Ansiedade e depressão: os efeitos do governo Bolsonaro

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Foto: ­ MONTAGEM COM REPRODUÇÕES

A paciente chegou ao consultório da terapeuta aflita. Dizia ter perdido a fé na humanidade, no país, na própria psicanalista. Então levantou a questão essencial: “Isso é depressão ou é o clima político?”. Especialistas admitem que a psicologia individual é altamente influenciada pela realidade política.

Muitos se sentem insanos neste momento porque o Brasil e o mundo estão longe do que se convencionou chamar de são. As crises — política, econômica, ambiental, cultural — abalam o otimismo natural dos homens e a crença na bondade humana e no progresso.

O contexto de polarização e violência política — com as eleições passadas marcadas pelo atentado ao então candidato Jair Bolsonaro (PSL), a proliferação de notícias falsas pelo WhatsApp, rompimentos familiares e casos de agressões e assassinatos de oponentes políticos — levou à criação de um grupo chamado Escuta Sedes em São Paulo, voltado à população afetada pela crise política, atendida em rodas de conversa gratuitas e comandadas por psicanalistas. “O grupo foi criado em função de a gente perceber que havia, ali na altura do segundo semestre, do evento das eleições, o incremento da violência nas relações entre as pessoas”, disse Silvia Nogueira de Carvalho, membro do Departamento de Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae, referência na área de saúde mental.

Christian Dunker, psicanalista e professor da Universidade de São Paulo (USP), disse não se lembrar de tempos como os atuais. “Atendo há 30 anos, já assisti a outros momentos tensos. Mas nunca a política ocupou tanto espaço na vida das pessoas.” Para Dunker, o presidente Bolsonaro é um agente de ativação “das modalidades de sofrimento e de sintoma que já estão presentes” nas pessoas. “Ele torna mais agudo os conflitos familiares, de raça, de gênero, de classe”.

Outro fator é a precarização do trabalho e da renda, apontada pelo psiquiatra e psicanalista Nilson Sibemberg como fator de depressão e angústia. “As pessoas estão com um temor muito grande de perder aquilo que é seu sustento. Isso se traduz em mais depressão e mais angústia”, afirmou.

Segundo especialistas, um trauma nacional, assim como um pessoal, é tão desorientador quanto apavorante. Faz com que o conhecimento adquirido seja posto em xeque. Os terapeutas aconselham então que duas perguntas sejam respondidas na busca da cura: 1) Como integrar esta crise a nosso entendimento do mundo? 2) O que fazer agora?

Da Época