Conhecido picareta, dono da Havan enriqueceu durante governos do PT
No final de 2016 o empresário Luciano Hang, dono das lojas de departamento Havan, investiu no combate a uma falsa notícia que atingia a reputação de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff.
Corria o boato de que os ex-presidentes seriam sócios ocultos da rede varejista, que cresceu a todo vapor nos governos petistas. “A Havan é minha, é sua, é da família, é do Brasil”, dizia Hang em um vídeo institucional.
O comercial tornou o empresário conhecido do público catarinense e livrou os petistas da suspeita de que estariam escondendo uma fortuna em negócios de fachada.
Uma ironia, já que dali em diante Hang se tornaria célebre por usar as redes sociais para atacar o PT e a esquerda.
Em 2018, Hang apoiou Jair Bolsonaro à Presidência. Gravou vídeos fantasiado e interagiu com bonecos de Lula e Fernando Haddad. Nada disso foi alvo de contestações, mas outras ações renderam problemas judiciais.
Hang foi multado em R$ 10 mil pelo TSE por ter pago o Facebook para impulsionar publicações que promoviam a campanha de Bolsonaro.
Na Justiça do Trabalho, o empresário foi advertido e ameaçado com uma multa de R$ 500 mil caso pressionasse funcionários a votar em Bolsonaro. Ele havia gravado vídeo em que avisa aos funcionários que pode deixar de criar empregos caso seu candidato não vença a eleição.
Na quinta-feira (18) reportagem da Folha informou que a Havan está entre as empresas que impulsionaram disparos contra o PT no WhatsApp. Hang negou as acusações.
Os problemas do empresário com a Justiça não são uma novidade. Hang foi alvo de pelo menos duas condenações criminais por evasão de divisas e sonegação fiscal.
No processo por evasão de divisas, foi acusado pelo Ministério Público Federal de Santa Catarina de usar contas de laranjas para remeter R$ 500 mil para o exterior sem recolher o imposto devido.
A decisão diz que um primo de Hang atuava como testa de ferro para a movimentação financeira da firma. A sentença, confirmada em segunda instância, prescreveu e ele, apesar de condenado no mérito, ficou livre de punição.
A outra condenação foi por sonegação de INSS dos funcionários. Ainda na década de 1990, ele foi condenado em duas instâncias por “pagar por fora” salários e remunerações de seus funcionários em Santa Catarina e no Paraná.
Segundo o Ministério Público, a Havan tinha duas folhas de pagamento: em uma, declarada como oficial pelo empregador, constava a remuneração fictícia, em média R$ 250 para cada empregado, e na outra aparecia o que era realmente pago, cerca R$ 600.
Com essa manobra Hang teria apresentado ao INSS registros que não representavam os reais custos com a folha de salários. A fraude, segundo a Procuradoria, atingia cerca de 500 empregados, que tinham seus direitos trabalhistas violados, já que as verbas remuneratórias eram calculadas com base em valores inferiores aos realmente recebidos.
O empresário foi condenado pela Vara Federal Criminal de Blumenau, e a 7ª Turma do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) manteve integralmente a sentença.
A defesa de Hang entrou com pedido de habeas corpus no TRF-4 para que ele não tivesse que cumprir pena antes do trânsito em julgado.
Após a condenação, o empresário firmou acordo, parcelou o débito trabalhista e suspendeu a execução da pena.
Não foi a única vez que Hang conseguiu costurar acordo com a Justiça após perder um processo.
Em 1999, uma ação de busca e apreensão, determinada pela Procuradoria da República em Blumenau, resultou na autuação da Havan em R$ 117 milhões pela Receita Federal e em R$ 10 milhões pelo INSS.
Mesmo sendo a maior autuação da Receita na ocasião, a empresa fez um Refis (programa de refinanciamento de dívida) para pagar a dívida em suaves prestações.
A Procuradoria protestou e, em 2004, fez um cálculo que mostrava que caso fosse mantido o refinanciamento, o débito de R$ 168 milhões só seria quitado após 115 anos.
Em 2013 Hang tentou, sem sucesso, que a Justiça determinasse ao Google que fossem removidas do sistema de busca as expressões “Luciano Hang preso”, “Luciano Hang condenado” e “Luciano Hang condenado 2010”. As pesquisas direcionavam para reportagens sobre a condenação de Hang por crimes financeiros.
Apesar das críticas, foi nos governos petistas que o empresário construiu o seu império. A rede saltou de meia dúzia de lojas que possuía no Paraná e em Santa Catarina para cerca de cem no último ano do governo Dilma Rousseff.
Foram especialmente produtivos os anos de 2011, quando a Havan inaugurou 15 lojas, 2012, ao alcançar a marca das 50, e 2013, momento em que expandiu suas fronteiras para São Paulo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás. Só em 2014, a empresa abriu 24 megalojas em Minas, Rondônia e Pará.
Hang estima que alcançará R$ 7 bilhões de faturamento este ano —crescimento expressivo se comparado aos cerca de R$ 4 bilhões que diz ter registrado em 2017.
Nascida em 1986, a marca Havan, junção dos nomes de Hang e do antigo sócio, Vanderlei, começou a se beneficiar da abertura promovida pelo governo Collor nos anos 1990 passando a importar tecidos e outros itens.
O grupo hoje se define como um conglomerado atuante em diferentes ramos, como postos de combustível, hotelaria e outras atividades.
Antes, o que lhe rendia notoriedade era o gosto arquitetônico que imprime nas fachadas de suas lojas, construídas como réplicas da Casa Branca e decoradas com uma Estátua da Liberdade de dezenas de metros de altura. O estilo simboliza a liberdade que a rede oferece diante de um portfólio que vai de edredom a máquina de lavar roupa.
Durante 30 anos de história empresarial, Hang se manteve discreto e, apesar de ser filiado ao MDB, evitou manifestações políticas. No fim do ano passado, Hang se desfiliou do partido e aproximou-se do ideário bolsonarista, o que rendeu rumores de que poderia ser convocado para vice na chapa presidencial.
O posto de vice não vingou, mas o empresário continuou firme na campanha, defendendo a privatização de todas as estatais, além de “extirpar o PT” da vida política.