Marinha condecora petistas e irrita militares
Foto: Ricardo Stuckert/PR
A concessão de medalhas da Ordem do Mérito Naval a líderes do governo Lula no Congresso vem provocando um rebuliço entre militares da ativa e da reserva e causando ruído na tropa no momento em que a cúpula do Planalto tenta uma acomodação com as Forças Armadas após os ataques golpistas do 8 de janeiro.
No dia 12 de julho, o deputado José Guimarães (PT-CE) e ao senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP) foram agraciados com a honraria no Clube Naval de Brasília, além de outros parlamentares da base e independentes. Eles receberam a insígnia no grau de Grande-Oficial, que os equipara a vice-almirantes da Marinha em cerimônias militares.
A entrega dos diplomas foi prestigiada por Lula e a primeira-dama, Janja, além do comandante da Marinha, Marcos Olsen.
Na mesma ocasião, também receberam a medalha 92 militares da Força, além de 12 ministros de Lula e até Kassio Nunes Marques, ministro do STF indicado por Jair Bolsonaro.
Mesmo assim, nas redes sociais e em portais ligados aos militares, críticos do governo Lula só falaram da homenagem a Guimarães e Randolfe em tom crítico.
No caso de Guimarães, líder do governo na Câmara, ainda lembraram do episódio em que um assessor dele foi preso no Aeroporto de Congonhas, em 2005, com US$ 100 mil dólares na cueca e R$ 209 mil em uma maleta. Guimarães foi inocentado no caso pela Justiça Federal do Ceará em 2021.
Um post de um perfil bolsonarista no X, antigo Twitter, repercutindo a condecoração de “José Guimarães, o do dinheiro na cueca”, foi reproduzido quase 1,5 mil vezes, com um alcance de 178 mil visualizações. “A que ponto as Forças chegaram”, escreveu um usuário da rede com um emoji de fezes.
Randolfe, por sua vez, se tornou alvo do bolsonarismo pela sua participação na CPI da Covid, que apurou a atuação do governo Bolsonaro na pandemia e foi instalada a partir de um requerimento apresentado por ele.
Segundo fontes do meio militar, a concessão das medalhas foi vista entre integrantes da ativa e da reserva alinhados ao bolsonarismo como “afronta” e colaborou para engrossar o caldo de insatisfações da ala que vê no comando das Forças Armadas “subserviência” ao governo Lula.
Procurada, a Marinha afirmou, em nota, que a admissão, promoção ou exclusão dos contemplados pela Ordem do Mérito Naval cabe ao comandante. A escolha é oficializada por Lula, na condição de presidente da República e Grão-Mestre da Ordem, no Diário Oficial da União.
A leva que incluiu Guimarães, Randolfe e ministros da Esplanada foi oficializada no Diário Oficial da União no dia 5 de junho e recebeu a insígnia um mês depois, em meio a gestos de aproximação entre o Palácio do Planalto e as Forças Armadas.
Como publicamos na última sexta-feira, setores militares têm demonstrado inquietação com um suposto desgaste da imagem das instituições, em especial do Exército, com o desenrolar da CPI mista do 8 de janeiro. A comissão está investigando o envolvimento de militares nos atentados, e a prisão do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid.
A medalha da Ordem do Mérito Naval, criada no governo Getúlio Vargas em 1934, visa prestigiar militares da Marinha que se destacaram em suas carreiras e, “excepcionalmente”, personalidades e instituições civis que tenham prestado relevantes serviços à Força. Só que a homenagem de políticos não é inédita e tampouco se restringe ao atual governo.
Na gestão anterior, Jair Bolsonaro agraciou, por exemplo, os governadores Wilson Witzel (PSC-RJ), Romeu Zema (Novo-MG), Ratinho Jr (PSD-PR) e Eduardo Leite (PSDB-RS) e Mauro Mendes (União-MT), além do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) e do procurador-geral da República, Augusto Aras, indicado ao cargo pelo então presidente.
Além de José Guimarães e Randolfe Rodrigues, também receberam a medalha o advogado-geral da União, Jorge Messias, o presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas, ambos cotados para a vaga de Rosa Weber no STF.
Ministros que foram ou são alvo da fritura do governo em meio às articulações para o embarque do Centrão no governo também receberam a insígnia. É o caso de Wellington Dias (Desenvolvimento Social), Luciana Santos (Ciência e Tecnologia) e Nísia Trindade (Saúde).
Completam a lista dos agraciados no Diário Oficial do dia 5 de junho os ministros Camilo Santana (Educação), Silvio Almeida (Direitos Humanos), Esther Dweck (Gestão), Renan Filho (Transportes), Waldez Góes (Integração e Desenvolvimento Regional) e Vinícius Carvalho (Controladoria-Geral da União).