final da linha”, disse.
Nos atos de destruição de domingo passado, o TSE apareceu nos discursos e a versão falsa de “fraude” foi gatilho incentivador dos ataques. Extremistas penduraram uma faixa com a mensagem “Queremos eleições livres, auditáveis e transparentes”, no segundo andar do Palácio do Planalto.
Com a derrota, Bolsonaro mergulhou num silêncio e se isolou de aliados. Logo depois da eleição, no dia 2 de novembro, os apoiadores do ex-presidente ficaram mobilizados em acampamentos em frente a quartéis do Exército, atraindo caravanas para Brasília. Recluso, Bolsonaro não reprovou a veia golpista, o que foi interpretado por apoiadores radicais como incentivo. Os acampamentos cresceram, houve bloqueios em estradas e ameaça de fechamento de empresas.
No dia 9 de dezembro, Bolsonaro rompeu o silêncio com seus apoiadores e saiu para falar com simpatizantes que se deslocaram do Quartel General ao Palácio da Alvorada. “Quem decide o meu futuro, para onde eu vou, são vocês. Quem decide para onde vão as Forças Armadas são vocês, quem decide para onde vão a Câmara e o Senado são vocês também”, disse Bolsonaro.