Frota considera Bolsonaro sua maior decepção
Seis meses depois de assumir um gabinete na Câmara, Alexandre Frota está desiludido. O deputado do PSL, partido de Jair Bolsonaro, afirmou que sente “nojo” do bolsonarismo “xiita”, disse não ver qualquer articulação política do governo e defende João Doria no Palácio do Planalto em 2023: “Doria-ACM vai ser uma grande chapa presidencial”.
Em entrevista à coluna, Frota contou como foram seus dias como “bombeiro” entre os temperamentais Rodrigo Maia e Paulo Guedes, durante a reforma da Previdência, e interrompeu a conversa para mostrar um áudio enviado naquele momento por Guedes revelando que uma sugestão de Frota mudou a propaganda da reforma.
Leia a entrevista:
Há três meses, o senhor dizia que precisava de provas do rombo da Previdência antes de apoiar a reforma. Na semana passada o senhor estava distribuindo bandeirinhas no plenário a favor da proposta. O que mudou?
O que mudou é que, depois de tantas conversas com o Paulo Guedes e palestras com a equipe econômica, passei a apoiar a Previdência. Sobre as bandeirinhas, foi uma estratégia de marketing, já que a esquerda tinha camisas e faixas vermelhas. Pedi para um assessor comprar as bandeiras na 25 de Março. A esquerda ficou boquiaberta. Foi um show.
O centrão é mocinho ou vilão?
Eu não uso “centrão”. Eu os chamo de moderados. Não são nem mocinhos nem vilões. São equilibrados e buscam um entendimento que faça com que as pautas andem em prol da sociedade.
O presidente da comissão especial da reforma da Previdência, Marcelo Ramos, disse que, se dependesse do governo, a reforma da Previdência teria andado muito pouco. O senhor concorda?
Ele tem total razão. A Câmara fez o que o governo deveria ter feito. Não existe uma base montada pelo governo. Essa base foi montada pelos moderados, por nós que trabalhamos incansavelmente. O governo maltratou a Câmara.
Como é a articulação política do governo Bolsonaro?
A articulação com a Câmara não existe. Merecíamos um tratamento diferenciado. O governo se empenha muito pouco.
Que pessoas mais te decepcionaram?
Eu aprendi muito cedo na Câmara que você não tem muito tempo para se decepcionar com as pessoas. Mas quem mais me decepcionou, com toda a certeza, foi o Bolsonaro.
Que conselho o senhor daria a Jair Bolsonaro?
Bolsonaro precisa olhar um pouco para trás, para as coisas que ele prometeu. Quero que ele termine o mandato e acerte. Mais do que tudo, o Brasil precisa andar. Não estou mais preocupado com o que o Bolsonaro vai fazer ou não. Só não quero que ele erre.
O senhor atribui a aprovação da reforma a Rodrigo Maia?
Não posso ser leviano e esquecer do Paulo Guedes. Mas com certeza o Rodrigo Maia construiu tudo isso com muita sabedoria e calma, passando por cima de muitas críticas.
Como o senhor construiu uma relação com Paulo Guedes?
A gente se falava todo dia cedo. Me senti um privilegiado de ter trabalhado tão perto dele, um profissional incrível. Ele disponibilizou um técnico para ficar comigo e viu que eu estava ali para ajudar. Estudei, fui firmeza.
O senhor mediou negociações entre Maia e Guedes.
Foram momentos difíceis, por causa do temperamento das pessoas envolvidas. Muitas vezes reconstruímos o muro desmoronado. Me orgulho de ser amigo do Guedes e do Maia, ainda que eu tenha apagado muitos incêndios. Foi estilo bombeiro. (Neste momento, Frota mostra um áudio de Paulo Guedes, gravado para ser mostrado na entrevista à coluna: “O Alexandre Frota tem sido muito construtivo no apoio às reformas. Por sugestão dele, nós mudamos toda a comunicação do regime de capitalização para ‘poupança garantida’. Ele tem ajudado muito”.)
A reforma da Previdência aprovada pela Câmara foi “meia boca”, como atacaram muitos bolsonaristas?
Não concordo. A reforma atingiu números excelentes, como disse o Guedes. Bolsonaro afirmou que errou na reforma dos policiais e pediu que o Congresso consertasse, jogou em nossas costas. Os bolsonaristas radicais precisam ganhar uma eleição antes de criticar.
O senhor é alvo dos olavistas.
Recebo muitos ataques dos olavetes. Falar a verdade na cara deles incomoda. Até hoje eles só tinham ouvido eu esculachando o PT. Agora, quando encaro os aluninhos amestrados do Jim Jones da Virginia, ficam magoadinhos. Allan do Santos, Bernardo Küster, Cláudia Wild, nenhum ali vale nada. Não dependo dos olavetes para porra nenhuma. Não me deram um voto. Os bolsonaristas que não gostam de mim são xiitas. Me dão nojo. Atrás do computador é fácil. São iguais os petistas: fazem barulho, mas são cagões.
Eduardo Bolsonaro é o nome certo para ser embaixador do Brasil nos EUA?
Eu espero que ele vá para os Estados Unidos, que acerte e seja feliz. Que ele leve a Letícia “cartel” (Letícia Catelani, ex-diretora da Apex) , o Filipe Martins (assessor internacional da Presidência) e toda aquela corriola que anda com ele. Lamento muito por aqueles que estudaram anos e anos para a missão diplomática.
Fritar hambúrguer é currículo para embaixador?
Não, não é? E ele fritou hambúrguer numa lanchonete que não tem hambúrguer . Mas desse governo a gente pode esperar tudo.
A decisão de Dias Toffoli, de suspender investigações a pedido de Flávio Bolsonaro, foi para salvar o filho do presidente?
Achei a decisão do Toffoli tendenciosa. Nos últimos cinco anos, assisti à extrema-direita crucificando o Toffoli na maioria de suas decisões, pedindo sua cabeça. Agora estão em silêncio.
Onde está Queiroz?
É uma boa pergunta. Eu não faço ideia. Se alguém souber…
Flávio Bolsonaro ainda deve explicações?
Não sou eu que tenho de avaliar isso. Ele sabe da vida dele.
Marcelo Álvaro é investigado, mas segue ministro. Não é uma contradição ao governo que se elegeu prometendo não tolerar a corrupção?
É uma contradição. Por muito menos, outras pessoas saíram dos ministérios.
O que acha de Jair Bolsonaro?
Eu conheço dois Bolsonaros. O meu amigo, até o dia da eleição, e outro, presidente. Prefiro não falar mais.
E os filhos do presidente?
São problema do Bolsonaro.
Hamilton Mourão?
Gosto muito dele, mas desapareceu da frente de batalha.
Olavo de Carvalho?
Não tenho nenhum respeito por ele, não vale absolutamente nada. Tem feito muito mal ao governo.
Onyx Lorenzoni?
Poderia ter agido melhor. Não sei o que aconteceu com o Onyx, mas estou reconstruindo minha amizade com ele.
Ernesto Araújo?
Péssimo, tendencioso, ideológico, dissimulado. Um erro.
O PSL já se acertou? Há brigas internas o tempo todo.
O PSL está se acertando. São muitas cabeças diferentes num mesmo local. Mas me orgulho de fazer parte do PSL.
Joice Hasselmann e Carla Zambelli, suas colegas de partido e estado na Câmara, já fizeram as pazes?
Não, e nem farão. Zambelli é complicada da cabeça, bipolar, difícil de lidar. Cada hora está de um jeito. Não me meto na briga das duas, e ninguém se mete nas minhas.
Joice Hasselmann é uma boa líder do governo no Congresso?
Eu gosto muito do trabalho dela. Ela é criticada porque faz os acordos dela com o governo e depois quer passar para os deputados, e muitos não aceitam. É uma mulher determinada e poderia ser a prefeita de São Paulo pelo PSL.
Major Vitor Hugo é um bom líder do governo na Câmara?
No início foi difícil, nos desentendemos algumas vezes, mas fomos ficando amigos. Na Previdência, atuamos lado a lado. Está de parabéns.
A Justiça já pediu que seu salário de deputado fosse bloqueado, por causa de dívidas. Como lida com isso?
Eu tenho muitos processos, não é? Isso é normal. A gente precisa se defender.
O senhor ainda é visto como ex-ator pornô?
Não. Sou visto como um dos deputados que mais trabalham, que foi convidado para outros grandes partidos, como DEM e PSDB.
Como foram os convites?
O Rodrigo Maia me chamou para o DEM, e o João Doria para o PSDB. O DEM é o partido mais forte dentro da Câmara, dominou Casa Civil, Senado, Câmara e ministérios. Se fizerem a chapa Doria-ACM, vai ser uma grande chapa presidencial.
O senhor vai mudar de partido?
O PSL desde o início foi preterido pelo próprio governo e atravessa uma fase de divisão total. Fiquei feliz em saber que tenho portas abertas em outros partidos. Mas tenho gratidão a meus colegas do PSL.
Como vai a Cultura no governo Bolsonaro?
Não falo mais sobre Cultura. Tentei ajudar, me prometeram uma série de coisas que não aconteceram. Virei a página.
De O Globo