Guerra de números na Cinelândia e o que Juan Arias não entendeu
Antes de qualquer coisa, há que apontar um fato que não pode ficar sem explicação. Por volta das 19:00 hs. de terça-feira, 20 de setembro de 2011, o site de O Globo e o portal R7 divulgavam números absolutamente incompatíveis sobre o comparecimento de manifestantes à Cinelândia, no Rio, para protestar “contra a corrupção”.
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Site de O Globo
Site R7
Mais tarde, por volta das 19:30 hs., o blogueiro da Globo Ricardo Noblat divulgava um terceiro número.
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Blog do Noblat
O portal IG divulgou um quarto número.
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Site IG
Por último, na internet, o portal UOL aderiu ao número de Noblat.
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Site UOL
Todos os sites dizem que o número de manifestantes foi divulgado pela Polícia Militar.
Mas não ficou por aí. Por volta das 21 horas, o Programa Globo News em Pauta entrevistou o repórter Caco Barcelos, que esteve na Cinelândia e deu um quinto número: 3 mil manifestantes. Apesar disso, considerou o ato “uma decepção”.
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Barcelos tem razão. Conforme a mídia vinha anunciando, esperava-se um público incomensuravelmente maior. Abaixo, o portal Terra falava que o número esperado girava em torno de 25 mil pessoas.
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Site Terra
Esperava-se tanto porque mais de 30 mil pessoas prometeram aderir ao ato na página do Facebook em que foi divulgado e na qual se recebeu adesões. Isso porque o ato no Rio recebeu da grande imprensa brasileira toda divulgação que poderia, chegando alguns veículos a colocar seus jornalistas para convocar manifestantes.
No site do jornal O Globo, a informação de que os que organizaram o ato deste 20 de setembro na Cinelândia chegaram a ser entrevistados pelo veículo, que publicou a entrevista. A Globo News cobriu o ato e, antes de ocorrerem, foram mencionados em vários programas da emissora.
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Site de O Globo
No portal da Veja, um dos mais lidos do país, na manhã desta terça-feira o blogueiro Reinaldo Azevedo já anunciava o protesto e convocava manifestantes no melhor estilo deste blogueiro aqui, com a diferença de que aquele tem espaço em um dos maiores portais de jornalismo na internet e é um jornalista famoso.
Olhe, mas não veja.
Site da Veja
Quem tem razão? O Globo, o R7, o IG, o UOL ou Noblat? Qual, afinal, é a estimativa da Polícia Militar? Para quem entende do traçado, as imagens (sobretudo a do R7) permitem facilmente solucionar o problema. Basta calcular a área da praça em que estão os manifestantes e usar o critério dos especialistas sobre quantas pessoas cabem lá por metro quadrado.
Este blogueiro aposta na versão do R7.
Seja lá como for, se o critério for o dos números, o ato foi um fiasco. Se for político, não se tem muito mais a dizer. Nada do que se disse ali passou de meras platitudes e, conforme os jornalistas Ricardo Noblat e Caco Barcelos, foi um ato desanimado do qual políticos de partidos de oposição tentaram se apoderar.
Outros atos ocorreram em outras capitais, mas não se viu notícias sobre eles. Um desses atos foi em São Paulo. Até por volta das 21 horas de terça, não se viu menções ao público. Se saíram em algum lugar, foram bem discretas. Certamente não se viram atos dignos de mínima nota em outras partes do país.
No último sábado, o Movimento dos Sem Mídia promoveu no Masp, em São Paulo, um ato público de protesto contra a mídia. Reuniu 100 pessoas. Se a comparação for com o número do IG sobre este último ato na Cinelândia, com tanta divulgação, em termos numéricos, foi um fracasso.
Politicamente, o ato do MSM foi bem melhor. Pediu o marco regulatório das comunicações e denunciou que a mídia esconde os corruptores – fazendo, aí, uma proposta para combater TODA corrupção.
Independentemente dos números, porém, o que se percebe é aquilo que foi dito há meses neste blog e que o jornalista espanhol Juan Arias, que fundamentou essa campanha da grande imprensa “contra corrupção”, não entendeu: o brasileiro não está preocupado em protestar nem contra a mídia, nem contra o governo, nem contra os políticos em geral. E não só porque este país, à diferença da Espanha – e de vários outros países ricos –, vai muito bem, obrigado.
Há outra razão. A maioria deste povo sabe que a corrupção não é só “dos políticos”, mas do empresário que corrompe os políticos, do cidadão que dá propina ao guarda de trânsito, que compra DVD pirata, que suborna funcionário público de uma repartição para “agilizar” um processo e tudo mais que faz parte do cotidiano deste povo, nessa questão, e que todos conhecem.
Resta dizer que a única pauta que não desaparecerá, se não se falar mais dela, será a da democratização da comunicação no Brasil. Essa não sumirá porque não é idéia de um homem, de um grupo, mas uma necessidade do país: ter uma imprensa que, por exemplo, não esconda algumas manifestações e seja propagandista de outras. E que não manipule números.