Presidenciáveis têm dificuldade para encontrar vice
Mesmo depois de Michel Temer ter subvertido o papel decorativo do vice-presidente da República, encontrar alguém para ocupar o posto na corrida eleitoral deste ano tornou-se um desafio tanto para os candidatos de esquerda como de direita.
Políticos se dizem espantados com tantos “nãos” e entendem o movimento como falta de confiança nas candidaturas apresentadas para outubro.
Até agora, a única chapa completa ao Planalto é a puro-sangue do PSOL, com Guilherme Boulos e Sônia Guajajara.
Ciro Gomes (PDT) e Jair Bolsonaro (PSL) fizeram suas convenções sem saber quem os acompanhará na urna. Geraldo Alckmin (PSDB) e Henrique Meirelles (MDB), que deixaram a formalização de suas candidaturas para pouco antes da data limite —5 de agosto— ainda correm em busca de um parceiro político.
O posto é usado como atrativo para que partidos engrossem as alianças ao Planalto, como historicamente o cargo é tratado. Este ano, porém, ser vice parece menos sedutor.
“As candidaturas estão muito pulverizadas. Isso aumentou a preocupação com a escolha dos vices, tentando fazer com que sejam agregadores e possam ajudar concretamente na chapa”, explica o deputado Milton Monti (SP), escolhido pelo comandante do PR, Valdemar Costa Neto, para representá-lo publicamente.
Outro ponto que os partidos levam em consideração para definir o vice, segundo o deputado, é o discurso da representatividade.
“Também ganharam dimensão essas questões relativas à participação da mulher, de minorias, coisa que não tinha muita preocupação [nas eleições anteriores]”, afirma.
O PR negociava a vice com Bolsonaro, mas o namoro não foi adiante por parte da legenda de Valdemar Costa Neto.
Bolsonaro também levou não do PRP do general Augusto Heleno e ainda espera uma resposta da advogada Janaína Paschoal (PSL), que parece estar reticente quanto ao posto.
Janaína, coautora do pedido de impeachment de Dilma Rousseff, fez um discurso crítico à postura radical de Bolsonaro durante a convenção que o oficializou como candidato, mas segue no páreo.
Os mais cotados para o cargo agora são o príncipe Luiz Philippe de Orléans e Bragança e o astronauta Marcos Pontes, ambos filiados ao PSL.
Após abandonar Bolsonaro, o PR cogitou aliança com o PT, mas entrou no chamado centrão, grupo composto, até então, por DEM, PP, PRB e SD.
No centro do espectro político —confortável posição onde se posicionou por conta própria—, o bloco negociou tanto com a esquerda como com a direita. Acabou dando as mãos a Geraldo Alckmin.
Alguns nomes defendidos pelos cinco partidos para a vaga de vice, como os empresários Josué Alencar (PR) e Benjamin Steinbruch (PP), eram considerados híbridos, ou seja, serviam tanto para Ciro Gomes como para o tucano.
Após alguns dias de suspense, Josué declinou do convite e Steinbruch voltou a ser opção.
Alckmin quer chegar à sua convenção, sábado (4), com a vaga definida, mas as conversas têm avançado pouco.
Representante do centrão para a escolha do vice, o presidente do DEM, ACM Neto, atribui o fenômeno de chapas indefinidas ao novo calendário eleitoral e ao grande número de candidaturas.
“Aumentou o número de opções, não tem mais quadro de polarização, o que fez com que partidos ampliassem as conversas e multiplicassem as possibilidades”, afirma.
Preterido pelo centrão, Ciro Gomes não tem siglas aliadas até agora e tenta atrair partidos de esquerda, como o PSB, que está dividido sobre que rumo seguir na disputa.
Marina Silva (Rede), por sua vez, também não conseguiu fechar acordo e cogita um vice de seu próprio partido.
Outro que está sozinho na corrida pelo Planalto e evita convites para não sofrer rejeição é Henrique Meirelles (MDB). “[A dificuldade de se conseguir vices] é uma manifestação de anomalia grave. Havia uma disputa muito acirrada em torno das candidaturas mais viáveis. Hoje só tem recusa”, avalia o ministro emedebista Moreira Franco.
A estratégia de manter a candidatura do ex-presidente Lula enquanto for possível tem isolado também o PT.
Sem admitir que adotará um plano B, o partido tem dificuldades em conquistar a confiança de outras legendas, que não querem fechar uma parceria sem saber o nome que substituirá Lula caso ele seja impedido de concorrer.
Três vice-presidentes já alcançaram a titularidade do Planalto desde a redemocratização: José Sarney (MDB), escolhido vice indiretamente, virou presidente em 1985 no lugar de Tancredo Neves, morto naquele ano.
Em 1992, Itamar Franco (PPS) assumiu após o impeachment de Fernando Collor de Mello (PRN, hoje PTC).
Em 2015, Temer deixou vazar carta destinada à então presidente Dilma Rousseff em que reclamava por ser tratado como “vice decorativo”.
Este foi um dos capítulos mais marcantes do processo que culminou com o impeachment da petista. Temer assumiu a Presidência em 12 de maio de 2016 e, desgastado, não tentará a reeleição.
Com informações da Folha de S. Paulo.