Após 16 anos, risco-pais volta a ser problema para o Brasil
A complacência dos investidores com o Brasil chegou ao fim. Ou, como resumiu o banco americano JP Morgan em relatório sobre o país publicado nesta quinta-feira (7), o Brasil não está mais no Kansas.
A referência ao clássico “O Mágico de Oz”, em que a protagonista Dorothy é sugada de sua casa, no Kansas (EUA), por um tornado e atirada na desconhecida terra de Oz, não poderia sintetizar melhor as últimas semanas no mercado financeiro brasileiro.
Desde que o governo cedeu aos apelos dos caminhoneiros e empresários e decidiu intervir na elogiada política de repasse de preços praticada pela Petrobras, os investidores decidiram que era hora de rever o risco atribuído ao Brasil –para pior.
O CDS, termômetro do risco-país, atingiu 254,2 pontos nesta quinta, maior nível desde maio de 2017. O dólar, ativo ao qual investidores correm em busca de segurança, encostou em R$ 3,93, e a Bolsa fechou abaixo dos 74 mil pontos.
A perda de confiança no governo ocorre ao mesmo tempo de uma piora global do cenário para ativos emergentes e em meio a uma recuperação da economia americana que causou o fortalecimento do dólar em relação às principais divisas emergentes.
Preocupações com aumento do protecionismo e com conflitos geopolíticos também pesaram.
Nenhum desses fatores, porém, influenciou tanto a revisão do risco-país como a mudança no cenário eleitoral. A incerteza passou a dominar o horizonte desde que pesquisas passaram a mostrar um cenário eleitoral com dois pré-candidatos vistos como pouco reformistas.
Nem Jair Bolsonaro (PSL) nem Ciro Gomes (PDT) são vistos como favoráveis a aplicar as medidas necessárias para devolver o equilíbrio fiscal ao país.
No relatório divulgado nesta quinta (7), o JP Morgan coloca a incerteza sobre as eleições como fator de preocupação com a política econômica no médio prazo. “As condições externas e domésticas mudaram significativamente nos últimos meses”, afirmou o banco em relatório.
“O aperto das condições financeiras nos mercados emergentes afetou o Brasil em particular, provavelmente dados os desafios fiscais significativos do país, a incerteza em torno da política econômica após as eleições deste ano e um diferencial recorde baixo de juros [em relação aos Estados Unidos]”, diz o banco.
O JP estima em 50% a probabilidade de um resultado nas eleições que não agrade ao mercado.
Alec Lee, analista para Brasil do Frontier Strategy Group, consultoria especializada em mercados emergentes, acredita que houve uma reprecificação do país após a divulgação das recentes pesquisas eleitorais.
“O risco sempre existiu, mas os investidores, na nossa visão, estavam sendo extremamente complacentes”, diz. “Agora, acreditamos que nós estejamos vendo uma correção exagerada conduzida por essa mudança na percepção do risco político decorrente das eleições.”
A leitura é que a possibilidade de o novo governo realizar as reformas fiscais aguardadas pelo mercado está cada vez menor. “Há zero clareza sobre a possibilidade de vitória de um candidato reformista”, afirma Geoff Dennis, chefe de estratégia de renda variável em mercados emergentes do banco UBS.
“É importante que quem vença realize reformas importantes, como a da Previdência. Os investidores estão preocupados com os candidatos. Somado ao ambiente mais hostil para emergentes, é o que explica o que tem acontecido com o mercado financeiro brasileiro.”
A preocupação com disciplina fiscal também é o motivo apontado por Bruno Braizinha, da área de alocação global de ativos do banco Société Générale. “O atual governo estava entregando disciplina fiscal, e a greve dos caminhoneiros afetou a percepção dos investidores sobre isso. A mudança no panorama eleitoral só agrava essa perspectiva”, afirma.
Na ausência de uma notícia positiva, a perspectiva para o país não é nada boa. Alec Lee, do Frontier Strategy Group, vê o dólar passando de R$ 4 nas próximas semanas. “Depois dessa correção, o maior risco de alta volta a ser a divulgação de novos dados sobre a economia americana e a potencial aceleração do aumento de juros pelo Fed (banco central americano)”, diz.
O Fed realiza sua reunião de política monetária nos próximos dias 12 e 13. A expectativa é que os juros sejam elevados em 0,25 ponto percentual, para a faixa entre 1,75% e 2% ao ano.
Com informações da Folha