Estadão canta vitória muito cedo?

Enquete

No último domingo, o Estadão publicou editorial elogioso à presidenta Dilma e atribui a ela o que considera uma vitória da direita sobre a esquerda em seu governo. Sob o título ”A autoridade de Dilma”, o editorial afirma que “(…) a presidente Dilma Rousseff (…) avalizou a decisão da ministra da Cultura, Ana de Hollanda, que cancelou a indicação de Emir Sader (…)” para a Fundação Casa de Rui Barbosa.

A vitória que o jornal mais conservador do país “canta” em prosa, porém, não se resume à demissão de Sader, explicada como decorrente de entrevista de fato desastrada que ele concedeu à Folha de São Paulo e na qual insultou sua superior hierárquica, a ministra da Cultura, Ana de Hollanda, irmã do cantor e compositor Chico Buarque de Hollanda.

Fatores subjetivos concedem alguma razão à comemoração do jornal paulista. Se Sader insultou a ministra dizendo-a “autista”, tendo sido supostamente demitido por isso, o chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, general José Elito Carvalho, insultou a todos os brasileiros no início de janeiro declarando que “Não há motivo para vergonha no fato de o país ter desaparecidos políticos”. E nem por isso foi demitido.

Todavia, não é só aí que reside a comemoração da família Mesquita. Deve-se, também, ao suposto abortamento dos planos de Sader de “converter a instituição [Casa de Rui Barbosa] em centro de debates” e de levar para lá “intelectuais  como Marilena Chauí, Leonardo Boff, Eduardo Galeano e Slavoj Zizek”, além de promover “seminários para discutir temas contemporâneos, com foco no Brasil de Lula“.

Diz o editorial que tais planos de Sader  “foram vistos como uma agenda paralela à do Ministério da Cultura” por “vários escritores e artistas”. Por alguma razão, o texto evita dar nomes. Todavia, afirma que acusaram o filósofo paulistano de “pretender aparelhar ideologicamente a Fundação Casa de Rui Barbosa e de desvirtuar suas funções, substituindo as linhas de pesquisa por (…) proselitismo político-ideológico”.

Não é difícil imaginar quem sejam esses “escritores e artistas” aos quais o Estadão se refere…

O jornal conclui dedicando a Dilma o desejável predicado “capacidade de comando”, mesmo que nunca tenha acusado sua falta na não-demissão do general sem vergonha de integrar uma instituição que produziu desaparecidos políticos que freqüentemente eram pouco mais do que adolescentes cheios de ideais de liberdade, igualdade e fraternidade e que, por acalentar tais ideais, sumiram da face da Terra como que por “mágica”.

De qualquer forma, talvez seja cedo para o Estadão comemorar. Para o lugar de Sader foi indicado o sociólogo Wanderley Guilherme dos Santos, considerado próximo ao PT por alguns, apesar de não se ter notícia de desentendimentos seus com a mídia ou com partidos, o que não era o caso daquele que irá substituir na Fundação Casa de Rui Barbosa.

Nos últimos anos, Sader tornou-se inimigo visceral da mídia ao acusar o então senador por Santa Catarina do antigo PFL (hoje Democratas) Jorge Konder Bornhausen de racismo por ter dito que a “raça” petista seria extinta após o escândalo do “mensalão”, o que lhe valeu condenação preliminar (em primeira instância) à prisão em 2006.

Dentro de algum tempo, no entanto, ficará fácil saber se a comemoração do jornal da família Mesquita fazia sentido ou não. Se o historicamente avesso a confrontos políticos Wanderley Guilherme dos Santos der à Fundação Casa de Rui Barbosa o viés que o Estadão diz ser “político-ideológico”, por exemplo levando para lá uma Marilena Chauí, outro grande desafeto da imprensa de direita, a vitória do jornal terá sido, pelo menos, incompleta.