TJDF condena Marcia Tiburi por criticar deputado que propôs legalizar nazismo

Todos os posts, Últimas notícias

A filósofa Marcia Tiburi, no Rio de Janeiro, e o deputado Kim Kataguiri, em São Paulo – Mauro Pimentel – 28.ago.2018/AFP e Karime Xavier – 5.nov.2022/ Folhapress

A filósofa Marcia Tiburi chama de “fascista”o Judiciário brasileiro ao comentar uma decisão a favor do deputado federal Kim Kataguiri (União Brasil-SP), proferida pela Segunda Turma Recursal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios na quarta-feira (22).

O colegiado decidiu que a filósofa deve pagar R$ 5.000 por danos morais que teriam sido causados quando Tiburi acusou o parlamentar de fazer apologia do nazismo. “O que a Câmara dos Deputados fará com o deputado Kim Kataguiri por fazer apologia do nazismo?”, publicou ela no Twitter, à época.

O episódio ocorreu em fevereiro do ano passado. Na ocasião, o integrante do MBL participava do Flow Podcast quando o então apresentador Monark defendeu o direito de existência de um partido nazista —ele acabou desligado do canal.

A deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP), uma das convidadas da atração, rebateu e questionou se Kim achava errado a Alemanha ter criminalizado o nazismo. O deputado respondeu que sim.

Apesar da declaração, em primeira instância a juíza Oriana Piske concluiu que o deputado não se manifestou “favorável à abominável ideologia”, ao contrário do que teria sugerido Tiburi, e que a filósofa “incorreu em equívoca avaliação do seu conteúdo”.

Marcia Tirubi recorreu, mas a Segunda Turma Recursal da corte, ao julgar o caso nesta quarta-feira (22), manteve a decisão de primeira instância. Ainda é possível recorrer.

“O que caracteriza o dano moral, quando há crítica à pessoa que desempenha um cargo público, em especial, os políticos, é o abuso do direito de criticar. No caso, a parte ré [Tiburi] nominou o autor de nazista”, afirmou o juiz Arnaldo Corrêa Silva, relator do processo.

O magistrado ainda afirmou que, ao analisar a participação de Kim no Flow Podcast, verificou que não houve apologia do nazismo e que Kim mostrou-se “veementemente contra” o regime quando defendeu que cidadãos tenham acesso a “livros e registros históricos provenientes do nazismo” para se informar.

“É senso comum que no Brasil hoje vive-se a intolerância com o pensamento e palavras daqueles que possuem posicionamento divergente. Banalizou-se discursos de ódio, sendo comum denominar as pessoas de nazistas, fascistas, comunistas e etc”, declarou o juiz.

“Frisa-se que esses termos muitas vezes são proferidos sem que se saiba o real significado de cada um desses adjetivos”, seguiu o magistrado, cujo voto foi acompanhado por unanimidade. “É grave a conduta de imputar a pecha de nazista a alguém.”

Kim pedia à Justiça que a escritora fosse condenada a pagar uma indenização no valor de 40 salários mínimos por danos morais, o que não foi atendido.

Procurada pela coluna, Tiburi diz que o MBL usa a sua imagem para tentar se reposicionar politicamente e que a decisão judicial é injusta e fruto de uma suposta “mistificação” . “Ninguém que seja a favor da democracia pode defender partidos nazistas ou fascistas”, afirma a filósofa.

“Ele defendeu um partido nazista, e o que eu apontei foi esse problema. Pode alguém defender o nazismo sem ser nazista? O nazismo é uma ideologia extremista de direita, ou seja, politicamente limítrofe, o que quer dizer que não suporta a democracia. Ou seja, onde há extremismo, não há democracia. Ninguém que esteja numa democracia pode defender extremismos”, segue.

Tiburi ainda cita conflitos que teve com o MBL em 2018, como quando um grupo de pessoas usou máscaras com o rosto de Kim durante um evento do qual participou, para afirmar que o grupo usa “a misoginia como tática de guerra”.

“Eles transformaram a minha vida num inferno”, afirma a filósofa. “Eu ter que pagar em dinheiro para quem me persegue há tanto tempo, é algo que explica o sistema da injustiça. E o fato de que grande parte do Judiciário é fascista e machista e certamente está adorando ajudar na perseguição”, completa.

No ano passado, após a repercussão negativa de sua participação no Flow Podcast, Kim Kataguiri pediu desculpas. “Eu errei. Eu disse algo que ofende a comunidade judaica. Que faz com que ela se sinta ameaçada”, disse em uma live.

Por causa do episódio, Kim também processou o ex-deputado Jean Wyllys e outras 16 pessoas por imputação de apologia ao nazismo. O ex-parlamentar chegou a ser condenado a pagar uma indenização de R$ 5.000.

Folha de São Paulo